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COSMOS

cosmos_de_carl_sagan

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Apêndice 1Reductio ad Absurdum e a Raiz Quadrada de DoisO argumento pitagórico original da irracionalidade da raiz quadrada de 2 depende de um tipo deargumento chamado reductio ad absurdum; admitimos a veracidade de uma afirmação, observandosuas conseqüências e o surgimento de uma contradição, o que torna a asserção falsa. Para darmos umexemplo moderno, consideremos o aforismo elaborado pelo grande físico do século XX, Niels Bohr: "Ooposto de toda grande idéia é uma outra grande idéia". Se a asserção for verdadeira, suasconseqüências poderão ser, no mínimo, um pouco perigosas. Por exemplo, consideremos o oposto daMedida Áurea, ou da condenação ao mentiroso, ou "Tu não matarás". Vamos considerar então que oaforismo de Bohr seja uma grande idéia. Se for, então a asserção oposta, "O oposto de toda grandeidéia não é uma grande idéia", deve ser verdade também. Devemos tentar a reductio ad absurdum. Se aasserção contrária é falsa, o aforismo não nos deterá, desde que se autoconfesse como não sendo umagrande idéia.Apresentamos uma versão moderna da prova da irracionalidade da raiz quadrada de 2, usando areductio ad absurdum e a álgebra simples ao invés da prova exclusivamente geométrica descobertapelos pitagóricos. O estilo do argumento, a elaboração do pensamento são, pelo menos, tãointeressantes quanto a conclusão:Consideremos um quadrado com lados unitários (1 cm, 1 polegada, 1 ano-luz, isto não importa).A diagonal BC divide o quadrado em dois triângulos, cada um contendo um ângulo reto. Sobre ostriângulos retângulos, o teorema de Pitágoras assegura: 1 2 + 1 2 = x 2 . Mas 1 2 + 1 2 = 1 + 1 = 2, então x 2 =2, então x = √2, raiz quadrada de dois. Vamos admitir que √2 é um número racional: √2= p/q, onde p e qsão números inteiros. Eles podem ser tão grandes quanto queiramos e representar qualquer inteiro queescolhermos. Podemos, certamente, exigir que eles não tenham fatores comuns. Se estipularmos que√2= 14/10, por exemplo, obviamente simplificaríamos por 2 e escreveríamos p = 7 e q = 5, não p = 14 eq = 10. Qualquer fator comum, no numerador ou denominador seria simplificado antes de iniciarmos. Háinfinitos p e q para escolhermos. Partindo de √2 e p/q, ou, multiplicando ambos os membros por q 2 ,temos:p 2 = 2q 2 (Equação 1)p 2 é, então, um número qualquer multiplicado por 2. Portanto, p 2 é um número par. Mas o quadrado dequalquer número ímpar é ímpar. (1 2 = 1; 3 2 = 9; 5 2 = 25; 7 2 = 49, etc). Então p deve ser par, e podemosescrever p = 2s, onde s é um número inteiro qualquer. Substituindo p na equação (1), temos:p 2 = (2s) 2 = 4s 2 = 2q 2Dividindo-se ambos os membros dessa última igualdade por 2, temos:q 2 = 2s 2Portanto, q 2 é um número par e, pelo mesmo argumento que usamos para p, segue que q é par também.Mas se p e q são ambos pares e divisíveis por 2, então eles não foram simplificados por um fator comum,contradizendo uma de nossas asserções. Reductio ad absurdum. Mas, qual asserção? O argumentopode não dizer que a simplificação dos fatores comuns é proibida, que 14/10 é permitido e 7/5 não.Então a asserção inicial pode estar errada; p e q não podem ser números inteiros e √2 é irracional. Defato, √2= 1,4142135...Que conclusão surpreendente e inesperada! Que prova elegante! Mas os Pitagóricos sentiram-secompelidos a abafar essa grande descoberta.

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