conteúdo integral do livro - Assembleia da República
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colocaram-nos dentro de conjunturas extremamente difíceis, e só<br />
a resistência tradicional <strong>do</strong>s portugueses alcançou, embora não<br />
definitivamente, um clima de digni<strong>da</strong>de que importa defender<br />
com ânimo viril.<br />
Economicamente débeis, pela condição geopolítica <strong>do</strong> nosso<br />
agrega<strong>do</strong>, com o problema pungente <strong>do</strong> regresso <strong>do</strong>s nossos compatriotas<br />
africanos e asiáticos, despovoa<strong>do</strong>s os campos pelo êxo<strong>do</strong><br />
<strong>da</strong> emigração, fruto <strong>da</strong> incapaci<strong>da</strong>de e inépcia <strong>do</strong> totalitarismo,<br />
afasta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> pelo isolamento imposto, sem treino cívico,<br />
as perspetivas reclamavam entregas totais e generosas vigílias.<br />
No meio <strong>da</strong> confusão que parecia ser o prefácio <strong>da</strong> catástrofe,<br />
descolonizámos, apertámos ao peito os corações sobressalta<strong>do</strong>s<br />
<strong>do</strong>s nossos compatriotas em crise, abrimos as urnas, votámos<br />
livremente, escolhemos os deputa<strong>do</strong>s às Constituintes, elaborámos<br />
a Constituição, elegemos a <strong>Assembleia</strong> <strong>da</strong> <strong>República</strong>, escolhemos o<br />
Presidente <strong>da</strong> <strong>República</strong> e instaurámos juridicamente as nossas<br />
autarquias locais. E circulan<strong>do</strong> livremente atravessámos as fronteiras<br />
à procura <strong>da</strong> compreensão e <strong>da</strong> amizade <strong>do</strong>s países sem os<br />
quais não era possível viver, passámos a receber as mensagens<br />
materiais e espirituais <strong>do</strong>s que em nós confiavam.<br />
Era um Portugal novo que emergia <strong>do</strong> caos e desafiava o futuro.<br />
A passo e passo, persistentemente, criámos ou recriámos a nossa<br />
civilização.<br />
Mas persistem alguns erros, mantêm-se e renovam-se situações nem<br />
sempre felizes, mas tu<strong>do</strong> isto é a consequência natural de um crescimento<br />
impetuoso, partin<strong>do</strong> <strong>do</strong> zero e pesquisan<strong>do</strong> as alturas.<br />
Trabalho, este sim ciclópico, ao contrário <strong>do</strong> ciclópico de Marcelo<br />
Caetano, que tu<strong>do</strong> tem de vencer: a inércia, a cumplici<strong>da</strong>de, a<br />
indiferença, a simulação e as tentativas de perversão.<br />
Aprova<strong>da</strong> a Constituição, instala<strong>do</strong> o I Governo Constitucional,<br />
com a liber<strong>da</strong>de nos nossos escu<strong>do</strong>s e os poderes <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> em<br />
funcionamento, eis-nos na grande encruzilha<strong>da</strong>: ou vencemos ou<br />
sucumbimos.<br />
Mas iremos vencer, porque possuímos a alma grande, muito longe<br />
<strong>da</strong> alma pequena de que nos falava a tal poesia angustia<strong>da</strong> de<br />
Fernan<strong>do</strong> Pessoa. E com os pés finca<strong>do</strong>s na terra que é a nossa,<br />
outra alegoria <strong>do</strong> poeta excepcional que se chamou A<strong>do</strong>lfo Casais<br />
Monteiro, iremos vencer.<br />
Mas vencer com reflexão, com inteligência, em paz civil e política,<br />
agarran<strong>do</strong> no pe<strong>da</strong>ço que nos resta e fazen<strong>do</strong> dele uma enti<strong>da</strong>de<br />
