16.04.2013 Views

conteúdo integral do livro - Assembleia da República

conteúdo integral do livro - Assembleia da República

conteúdo integral do livro - Assembleia da República

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Neste dia, é bom que lembremos os nossos direitos democráticos,<br />

mas também os nossos deveres para com a democracia, a nossa<br />

responsabili<strong>da</strong>de na sua vitali<strong>da</strong>de e aperfeiçoamento. É necessário<br />

lutar contra as rotinas que geram o imobilismo e contra as formas<br />

de instalação que provocam o comodismo, a passivi<strong>da</strong>de ou a<br />

indiferença. Sabemos que a democracia tem de ser pratica<strong>da</strong> e<br />

participa<strong>da</strong>, com uma atitude activa. Mas é preciso, num tempo<br />

em que tu<strong>do</strong> mu<strong>do</strong>u, inventar novas formas de participação, de<br />

intervenção e de mobilização, pelas quais a ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia se exerce,<br />

vencen<strong>do</strong> a tentação <strong>do</strong> egoísmo que fecha os indivíduos e os grupos<br />

nos seus interesses imediatos.<br />

Por isso, é fun<strong>da</strong>mental que encontremos novos meios de aproximação<br />

<strong>da</strong> política aos ci<strong>da</strong>dãos e de abertura à socie<strong>da</strong>de e aos<br />

movimentos que a percorrem e lhe dão dinamismo. Esta procura<br />

cabe, em primeira linha, aos parti<strong>do</strong>s políticos, que têm de ser<br />

prestigia<strong>do</strong>s e ti<strong>do</strong>s como os grandes instrumentos de intervenção<br />

política na vi<strong>da</strong> colectiva.<br />

To<strong>do</strong>s sabemos que não é fácil, nas condições de hoje, desempenhar<br />

esta função. A própria natureza <strong>do</strong> poder e <strong>do</strong> seu exercício alterou-<br />

-se completamente. O poder está, actualmente, multiplica<strong>do</strong>, despersonaliza<strong>do</strong>,<br />

disperso, mundializa<strong>do</strong>, mediatiza<strong>do</strong> e os seus efeitos<br />

produzem-se a partir de dispositivos móveis e mutáveis, cuja substância,<br />

em tantos casos, conhecemos mal e não controlamos.<br />

Vivemos num mun<strong>do</strong> de signos, de objectos de consumo, de fluxos<br />

de informação, de técnicas, de imagens, em que os laços sociais<br />

tradicionais se fragmentaram e fragilizaram, no qual o conceito de<br />

reali<strong>da</strong>de se alterou e em que culturas ancestrais se desagregaram.<br />

À razão una e universal, sucedeu uma plurali<strong>da</strong>de de nacionali<strong>da</strong>des<br />

diferencia<strong>da</strong>s, específicas e locais. Nas nossas socie<strong>da</strong>des desenvolvi<strong>da</strong>s,<br />

a produção e a difusão de informações e de imagens ocupam o<br />

lugar que, no passa<strong>do</strong> recente, era o <strong>do</strong>s bens materiais.<br />

Face a esta situação tão complexa, desconheci<strong>da</strong> e incerta, os parti<strong>do</strong>s<br />

políticos podem ter a tentação de se fecharem sobre si mesmos.<br />

Mas esse risco corre-o também a própria socie<strong>da</strong>de e os indivíduos,<br />

como, infelizmente, se tem visto com a emergência de fenómenos<br />

de racismo, xenofobia, nacionalismo agressivo, populismo e com<br />

o recurso a formas violentas de afirmação identitária e a meios<br />

ilegais de autoprotecção e autodefesa.<br />

Temos de prevenir esses perigos, de que, também entre nós, têm<br />

apareci<strong>do</strong> alguns preocupantes sinais. A exclusão tem de ser combati<strong>da</strong>,<br />

decidi<strong>da</strong>mente, nas suas causas, que são culturais,<br />

económicas e sociais, mas também nos seus efeitos.<br />

Devemos ter consciência de que a identi<strong>da</strong>de individual ou colectiva<br />

se afirma, não no me<strong>do</strong> que paralisa e gera a intolerância,<br />

mas no reconhecimento pratica<strong>do</strong> de que a nossa digni<strong>da</strong>de é<br />

inseparável <strong>da</strong> digni<strong>da</strong>de <strong>da</strong>queles que são nossos semelhantes,<br />

