RESERVA NATURAL VALE
livrofloresta
livrofloresta
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
FLORESTA ATLÂNTICA DE TABULEIRO: DIVERSIDADE E ENDEMISMOS NA <strong>RESERVA</strong> <strong>NATURAL</strong> <strong>VALE</strong><br />
caça (Canale et al., 2012), resultando em “florestas<br />
vazias” (Redford, 1992).<br />
Além dos efeitos da caça, o risco de<br />
atropelamentos de espécies de maior porte<br />
também deve ser apontado para o Bloco Linhares-<br />
Sooretama. A rodovia BR-101 intercepta o bloco<br />
no sentido norte-sul, dividindo-o em porções<br />
leste e oeste. Os atropelamentos de fauna têm<br />
se tornado um problema crescente em diferentes<br />
partes do mundo nos últimos anos (Baskaran &<br />
Boominathan, 2010) e podem apresentar efeito<br />
substancial na demografia das populações de<br />
espécies mais afetadas (Trombulak & Frissell,<br />
2000). No trecho da rodovia BR-101 que<br />
intercepta o Bloco Linhares-Sooretama, destacamse<br />
registros de atropelamentos fatais de onçapintada<br />
e onça-parda, além de pequenos felinos<br />
(Srbek-Araujo et al., 2015), anta (Westermeyer,<br />
2015), capivara, tatus, tamanduá-de-colete,<br />
primatas e cachorro-do-mato, entre outros (Samir<br />
G. Rolim, comunicação pessoal). A rodovia BR-101<br />
será inteiramente duplicada no estado e há previsão<br />
de início das obras, mas ainda não há estudo de<br />
impacto ambiental para o projeto de duplicação do<br />
trecho que intercepta o Bloco Linhares-Sooretama<br />
ou o planejamento de medidas especiais para evitar<br />
ou reduzir o risco de atropelamento de fauna na<br />
região (para detalhes, ver Srbek-Araujo et al.,<br />
2015). As primeiras mobilizações para avaliação<br />
do problema foram iniciadas no final de 2014, mas<br />
ainda não há ações concretas para a resolução da<br />
questão. Além das perdas já observadas, ressaltase<br />
que os mamíferos de médio e grande porte<br />
são especialmente suscetíveis a atropelamentos<br />
em estradas com pistas duplas e em vias de alta<br />
velocidade (Forman & Alexander, 1998), sendo<br />
esperada a intensificação do impacto da rodovia<br />
BR-101 sobre as espécies afetadas após sua<br />
duplicação.<br />
Os cinco grupos funcionais identificados para a<br />
RNV apresentam pelo menos uma espécie ameaçada<br />
de extinção em nível estadual (Chiarello et al., 2007)<br />
e, com exceção de GRANÍVOROS, isso também é<br />
observado para espécies ameaçadas nacionalmente<br />
(MMA, 2014) (Tabela 1). CARNÍVOROS representa o<br />
grupo funcional que reúne o maior número de táxons<br />
sob ameaça, possuindo seis espécies ameaçadas no<br />
estado e/ou no Brasil (55% das espécies inseridas<br />
no grupo em análise). Quando analisado apenas<br />
o subgrupo Carnívoro, a representatividade de<br />
espécies ameaçadas se torna ainda maior (n =<br />
5 ameaçadas no estado e/ou no país, 83% do<br />
subgrupo). As espécies inseridas neste subgrupo,<br />
especialmente os felinos, apresentam função<br />
essencial no controle das populações de presas que<br />
consomem, contribuindo para a estruturação de<br />
toda a comunidade. Outro subgrupo que merece<br />
destaque é Frugívoro/Herbívoro, que compõe o<br />
grupo HERBÍVOROS TERRÍCOLAS. Das seis espécies<br />
inseridas nesse subgrupo, três são ameaçadas no<br />
estado (Chiarello et al., 2007) e duas delas também<br />
em nível nacional (MMA, 2014) (50 e 33%,<br />
respectivamente), sendo a anta uma importante<br />
dispersora de sementes, especialmente de espécies<br />
com estruturas reprodutivas de maior porte,<br />
enquanto o catitu e o queixada são importantes<br />
predadores e dispersores de sementes, participando<br />
da dinâmica de regeneração natural, manutenção<br />
e estruturação das comunidades vegetais. Desta<br />
forma, mesmo que haja alguma sobreposição entre<br />
as espécies citadas, a falta de qualquer componente<br />
desses subgrupos pode acarretar uma série de<br />
alterações secundárias em virtude da perda ou<br />
redução de funções ecológicas essenciais nas<br />
comunidades das quais participam.<br />
De forma geral, os esforços de conservação da<br />
biodiversidade focam quase exclusivamente em<br />
listas de espécies, mas o número total de espécies<br />
e o número de táxons ameaçados são critérios que<br />
não refletem informações relacionadas à história<br />
evolutiva e às características biológicas das espécies<br />
(Mace et al., 2003) ou às funções ecológicas<br />
representadas nas comunidades. Entretanto, a ação<br />
humana pode causar significativas reduções não<br />
apenas no número de espécies, afetando também<br />
a diversidade funcional da comunidade (Cadotte et<br />
al., 2011). Este parâmetro é o que sofre os maiores<br />
declínios (Cadotte et al., 2011), ressaltando que a<br />
conservação de espécies por si só não garante a<br />
manutenção dos serviços ecossistêmicos cruciais<br />
à conservação dos ambientes naturais, sendo<br />
necessários esforços tanto para a conservação<br />
das espécies, quanto da diversidade funcional das<br />
comunidades (Diaz & Cabido, 2001). Uma vez<br />
que a funcionalidade dos ecossistemas é afetada<br />
pela perda das interações ecológicas, este último<br />
476