conteúdo integral do livro - Assembleia da República
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tradicionalmente substituí<strong>da</strong>s pelo produto <strong>da</strong> aventura. Terra<br />
dura, em que não mana nem leite nem mel, em que só um longo<br />
e paciente trabalho a pode transformar no lar de um povo. De um<br />
povo que traz consigo uma cultura, uma consciência de uni<strong>da</strong>de<br />
nacional, possivelmente a mais antiga <strong>da</strong> Europa, uma poesia<br />
ímpar, uma criação teórica de liber<strong>da</strong>de afirma<strong>da</strong> nos momentos<br />
decisivos <strong>da</strong> sua história colectiva.<br />
Em face <strong>da</strong> terra, o homem. Diminuí<strong>do</strong> intelectualmente pela limitação<br />
<strong>da</strong> escola, inapto para o trabalho pela inexistência de<br />
preparação técnica, fisicamente feri<strong>do</strong> pelas condições generaliza<strong>da</strong>s<br />
de miséria e de subalimentação na i<strong>da</strong>de infantil. Uma trágica percentagem<br />
de deficientes físicos, a maior proporção de analfabetismo<br />
<strong>da</strong> Europa, uma generalização <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r indiferencia<strong>do</strong>.<br />
E em face <strong>da</strong> terra e <strong>do</strong> homem, o Esta<strong>do</strong>. Um Esta<strong>do</strong> burocratiza<strong>do</strong>,<br />
providência sempre e inimigo sempre constituí<strong>do</strong> numa<br />
máquina pesa<strong>da</strong>, com uma invetera<strong>da</strong> tendência para a inércia,<br />
uma separação <strong>do</strong>entia <strong>da</strong> colectivi<strong>da</strong>de, uma indiferença perante<br />
os interesses e os direitos individuais <strong>do</strong>s ci<strong>da</strong>dãos.<br />
É com estas três reali<strong>da</strong>des, a terra que temos, o povo que somos<br />
e o Esta<strong>do</strong> que herdámos, que a Revolução de 25 de Abril, pon<strong>do</strong><br />
fim à aventura ultramarina, absur<strong>da</strong>mente prolonga<strong>da</strong> para além<br />
<strong>do</strong> tempo histórico, nos colocou perante a necessi<strong>da</strong>de de reconstruir<br />
Portugal.<br />
Com a liber<strong>da</strong>de, a Revolução trouxe, como era inevitável, as<br />
ideologias divergentes. E deixou atrás de si o próprio mito, ou<br />
seja, o sonho <strong>da</strong> solução revolucionária permanente.<br />
A redenção totalitária uni<strong>da</strong> à demagogia pôs em sério risco a liber<strong>da</strong>de<br />
democrática. A perversão que Hegel introduziu na palavra<br />
«democracia» e que o marxismo recolheu, retirou-Ihe o <strong>conteú<strong>do</strong></strong><br />
de governo <strong>do</strong> povo para o transmutar em governo autocrático,<br />
apoia<strong>do</strong> na força, utiliza<strong>do</strong> por um grupo organiza<strong>do</strong> de dirigentes<br />
usurpan<strong>do</strong> a totali<strong>da</strong>de <strong>do</strong> poder político e <strong>do</strong> poder económico.<br />
Vozes <strong>do</strong> PSD: — Muito bem!<br />
O Ora<strong>do</strong>r: — A essa tentação salvífica e messiânica, em cuja<br />
fogueira tem ardi<strong>do</strong> a liber<strong>da</strong>de de inúmeras nações, soube resistir<br />
o povo português. E não devemos esquecer que, fosse qual fosse<br />
o desvio ideológico <strong>do</strong> 25 de Abril, as forças arma<strong>da</strong>s souberam<br />
respeitar na sua essência a promessa fun<strong>da</strong>mental de garantir ao<br />
povo português o direito de votar livremente, e de, através <strong>do</strong> seu<br />
voto, escolher o seu destino político.<br />
Aplausos <strong>do</strong> PSD, <strong>do</strong> PPM, <strong>da</strong> ASDI e de alguns deputa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> PS<br />
e <strong>do</strong> CDS.<br />
Atingimos ao fim de anos uma maturi<strong>da</strong>de democrática e uma<br />
solidez institucional que não parece termos atingi<strong>do</strong> na<br />
Sessão solene comemorativa <strong>do</strong> 25 de Abril<br />
1982<br />
Sousa Tavares<br />
PSD<br />
208<br />
I <strong>República</strong>. E o esforço colectivo em que nos encontramos<br />
empenha<strong>do</strong>s de revisão constitucional tem si<strong>do</strong> uma busca árdua<br />
