conteúdo integral do livro - Assembleia da República
conteúdo integral do livro - Assembleia da República
conteúdo integral do livro - Assembleia da República
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
O Sr. Presidente: — (...) Em nome de<br />
S. Ex.ª o Sr. Presidente <strong>da</strong> <strong>República</strong>,<br />
declaro aberta a sessão.<br />
Tem a palavra o representante <strong>da</strong> UDP, Sr.<br />
Deputa<strong>do</strong> Mário Tomé.<br />
O Sr. Mário Tomé (UDP) — Sr. Presidente<br />
<strong>da</strong> <strong>República</strong>, Sr. Presidente <strong>da</strong> <strong>Assembleia</strong> <strong>da</strong> <strong>República</strong>, Srs.<br />
Deputa<strong>do</strong>s, minhas Senhoras e meus Senhores: Sete anos depois<br />
<strong>do</strong> 25 de Abril, face à «nova reali<strong>da</strong>de» existente, cabe-nos perguntar<br />
o que de facto se pretende comemorar hoje nesta sessão<br />
solene <strong>da</strong> <strong>Assembleia</strong> <strong>da</strong> <strong>República</strong>.<br />
Comemorar-se-á o 25 Abril que o povo português impôs, aproveitan<strong>do</strong><br />
a ruptura <strong>do</strong> regime fascista obti<strong>da</strong> com a acção <strong>do</strong>s<br />
capitães de Abril, caçan<strong>do</strong> os PIDES, sanean<strong>do</strong> os fascistas, ocupan<strong>do</strong><br />
as terras e as casas devolutas e aban<strong>do</strong>na<strong>da</strong>s, toman<strong>do</strong><br />
conta <strong>da</strong>s fábricas, forçan<strong>do</strong> as nacionalizações e o controle<br />
operário, numa palavra, determinan<strong>do</strong>, pela sua luta democrática<br />
e revolucionária, as alterações estruturais e o senti<strong>do</strong> futuro <strong>do</strong><br />
desenvolvimento <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de portuguesa consigna<strong>do</strong>s na<br />
Constituição <strong>da</strong> <strong>República</strong>?<br />
Ou estar-se-á a comemorar o 25 de Abril que interessa aos grandes<br />
monopólios, aos latifundiários, ao imperialismo, à NATO, à CEE, à<br />
hierarquia militar — que na<strong>da</strong> teve a ver com o 25 de Abril —, que<br />
interessa aos próprios fascistas que, hoje e aqui dentro são chama<strong>do</strong>s<br />
lídimos defensores <strong>da</strong> democracia? Ou seja, não se pretenderá antes<br />
comemorar o anti-25 de Abril, a «nova reali<strong>da</strong>de» que os ministros<br />
AD se des<strong>do</strong>bram e se despregam a anunciar aos quatro ventos,<br />
inserin<strong>do</strong>-se nas comemorações com o tecto salarial <strong>do</strong>s<br />
16%, os aumentos brutais <strong>do</strong>s preços, os despedimentos colectivos<br />
— como na Stan<strong>da</strong>rd —, a liqui<strong>da</strong>ção de milhares de postos<br />
de trabalho — como na MESSA e na Fábrica Simões —, permitin<strong>do</strong><br />
e apoian<strong>do</strong> o desvio e delapi<strong>da</strong>ção de dezenas de milhares de<br />
contos de empresas considera<strong>da</strong>s em situação económica difícil<br />
– como na Handy —, a repressão sobre os trabalha<strong>do</strong>res e seus<br />
dirigentes — como na Empresa Nacional <strong>do</strong> Urânio e tantas outras<br />
empresas —, cortan<strong>do</strong> na educação e na saúde, e aumentan<strong>do</strong> nas<br />
forças arma<strong>da</strong>s e nas polícias para que estas não tenham falta de<br />
munições para o tiro ao alvo que praticam com frequência,<br />
matan<strong>do</strong> qualquer ci<strong>da</strong>dão por dá cá aquela palha, como ensina<br />
a RTP <strong>do</strong> Sr. Proença, acompanha<strong>da</strong> à distância pela RDP de<br />
Barreiros Car<strong>do</strong>so/Pereira <strong>da</strong> Costa, em renhi<strong>da</strong> competição com<br />
a Renascença <strong>do</strong> Sr. Cardeal Patriarca, para ver qual delas con-<br />
Sessão solene comemorativa <strong>do</strong> 25 de Abril<br />
1981<br />
Mário Tomé<br />
UDP<br />
141<br />
tribui mais decidi<strong>da</strong>mente para a falsificação <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de portuguesa<br />
para a promoção <strong>do</strong> medíocre, <strong>do</strong> negro?<br />
