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Sem ter o que fazer e ainda muito pouco conhecida pelos moradores da região, Jeanne tinha tempo de sobra para se dedicar à leitura.<br />
Encontrou, entre as coisas de Gabrielle, vários livros sobre feitiçaria e sobre magias e, assim, começou a estudar.<br />
— Não é possível que uma feiticeira, uma pessoa com tanto poder, não consiga fazer alguma coisa no sentido de melhorar a própria<br />
vida! — dizia ela enquanto folheava aqueles livros — Deve haver uma maneira, deve haver um método mágico que me permita ter, ao<br />
menos, o suficiente para viver num lugar melhor, o suficiente para que eu possa ter meu filho com comodidade!<br />
Contudo, as coisas não eram nada simples.<br />
Os livros de Gabrielle estavam repletos de fórmulas, de símbolos e de sinais que ela não conseguia entender e, o que era pior, os<br />
poucos trechos cujo teor conseguia compreender, diziam coisas pouco animadoras.<br />
Falavam das desgraças que caíam sobre os que tentavam explorar a magia como fonte de renda, de maldições que perseguiam os<br />
que viam na feitiçaria uma maneira de enriquecimento.<br />
— Tem de ser mentira! — exclamava Jeanne, irritada — Nunca ouvi dizer de feiticeiras ou bruxos que fossem pobres! Deve haver um<br />
encantamento sim, mas tão secreto que nem sequer é mencionado na literatura!<br />
À noite, Jeanne sonhava.<br />
No sonho, ela aparecia numa cidade grande, ensolarada, quente e muito bonita. Ela usava roupas leves e coloridas, estava sempre<br />
sorridente e os homens se desdobravam para agradá-la. Ela tinha dinheiro, muito dinheiro... E podia fazer compras, podia comer nos<br />
melhores restaurantes, podia ir a teatros, dar longos passeios de automóvel...<br />
No sonho, Jeanne vivia a vida que desejava, a vida que pedira para ter.<br />
Mas...<br />
Era um sonho.<br />
Um sonho que ela sabia ser muito difícil de realizar, principalmente estando ali, prisioneira naquela floresta.<br />
Porém, Jeanne era persistente. Quando despertava e via que ainda estava no bangalô e que aquelas ruas ensolaradas e cheias de<br />
gente feliz não tinham sido mais do que outro sonho, ela voltava a mergulhar nos livros de Gabrielle, ansiosa por encontrar o caminho<br />
de sua libertação.<br />
— Deve haver um meio! — dizia para si mesma — E, quando eu o encontrar... Aí sim, poderei dizer que sou verdadeiramente feliz!<br />
*******<br />
Um fim de tarde, quando Jeanne estava mais deprimida com a solidão — nos últimos três dias não aparecera ninguém na floresta e<br />
muito menos no bangalô — revirando um velho baú que estava no quarto de Gabrielle, ela encontrou um livro que ainda não tinha visto.<br />
Era uma edição muito antiga, já meio carcomida pelo tempo e pelos carunchos, que tratava sobre um assunto que Gabrielle abominava:<br />
Magia Negra.<br />
Muito provavelmente foi a curiosidade que desperta aquilo que é proibido, que fez Jeanne levá-lo para a sala e começar a folheá-lo.<br />
Era preciso muito cuidado no manuseio pois as páginas, úmidas, emboloradas e praticamente apodrecidas, desfaziam-se ao mais<br />
suave toque. Assim, bem devagar para não destruir o livro, ela o folheou, detendo-se em alguns trechos mais interessantes e saltando<br />
outros sem nem ao menos passar-lhes os olhos em cima.<br />
Não pode deixar de sorrir ao perceber que só se detinha em parágrafos de fato importantes e que os outros eram simplesmente<br />
postos de lado, como se ela possuísse um filtro mental<br />
formidável, um filtro précognitivo que lhe permitisse escolher o que interessava e o que poderia ser desprezado, antes mesmo de<br />
começar a ler.<br />
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