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Nada de novo no front(pdf)

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esten<strong>de</strong>ndo-lhe a perna como se fosse uma corista, e Albert, puxando-o pelos pés,<br />

arrasta-o até o alto da escada.<br />

― Tja<strong>de</strong>n!<br />

― Que é?<br />

― Descansar, Tja<strong>de</strong>n; e, por sinal, não se diz “que é?”, mas: “às suas<br />

or<strong>de</strong>ns”... enten<strong>de</strong>u, Tja<strong>de</strong>n?<br />

Tja<strong>de</strong>n replica com uma frase da peça Goetz von Berlichingen, <strong>de</strong> Goethe,<br />

que tem sempre à mão.<br />

Oito dias <strong>de</strong>pois, recebemos or<strong>de</strong>ns para <strong>no</strong>s retirar. Acabou a sopa. Dois<br />

gran<strong>de</strong>s caminhões <strong>no</strong>s apanham. Estão carregados <strong>de</strong> tábuas até em cima, mas,<br />

apesar disto, lá <strong>no</strong> alto, Albert e eu armamos <strong>no</strong>ssa cama com o dossel <strong>de</strong> seda<br />

azul, o colchão e duas colchas <strong>de</strong> renda. Na cabeceira, há um saco com as<br />

melhores provisões para cada um. Às vezes, nós os apalpamos, e as lingüiças, as<br />

latas <strong>de</strong> pasta <strong>de</strong> fígado, conservas e as caixas <strong>de</strong> charutos enchem <strong>de</strong> alegria<br />

<strong>no</strong>ssos corações. Cada homem tem um carregamento idêntico.<br />

Kropp e eu ainda salvamos também duas poltronas <strong>de</strong> veludo vermelho.<br />

Estão em cima da cama, e nós <strong>no</strong>s refestelamos nelas, como se estivéssemos num<br />

camarote <strong>de</strong> teatro. Acima <strong>de</strong> nós, a seda do baldaquim. Cada um fuma um<br />

comprido charuto. Assim instalados, olhamos do alto toda a paisagem.<br />

Entre nós, há uma gaiola <strong>de</strong> papagaio que encontramos e on<strong>de</strong> colocamos o<br />

gatinho que <strong>no</strong>s acompanha, ronronando diante <strong>de</strong> uma tigela <strong>de</strong> carne.<br />

Rolamos lentamente pela estrada. Cantamos. Lá atrás, explo<strong>de</strong>m as<br />

granadas na al<strong>de</strong>ia, agora inteiramente abandonada.<br />

Alguns dias <strong>de</strong>pois, partimos para evacuar outro lugarejo. No caminho,<br />

encontramos os habitantes, que, expulsos <strong>de</strong> suas casas, fogem, arrastando seus<br />

bens em carroças, em carrinhos <strong>de</strong> bebê ou às costas. Os vultos estão curvados,<br />

seus rostos cheios <strong>de</strong> sofrimento, <strong>de</strong> <strong>de</strong>sespero, <strong>de</strong> pressa e <strong>de</strong> resignação. As<br />

crianças penduram-se nas mãos das mães; às vezes, é uma filha mais velha que<br />

leva os me<strong>no</strong>res: caminham aos tropeços, olhando sempre para trás. Algumas<br />

levam <strong>no</strong>s braços suas pobres bonecas. Todos se calam quando passam por nós.<br />

Ainda vamos em coluna <strong>de</strong> marcha. Provavelmente, os franceses não vão<br />

atirar numa al<strong>de</strong>ia on<strong>de</strong> há compatriotas seus. Mas, poucos minutos <strong>de</strong>pois, o ar<br />

enche-se <strong>de</strong> zunidos, a terra treme, soam gritos ― uma granada acaba <strong>de</strong><br />

pulverizar o último pelotão da retaguarda. Dispersamo-<strong>no</strong>s e atiramo-<strong>no</strong>s ao chão,<br />

mas, <strong>no</strong> mesmo instante, sinto que me abandona o sangue-frio que, sob o fogo,<br />

me leva inconscientemente a agir certo. Um pensamento me arrebata: “Você está<br />

perdido”, e um medo terrível parece estrangular-me; <strong>no</strong> momento seguinte, sinto<br />

um algo varrer como um chicote por sobre minha perna esquerda. Ouço Albert<br />

gritar, a meu lado.<br />

― De pé, vamos, Albert! ― grito, pois estamos sem proteção em campo<br />

aberto.

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