solvente que será glória nossa e garantia <strong>do</strong> destino <strong>do</strong>s nossos<br />
filhos e nossos netos.<br />
E aqui estamos, Sr. Presidente <strong>da</strong> <strong>República</strong>, Srs. <strong>do</strong> Governo, Srs.<br />
Sessão solene comemorativa <strong>do</strong> 25 de Abril<br />
1977<br />
Vasco <strong>da</strong> Gama Fernandes<br />
Presidente <strong>da</strong> <strong>Assembleia</strong> <strong>da</strong> <strong>República</strong><br />
35<br />
<strong>do</strong> Conselho <strong>da</strong> Revolução, Srs. Magistra<strong>do</strong>s, Srs. Deputa<strong>do</strong>s,<br />
minhas Senhoras e meus Senhores.<br />
Aqui estamos com os tais pés finca<strong>do</strong>s na terra, rodea<strong>do</strong>s de amigos<br />
que são to<strong>do</strong>s os que pensam a Revolução, de inimigos que são os<br />
que não acreditam nem querem acreditar, e <strong>do</strong>s indiferentes que<br />
não são uma coisa nem outra, antes pelo contrário, desculpem-me<br />
a fórmula popularucha.<br />
Risos.<br />
Aqui estamos capitães de Abril, a comemorar a vossa gesta, o<br />
vosso arranque viril, a garantia <strong>da</strong>s forças arma<strong>da</strong>s na prossecução<br />
<strong>da</strong> nossa ideali<strong>da</strong>de.<br />
Aqui estamos povo português a dizer-vos que valeu a pena sofrer<br />
para vivermos juntos a hora alta <strong>da</strong> nossa recuperação, fiéis ao pacto<br />
que convosco assinámos de honrar as urnas e servir o País.<br />
O pacto vai continuar a ser honra<strong>do</strong>.<br />
O 25 de Abril foi mais que uma Revolução. Foi sobretu<strong>do</strong> a reintegração<br />
<strong>da</strong> nossa Pátria nas sen<strong>da</strong>s desfeitas pelo arbítrio e pela<br />
violência.<br />
Se alguns ficarem pelo caminho, paciência, mas uma coisa é<br />
certa: nem to<strong>da</strong>s as violências juntas conseguirão demover-nos <strong>do</strong><br />
caminho traça<strong>do</strong>.<br />
Senhores de uma democracia política, temos como figura cimeira<br />
o honra<strong>do</strong> Presidente <strong>da</strong> <strong>República</strong> que nos coube em sorte.<br />
Vamos reconstruir esta Nação com muito suor, com algumas<br />
lágrimas e quem sabe se com algum sangue. Mas vamos reconstruí-la<br />
com a nossa fé, com as armas leais <strong>do</strong> Exército, com o<br />
deno<strong>do</strong> e isenção <strong>do</strong>s governantes e com o regular e harmónico<br />
funcionamento <strong>do</strong>s poderes <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.<br />
Daqui dirijo uma sau<strong>da</strong>ção ao Sr. Presidente <strong>da</strong> <strong>República</strong>, o<br />
grande timoneiro <strong>da</strong> nau <strong>da</strong> esperança. Saú<strong>do</strong> também no<br />
Governo a sua dedicação e o seu tremen<strong>do</strong> sacrifício. Mas saú<strong>do</strong><br />
igualmente e enterneci<strong>da</strong>mente o povo humilde e trabalha<strong>do</strong>r <strong>da</strong><br />
nossa terra, os que aqui estão, os que estão longe de nós e os que<br />
procuram o nosso carinho e a nossa soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de.<br />
Finalmente, em nome <strong>da</strong> <strong>Assembleia</strong> representativa <strong>da</strong> vontade<br />
<strong>do</strong>s Portugueses, aperto contra o meu coração a gloriosa<br />
Revolução de 25 de Abril — o seu exército e o nosso Povo.<br />
Viva Portugal!<br />
Viva a <strong>República</strong>!<br />
Aplausos gerais, com to<strong>da</strong> a <strong>Assembleia</strong> de pé.