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O sangue do rato espirrou, escorreu quente e viscoso para a boca de Jeanne.<br />
Esta, porém, não se incomodou com aquilo e, cuspindo de lado o pedaço de cabeça que ficara em sua boca, com o sangue do<br />
animalzinho a lhe escorrer pelos cantos dos lábios, voltou a abrir a gaiola.<br />
Pegou outro rato e, segurando-lhe a cabeça entre o polegar e o indicador da mão direita, apertou-a até que sentiu os ossos estalarem.<br />
Mais uma vez, o sangue a sujou, fragmentos do crânio do rato espirraram longe...<br />
— Morra, Sylvia! Você quis Tomás em vida... Pois o terá até depois da morte!<br />
Olhou para cima, deixando o corpo do rato ao lado do outro que matara. Viu que a nuvem que cobria a lua estava quase acabando de<br />
passar. Logo ela brilharia outra vez e, então, o<br />
encantamento teria terminado.<br />
Pela terceira e última vez, abriu a gaiola.<br />
Restava apenas um rato.<br />
Estava nervoso, chiando como um desesperado e encolhendo-se num canto, procurando se afastar o mais possível dos dedos de<br />
Jeanne.<br />
— Venha, Simone... — disse ela — Não adianta lutar! Seu destino está traçado e seus dias estão para terminar neste instante!<br />
Com um movimento rápido, tentou pegar o rato pela cabeça.<br />
Porém, o animalzinho sabia que, para ele, seria uma questão de vida ou morte...<br />
Abriu a boca e mordeu.<br />
Mordeu com toda a força o dedo médio de Jeanne, arrancando-lhe sem piedade um pedaço da unha e uma boa fatia de pele...<br />
Jeanne se assustou.<br />
Tirou a mão depressa, arrastando para fora o rato.<br />
Este, ao se ver livre dos arames da gaiola, soltou o dedo de Jeanne e, uma vez no chão, saiu em disparada, desaparecendo por entre<br />
os túmulos e campas rasas.<br />
Jeanne não pode fazer nada. Ficou ali, ajoelhada sobre a lápide, olhando para a<br />
escuridão, incrédula.<br />
— Mas não é possível... — murmurou — Ela escapou... Simone conseguiu escapar...<br />
*******<br />
Tomás olhou o relógio um pouco impaciente.<br />
— Faltam dois minutos para a meia-noite — disse ele — Já é tarde...<br />
— Tarde porque? — perguntou Sylvia, rindo — Você tem algum compromisso, hoje?<br />
Tomás riu, também, e comentou:<br />
— Você tem razão... Não tenho nenhum outro compromisso a não ser repousar...<br />
Olhou para Sylvia e disse:<br />
— Se é que você vai me deixar repousar hoje... Parece que o ar aqui do Rio de Janeiro lhe faz alguma coisa... Não deixa escapar uma<br />
só noite!<br />
Sylvia deu uma risada feliz, olhou para o banco de trás do automóvel onde Simone dormia como se fosse uma criança.<br />
— A vida é curta demais — falou — Se não aproveitarmos enquanto podemos...<br />
Tomás não retrucou e continuou dirigindo pela Avenida Nossa Senhora de Copacabana, mantendo uma velocidade de quase sessenta<br />
quilômetros por hora no trânsito livre do fim de noite e início de madrugada..<br />
—Simone está dormindo — disse Sylvia — Deve ter ficado cansada, depois de tudo que andamos hoje...<br />
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