quaisquer que sejam as diferenças em relação a nós, às quais,<br />

aliás, têm pleno direito.<br />

Sessão solene comemorativa <strong>do</strong> 25 de Abril<br />

1997<br />

Jorge Sampaio<br />

Presidente <strong>da</strong> <strong>República</strong><br />

476<br />

As grandes áreas urbanas, por exemplo, são, actualmente, universos<br />

complexíssimos, submeti<strong>do</strong>s a tensões permanentes e a rupturas<br />

bruscas e nas quais tantas vezes a falta de raízes, a erosão <strong>do</strong>s valores,<br />

a crise <strong>da</strong>s referências, a solidão interior e as condições<br />

duríssimas de vi<strong>da</strong> são marcas dramáticas que criam uma espécie<br />

de anonimato moral e afectivo.<br />

Fenómenos como a droga e a criminali<strong>da</strong>de, que lhe está associa<strong>da</strong>,<br />

não podem ser combati<strong>do</strong>s eficazmente sem serem analisa<strong>do</strong>s<br />

deste ponto de vista.<br />

Por isso mesmo, é comum dizer-se que o futuro <strong>da</strong>s nossas<br />

socie<strong>da</strong>des se decidirá, em larga medi<strong>da</strong>, na capaci<strong>da</strong>de que<br />

demonstrarmos na luta contra estes flagelos e na necessária rehumanização<br />

<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> nos grandes aglomera<strong>do</strong>s urbanos.<br />

Sr. Presidente, Srs. Deputa<strong>do</strong>s: A democracia é o regime em que<br />

os princípios e os valores se afirmam e em nome <strong>do</strong>s quais se<br />

age e reage com legali<strong>da</strong>de, razoabili<strong>da</strong>de e eficácia. A democracia,<br />

porque é aberta, anti<strong>do</strong>gmática e plural, é o regime que<br />

está mais apto a acolher o desconheci<strong>do</strong>, a mu<strong>da</strong>nça, a novi<strong>da</strong>de,<br />

a diferença.<br />

É preciso <strong>da</strong>r à política — às ideias, às propostas, ao debate — o<br />

lugar que nenhuma técnica de imagem ou de marketing pode<br />

ocupar. É preciso que a acção política seja rigorosa nos seus<br />

critérios e transparente na sua ética. Problemas como os <strong>do</strong><br />

financiamento <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> política não podem ser iludi<strong>do</strong>s nem adia<strong>do</strong>s<br />

por mais tempo. Têm de ser assumi<strong>do</strong>s mediante o estabelecimento<br />

de regras claras, que evitem a suspeita ou a desconfiança,<br />

pois, como sabemos, as regras que existem têm graves<br />

lacunas, são ineficazes e estão inadequa<strong>da</strong>s à situação actual. Isto<br />

é fun<strong>da</strong>mental para a saúde <strong>da</strong> democracia e constitui, como<br />

sabem, uma antiga e constante preocupação minha. Ao voltar a<br />

referi-la de novo, hoje, aqui, gostaria que os Srs. Deputa<strong>do</strong>s, a<br />

quem cumpre legislar sobre esta matéria, a tomassem como um<br />

apelo que vos faço.<br />

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): — Muito bem!<br />

O Ora<strong>do</strong>r: — É necessário que o Esta<strong>do</strong> exerça a sua autori<strong>da</strong>de<br />

democrática, legitima<strong>da</strong> pelo voto livre <strong>do</strong>s eleitores. É necessário<br />

que se reforce a relação de confiança entre o Esta<strong>do</strong> e a socie<strong>da</strong>de<br />

<strong>do</strong>s ci<strong>da</strong>dãos, entre os eleitores e os eleitos. É necessário que os<br />

direitos sejam respeita<strong>do</strong>s e os deveres cumpri<strong>do</strong>s. A democracia<br />

é o regime de tolerância mas não <strong>da</strong> permissivi<strong>da</strong>de ou <strong>do</strong> demissionismo.<br />

É o regime <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de mas não <strong>da</strong> insegurança. É o<br />

regime <strong>da</strong> negociação, <strong>do</strong> diálogo, <strong>da</strong> concertação e, se possível,<br />

<strong>do</strong> consenso, mas também — não o esqueçamos — <strong>da</strong> decisão, <strong>da</strong><br />

iniciativa, <strong>da</strong>s reformas, <strong>da</strong> autori<strong>da</strong>de democrática.<br />

Aplausos <strong>do</strong> PSD e de alguns Deputa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> PS.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!