A construção de um projeto de educação bilíngue para
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Como o investimento no ensino da língua oral era muito gran<strong>de</strong>, a escolarização<br />
propriamente dita dos alunos ficava secundarizada, já que esta ficava na <strong>de</strong>pendência da<br />
aprendizagem da língua oral, pois “<strong>um</strong>a vez aprendida a linguagem, veículo social mais<br />
importante [grifo meu], todas as noções elementares (ou não) po<strong>de</strong>rão ser aprendidos pela<br />
criança que as assimilará <strong>de</strong> acordo com a ida<strong>de</strong> (...)” (DÓRIA, 1967, p.16)<br />
Assim, todos os professores formados no Curso Normal do INES <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1953<br />
baseavam suas práticas pedagógicas nesta visão e seguiam a recomendação <strong>de</strong> que os<br />
gestos não <strong>de</strong>veriam fazer parte do ensino, pois inibiriam a aprendizagem da leitura labial.<br />
Esta recomendação era enfatizada no livro <strong>de</strong> Ana Rímoli <strong>de</strong> Faria Dória Como ajudar<br />
<strong>um</strong>a criança surda :<br />
O emprego constante <strong>de</strong> gestos na conversação com <strong>um</strong> aluno surdo fará<br />
com que ele cresça mudo também. Não é que haja erro nos gestos,<br />
propriamente ditos, mas cada vez que <strong>um</strong> gesto é empregado ao invés <strong>de</strong><br />
<strong>um</strong>a palavra, per<strong>de</strong>-se <strong>para</strong> sempre, <strong>um</strong>a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ajudar a<br />
criança, porque o gesto situa-se no lugar da palavra na mente,<br />
estimulando, assim, a mu<strong>de</strong>z (I<strong>de</strong>m, p.16).<br />
Essas recomendações foram acatadas sem gran<strong>de</strong>s questionamentos até o início dos<br />
anos 1980, como nos faz crer os <strong>de</strong>poentes que colaboraram com essa dissertação, sendo a<br />
língua <strong>de</strong> sinais aprendida, na clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>, pelos alunos que não conseguiam<br />
minimamente se expressar na língua oral. Seu uso, portanto, estava atrelado ao sentimento<br />
<strong>de</strong> fracasso escolar <strong>de</strong> <strong>um</strong>a parcela <strong>de</strong> alunos surdos que não conseguia se beneficiar do<br />
método oral. Essa situação era com<strong>um</strong> na década <strong>de</strong> 1980. O relato da professora A 72 ·, que<br />
ingressou na instituição nesta época, nos esclarece a respeito:<br />
Então essa era a visão... As pessoas c<strong>um</strong>priam com suas tarefas, estavam<br />
ali na hora, <strong>de</strong> modo geral recebiam bem seus alunos, eram pessoas<br />
carinhosas e tal, mas a visão era <strong>de</strong> falta. A criança <strong>de</strong>ficiente auditiva era<br />
<strong>um</strong>a pessoa que tinha <strong>um</strong>a falta. E o INES tinha que oralizar, tinha que<br />
fazer essa criança falar e prepará-la também <strong>para</strong> ingressar no mercado <strong>de</strong><br />
trabalho (...) E quando os alunos não conseguiam <strong>um</strong>a oralização boa, ou<br />
que fosse minimamente compreendida pelas pessoas em geral, elas eram<br />
tentadas [risos] a apren<strong>de</strong>r língua <strong>de</strong> sinais, até porque eles estavam ali o<br />
dia inteiro no INES, mas os professores não aceitavam.<br />
Esta professora também nos relata o primeiro embate que ocorreu na instituição<br />
entre os professores que se encontravam no INES <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a época em que fizeram o curso<br />
normal oferecido pela instituição e aqueles professores que entraram através <strong>de</strong> concurso<br />
público e portavam diplomas universitários. É ela quem evoca suas memórias a fim <strong>de</strong><br />
resgatar esses momentos <strong>de</strong> conflito:<br />
72 A foi professora do INES e conce<strong>de</strong>u a entrevista à autora em 24 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 2011.<br />
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