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Nada de novo no front(pdf)

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contudo, isto aqui é um único hospital, uma única enfermaria. Na Alemanha, há<br />

cem mil, cem mil na França, cem mil na Rússia. Como é inútil tudo quanto já foi<br />

escrito, feito e pensado, quando não se conseguem evitar estas coisas! Devem ser<br />

mentiras e insignificâncias, quando a cultura <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> a<strong>no</strong>s não conseguiu<br />

impedir que se <strong>de</strong>rramassem esses rios <strong>de</strong> sangue e que existam aos milhares estas<br />

prisões, on<strong>de</strong> se sofrem tantas dores. Só o hospital mostra realmente o que é a<br />

guerra.<br />

Sou jovem, tenho vinte a<strong>no</strong>s, mas da vida conheço apenas o <strong>de</strong>sespero, o<br />

medo, a morte e a mais insana superficialida<strong>de</strong> que se esten<strong>de</strong> sobre um abismo<br />

<strong>de</strong> sofrimento. Vejo como os povos são insuflados uns contra os outros e como se<br />

matam em silêncio, ig<strong>no</strong>rantes, tolos, submissos e i<strong>no</strong>centes. Vejo que os cérebros<br />

mais inteligentes do mundo inventam armas e palavras para que tudo isto se faça<br />

com mais requintes e maior duração. E, como eu, todos os homens <strong>de</strong> minha<br />

ida<strong>de</strong>, tanto <strong>de</strong>ste quanto do outro lado, <strong>no</strong> mundo inteiro, vêem isto; toda a minha<br />

geração sofre comigo. Que fariam <strong>no</strong>ssos pais se um dia nós <strong>no</strong>s levantássemos e<br />

<strong>no</strong>s apresentássemos a eles, para exigir que <strong>no</strong>s prestassem contas? Que esperam<br />

<strong>de</strong> nós, se algum dia a guerra terminar? Durante todos esses a<strong>no</strong>s, <strong>no</strong>ssa única<br />

preocupação foi matar. Nossa primeira profissão na vida. Nosso conhecimento da<br />

vida limita-se à morte. Que se po<strong>de</strong> fazer, <strong>de</strong>pois disto? Que será <strong>de</strong> nós?<br />

O mais velho <strong>de</strong> <strong>no</strong>ssa enfermaria é Lewandowski. Tem quarenta a<strong>no</strong>s e já<br />

está <strong>no</strong> hospital há <strong>de</strong>z meses, com um grave ferimento <strong>no</strong> ventre. Somente nas<br />

últimas semanas conseguiu recuperar-se a ponto <strong>de</strong> dar alguns passos, curvado e<br />

capengando.<br />

Já há alguns dias está numa gran<strong>de</strong> agitação. Sua mulher lhe escreveu, do<br />

pequeni<strong>no</strong> lugarejo on<strong>de</strong> mora, na Polônia, contando que conseguiu juntar<br />

dinheiro para pagar a viagem e que vem visitá-lo.<br />

Ela já está a caminho, e po<strong>de</strong> chegar a qualquer hora. Para Lewandowski, a<br />

comida não tem mais sabor, até dá <strong>de</strong> presente o repolho roxo com lingüiça, mal<br />

começa a comer. Não pára <strong>de</strong> andar pela enfermaria, tendo na mão a carta que<br />

todos já leram <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> vezes; o carimbo foi não sei quantas vezes comprovado,<br />

a letra está quase irreconhecível, tantas são as manchas <strong>de</strong> gordura e as marcas <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>dos. Como era <strong>de</strong> se esperar, Lewandowski fica com febre e é obrigado a voltar<br />

para a cama.<br />

Não vê a mulher há dois a<strong>no</strong>s. Neste ínterim, ela teve uma criança, que virá<br />

com ela. Mas há algo que preocupa Lewandowski. Tinha esperança <strong>de</strong> receber<br />

permissão para sair, quando sua mulher chegasse; vê-la já é muito, mas, quando<br />

um homem fica perto da mulher <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tanto tempo <strong>de</strong> separação, gostaria <strong>de</strong><br />

outra coisa.<br />

Lewandowski já discutiu isto co<strong>no</strong>sco durante várias horas, pois na tropa<br />

não se faz segredo <strong>de</strong>stas coisas. E ninguém vê nada <strong>de</strong> extraordinário nisto.<br />

Aqueles que já po<strong>de</strong>m sair contaram-lhe sobre alguns recantos propícios na

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