RESERVA NATURAL VALE
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ROLIM ET AL.<br />
FLORESTA OMBRÓFILA OU ESTACIONAL?<br />
vegetacionais utilizando exclusivamente<br />
classificações climáticas, pois fatores não climáticos<br />
(solo, litologia e relevo) também influenciam o<br />
teor de água no solo e o impacto ecológico de<br />
um período seco. Além disso, os sistemas de<br />
classificação baseiam-se em médias climáticas,<br />
mas valores extremos de seca, vento ou frio podem<br />
exercer maior influência sobre a distribuição da<br />
vegetação (Walsh, 1996a). Somado a isso, a atual<br />
distribuição da vegetação brasileira resulta não<br />
apenas da zonação climática atual, mas também<br />
dos efeitos acumulados dos climas do passado<br />
(Ab’Saber, 1977).<br />
Ainda assim, o clima de uma região, associado a<br />
outras variáveis, como dados fenológicos, podem<br />
ser bons indicadores de tipologias regionais,<br />
portanto passíveis de investigação. De fato, a<br />
caducidade foliar foi outro critério utilizado por<br />
Veloso et al. (1991) durante a elaboração do atual<br />
sistema fitogeográfico brasileiro. Nesse sistema,<br />
as florestas ombrófilas seriam caracterizadas por<br />
manter o dossel perenifólio e ocorrer em clima de<br />
elevadas temperaturas e alta precipitação bem<br />
distribuída durante o ano. Já as florestas estacionais<br />
seriam semideciduais ou completamente deciduais,<br />
sendo a queda foliar ocasionada por longo período<br />
de estiagem ou pelo frio intenso (seca fisiológica).<br />
O aumento da queda de folhas na estação seca<br />
pode ser um indicativo de estresse de água no solo,<br />
já que redução da copa seria uma resposta da planta<br />
para reduzir a perda de água através da transpiração<br />
(Reich & Borchert, 1984; Wright & Cornejo,<br />
1990; Borchert, 1994; Rizzini, 1997, Ivanauskas<br />
& Rodrigues, 2000). Uma das mais importantes<br />
funções do solo é a de operar como reservatório<br />
de água, fornecendo-a às plantas na medida<br />
de suas necessidades. Como a recarga natural<br />
(precipitação) deste reservatório é descontínua, o<br />
volume disponível às plantas é variável: com chuvas<br />
escassas, as plantas podem chegar a exaurir as<br />
reservas armazenadas no solo e atingir o estado<br />
de déficit de água (Reichardt, 1985). Usualmente,<br />
a planta só consegue absorver a água que o solo<br />
retém entre os potenciais mátricos de 0,1 atm<br />
(capacidade de campo) e 15 atm (ponto de murcha<br />
permanente).<br />
A disponibilidade de água é um caráter<br />
fundamental na biologia da planta. O estudo<br />
e o conhecimento do regime de água no solo<br />
sob florestas, e de sua variação anual, é muito<br />
importante, uma vez que inúmeros trabalhos têm<br />
mostrado que o crescimento da floresta é muito<br />
dependente da umidade do solo (revisão em Lima,<br />
1996). Quando a árvore está absorvendo água<br />
do solo pelo processo de transpiração, ela está, ao<br />
mesmo tempo, absorvendo nutrientes, fazendoos<br />
circular internamente, realizando fotossíntese,<br />
transportando seiva elaborada, hormônios e<br />
outras substâncias para todas as partes da árvore.<br />
O crescimento, portanto, está ocorrendo tão<br />
vigorosamente quanto permitem os demais fatores<br />
do meio (Lima, 1979).<br />
Numa simplificação, a transpiração pode ser<br />
considerada como controlada somente por fatores<br />
atmosféricos, enquanto a vegetação estiver bem<br />
suprida por água. Quando o suprimento de água<br />
torna-se limitante, a vegetação sofre “estresse<br />
hídrico” e a transpiração diminui, e todos os<br />
processos metabólicos citados vão se restringindo.<br />
Assim, em consequência da ausência de água<br />
no solo, em muitos dias as árvores não estarão<br />
crescendo à taxa máxima: existem ocasiões em que<br />
o crescimento pode cessar completamente (Lima,<br />
1979).<br />
No caso das florestas presentes em áreas<br />
ecotonais na borda sul amazônica, constatou-se<br />
a presença de duas estações bem definidas: uma<br />
chuvosa e outra seca. A existência de estiagem<br />
superior a 120 dias/ano inclui essas florestas<br />
na categoria de Floresta Estacional, segundo o<br />
sistema proposto por Veloso et al. (1991). Todavia,<br />
essas florestas são predominantemente perenes<br />
(Ratter et al., 1973; Richards, 1996). Como não<br />
há elevada caducidade foliar, assume-se que estas<br />
florestas, apesar do longo período de estiagem, não<br />
sofrem estresse hídrico (Ivanauskas et al., 2008):<br />
são florestas sempre verdes.<br />
A constatação da perenidade foliar e do clima<br />
estacional criou um problema fitogeográfico<br />
para essas florestas, já que a categoria Floresta<br />
Estacional Perenifólia não existia no sistema oficial<br />
de classificação da vegetação brasileira até 2012. A<br />
primeira versão do atual sistema foi desenvolvida na<br />
década de 70, quando um grupo de fitogéografos<br />
envolvidos no projeto Radambrasil foi encarregado<br />
de mapear a vegetação brasileira e organizar a<br />
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