e honesta para aperfeiçoamento <strong>do</strong> sistema de poder e simultaneamente<br />
de invenção de soluções inteiramente nossas, sejam<br />
quais forem as pressões que sobre o processo se hajam exerci<strong>do</strong>.<br />
É evidentemente difícil a construção harmoniosa de um edifício<br />
político que assente no princípio basilar <strong>da</strong> representação parlamentar<br />
e <strong>do</strong> Governo legitima<strong>do</strong> por essa representação, de<br />
simultaneamente exacta expressão não conflituante à chefia <strong>do</strong><br />
Esta<strong>do</strong>, eleito também por sufrágio universal. A divergência é<br />
possível e talvez seja, por vezes, inevitável, uma vez que o sistema<br />
eleitoral a<strong>do</strong>pta<strong>do</strong> desenhou um quadro partidário que não<br />
proporciona a formação fácil de uma maioria que, por hipótese,<br />
coinci<strong>da</strong> com o eleitora<strong>do</strong> presidencial.<br />
E por isso é necessário que a figura constitucional <strong>do</strong> chefe de<br />
Esta<strong>do</strong>, transcenden<strong>do</strong> os parti<strong>do</strong>s e situan<strong>do</strong>-se num plano de<br />
arbitragem institucional, em face <strong>da</strong> qual seja efectivamente possível<br />
a alternância <strong>do</strong> poder político, não inva<strong>da</strong> o terreno em que<br />
a instituição partidária deve ser privilegia<strong>da</strong>. Só assim será possível<br />
uma construção harmoniosa <strong>do</strong> futuro e a preservação <strong>da</strong><br />
autori<strong>da</strong>de e <strong>da</strong> majestade institucional <strong>da</strong> chefia <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.<br />
Temos nós, sociais-democratas, procura<strong>do</strong> com empenho contribuir<br />
para a equação perfeita <strong>do</strong> poder. Da mesma forma como,<br />
<strong>do</strong>mina<strong>do</strong>s por uma preocupação de genui<strong>da</strong>de democrática e<br />
aceitan<strong>do</strong> plenamente a exigência <strong>do</strong> <strong>conteú<strong>do</strong></strong> social e económico<br />
ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong> valor político no conceito actual de Democracia,<br />
procurarmos que essa socialização real <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de e <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>,<br />
penetra<strong>da</strong> por um profun<strong>do</strong> senti<strong>do</strong> de justiça e por uma responsabili<strong>da</strong>de<br />
colectiva <strong>da</strong> Nação, pelo destino e realização de ca<strong>da</strong><br />
homem, não se traduza num preconceito de colectivização força<strong>da</strong><br />
<strong>da</strong>s forças produtivas.<br />
Perante a situação grave em que sabemos mergulha<strong>da</strong> a Nação<br />
portuguesa, não procuramos demagogicamente esconder que é a<br />
insuficiência <strong>da</strong> produção em face <strong>da</strong>s exigências <strong>do</strong> consumo<br />
colectivo que constitui a base fun<strong>da</strong>mental <strong>do</strong> desequilíbrio<br />
nacional. Sabemos que o desenvolvimento acelera<strong>do</strong> <strong>da</strong> produção<br />
requer uma formação maciça de capital fixo, não coadunável com<br />
a possibili<strong>da</strong>de nacional de poupança nem com a degra<strong>da</strong>ção<br />
financeira <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.<br />
E por isso impõe-se, para nós, uma escolha segura e firme <strong>da</strong>s<br />
opções de desenvolvimento e <strong>do</strong>s sistemas necessários ao seu<br />
financiamento. Recusamos e temos recusa<strong>do</strong> obter esse financiamento<br />
através de uma absorção pelo Esta<strong>do</strong> de parte <strong>do</strong> já reduzi<strong>do</strong><br />
poder de compra <strong>da</strong> colectivi<strong>da</strong>de.<br />
Impõe-se, para isso, que as opções de desenvolvimento inci<strong>da</strong>m,<br />
de acor<strong>do</strong>, aliás, com as necessi<strong>da</strong>des primordiais <strong>do</strong> consumo,<br />
em formas de activi<strong>da</strong>de produtiva em que seja menor a incidência<br />
de capital investi<strong>do</strong>, maior o recurso à mão-de-obra e mais