A «nova reali<strong>da</strong>de» que nos foi imposta é, ca<strong>da</strong> vez mais, a base de<br />
apoio para a liqui<strong>da</strong>ção <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>des, para a fascização <strong>da</strong> nossa<br />
vi<strong>da</strong> quotidiana.<br />
Mas os trabalha<strong>do</strong>res não vão esquecer a sua grande experiência<br />
colectiva quan<strong>do</strong>, em 25 de Abril, sau<strong>da</strong>ram os capitães mas não<br />
ficaram à espera deles. Eles sabem que a liber<strong>da</strong>de não existe<br />
sozinha, como não se perde sozinha.<br />
Foi por terem rompi<strong>do</strong> a estrutura <strong>do</strong>s latifundiários que os<br />
assalaria<strong>do</strong>s alentejanos conquistaram a liber<strong>da</strong>de.<br />
Foi por terem toma<strong>do</strong> conta <strong>da</strong>s empresas, imposto as nacionalizações<br />
e o controle operário, que os operários conquistaram e reforçaram<br />
a liber<strong>da</strong>de para si próprios e para milhões de portugueses.<br />
Foi pela luta <strong>do</strong>s sol<strong>da</strong><strong>do</strong>s nos quartéis que se pôde falar <strong>da</strong>s<br />
forças arma<strong>da</strong>s ao serviço <strong>do</strong> povo.<br />
Mas foi também por não terem consegui<strong>do</strong> romper as cadeias de<br />
exploração e repressão que os prendem, que os assalaria<strong>do</strong>s agrícolas<br />
e pequenos e médios camponeses <strong>do</strong> Norte e Centro pouco<br />
ou na<strong>da</strong> usufruíram <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>des <strong>do</strong> 25 de Abril.<br />
A liber<strong>da</strong>de só existe se atacarmos e liqui<strong>da</strong>rmos as estruturas de<br />
exploração e repressão. Por isso é utópico, e não iludirá os trabalha<strong>do</strong>res,<br />
pretender-se salvaguar<strong>da</strong>r a santa liber<strong>da</strong>de ao<br />
mesmo tempo que se vai permitin<strong>do</strong> o ataque desenfrea<strong>do</strong> à sua<br />
base, à sua estrutura, ou seja, o ataque às conquistas económicas<br />
<strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res, ao seu controle sobre as máquinas e as terras,<br />
aos seus órgãos de vontade organiza<strong>da</strong>; ao mesmo tempo, afinal,<br />
que dia a dia, hora a hora, se deixa ca<strong>da</strong> vez mais liber<strong>da</strong>de para<br />
que, por vezes, ver<strong>da</strong>deiros bandi<strong>do</strong>s suguem o suor <strong>do</strong>s que trabalham,<br />
e tomem as rédeas <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de.<br />
E é isso que tem vin<strong>do</strong> a acontecer desde o 25 de Novembro de<br />
1975, em que o actual Presidente <strong>da</strong> <strong>República</strong>, general Eanes,<br />
sobrepôs a força bruta <strong>da</strong>s armas ao 25 de Abril que o povo fazia.<br />
E não há «boas» intenções de «leis Barretos» cumpri<strong>da</strong>s razoavelmente,<br />
de contratos a prazo só em condições especiais, de sector<br />
público e priva<strong>do</strong>, em «harmoniosa» concorrência, que consigam<br />
impedir a total liqui<strong>da</strong>ção <strong>do</strong> 25 de Abril que o povo quis e impôs.<br />
Não se pode harmonizar o aumento <strong>da</strong> produtivi<strong>da</strong>de com a<br />
diminuição <strong>do</strong> desemprego, os lucros e as terras para os capitalistas<br />
com o bem-estar <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res, a liber<strong>da</strong>de para os<br />
fascistas fazerem o que querem com a liber<strong>da</strong>de para o povo.<br />
Hoje, a direita e a AD, celebram a sua própria liber<strong>da</strong>de, à<br />
europeia, à custa <strong>do</strong> bem-estar e <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de <strong>do</strong> povo, pon<strong>do</strong> os<br />
olhos enterneci<strong>do</strong>s nessa Europa exemplar a que se sentem obriga<strong>do</strong>s<br />
por fideli<strong>da</strong>de e vêem, venceram e não condenam o facto<br />
brutal de a não menos brutal Sr. Teatcher deixar morrer de fome,<br />
encerra<strong>do</strong> numa prisão, um patriota irlandês, Boby Sands, eleito<br />
pelo povo para o Parlamento.