Discursos Racialistas em Pedro Calmon - 1922/33 - Programa de ...
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“o escravo, por melhor que seja tratado, é, <strong>em</strong> regra geral, pelo fato <strong>de</strong> ser escravo, s<strong>em</strong>pre<br />
e natural e logicamente o primeiro e mais rancoroso inimigo <strong>de</strong> seu senhor” 65 . Na imag<strong>em</strong><br />
criada por <strong>Pedro</strong> <strong>Calmon</strong>, Martinho não era diferente. E, para não chamar atenção contra<br />
si, dissimulava:<br />
Mas esse rosto, quando a vista do fidalgo lhe caía <strong>em</strong> cima, tinha uma expressão [...] <strong>de</strong><br />
servilida<strong>de</strong>: o <strong>de</strong>smentido parecia estar na contração muscular espontânea, que mostrava<br />
sob o gibão barato a plástica bovina [...]. 66<br />
Afora a aparência “bovina”, a <strong>de</strong>sfaçatez com que tentava encobrir seu real estado<br />
<strong>de</strong> espírito – <strong>de</strong> “fera” aprisionada – encobria o teor das suas reais intenções. Chegava ao<br />
engenho <strong>de</strong> Mataripe “com os últimos raios <strong>de</strong> um sol <strong>de</strong> agosto do ano <strong>de</strong> 178...”<br />
carregando, para além <strong>de</strong> cartas e encomendas, um plano articulado <strong>de</strong> revolta, que incluía<br />
iludir o senhor com o alento <strong>de</strong> falsas informações:<br />
Martinho - De Suibaca, Eugenio manda dizer que está tudo b<strong>em</strong>.<br />
Senhor - E o banzo?<br />
Martinho - N<strong>em</strong> sombra. Completamente curados. Ri<strong>em</strong>, dançam ao batuque, passam as<br />
noites <strong>de</strong> lua sob mangueiras, e nas folgas <strong>de</strong> domingo pescam no tanque...<br />
Parec<strong>em</strong> até pretos da terra... 67<br />
Tudo mentira. Tal qual “Simeão, o crioulo” <strong>de</strong> As Vítimas-Algozes, Martinho<br />
tramava alcançar a liberda<strong>de</strong> e a riqueza promovendo a matança na casa gran<strong>de</strong>. É o que<br />
revela a mensag<strong>em</strong> secreta <strong>de</strong> um clérigo para o dono do engenho, que acaba sendo<br />
alertado da revolta iminente:<br />
“Meu bom amigo e Sr. Apresso-me a fazer-vos ciente <strong>de</strong> um projeto diabólico que se<br />
prepara para a vossa paralisação, e a <strong>de</strong> todos vossos. Soube há pouco, <strong>de</strong> um saveirista do<br />
Recôncavo, que os pretos <strong>de</strong> Suibaca estão <strong>em</strong> franca revolta, já tendo largado trabalho e<br />
tomado posse do sobrado. Pois os pretos <strong>de</strong> Mataripe vão fazer o mesmo, assim que saibam<br />
<strong>de</strong> que houve lá. Precavei-vos pois. Mesmo estas linhas, vós a recebeis certamente porque<br />
iludi o portador, dizendo ser uma certidão <strong>de</strong> batismo que se ia <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ste envelope.<br />
Vosso servidor. Padre Amaro”. 68<br />
65 MACEDO, Joaquim Manoel. As Vítimas-Algozes – quadros da escravidão (1869). 3 a . ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />
São Paulo: Casa <strong>de</strong> Ruy Barbosa, Scipione. 1991. p.3; Ver AMARAL, Sharyse P. Uma Nação por Fazer:<br />
escravos, mulheres e educação nos romances <strong>de</strong> Joaquim Manuel <strong>de</strong> Macedo. Dissertação <strong>de</strong> Mestrado.<br />
UNICAMP, 2001.<br />
66 CALMON, <strong>Pedro</strong>. Alma <strong>de</strong> Preta. Rio, Jan <strong>1922</strong>. Manuscrito. Doc.7, Cx.114. Fundo <strong>Pedro</strong> <strong>Calmon</strong> da<br />
FPC.<br />
67 Id., Ibid.<br />
68 Id., Ibid.<br />
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