13.04.2013 Views

Nada de novo no front(pdf)

Nada de novo no front(pdf)

Nada de novo no front(pdf)

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Assim, vivemos uma existência fechada e dura, da maior superficialida<strong>de</strong>, e<br />

só às vezes um acontecimento consegue produzir uma centelha. Mas, então,<br />

inesperadamente, irrompe a chama dolorosa e terrível da ansieda<strong>de</strong>.<br />

Estes são os instantes perigosos, porque <strong>no</strong>s mostram que a adaptação é,<br />

enfim, apenas superficial, que não é a verda<strong>de</strong>ira calma, mas a e<strong>no</strong>rme tensão<br />

capaz <strong>de</strong> produzila. Nós <strong>no</strong>s distinguimos dos aborígines apenas pelos aspectos<br />

exteriores da vida. Mas, enquanto eles po<strong>de</strong>m permanecer para sempre assim,<br />

porque este é o seu estado natural e o máximo que po<strong>de</strong>m fazer é continuar a<br />

<strong>de</strong>senvolverse pelo exercício <strong>de</strong> suas forças espirituais, co<strong>no</strong>sco dá-se o contrário:<br />

<strong>no</strong>ssas forças interiores não ten<strong>de</strong>m para o <strong>de</strong>senvolvimento, mas para a<br />

regressão. O primitivismo que neles é <strong>no</strong>rmal e evolui naturalmente, nós só<br />

obtemos à custa <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s esforços e <strong>de</strong> artifícios.<br />

E, à <strong>no</strong>ite, assustados, ao <strong>de</strong>spertar <strong>de</strong> um sonho, subjugados pelo<br />

encantamento <strong>de</strong> visões que <strong>no</strong>s cercam, compreen<strong>de</strong>mos como são frágeis o<br />

apoio e o limite que <strong>no</strong>s separam das trevas: somos pequenas chamas,<br />

malprotegidas por pare<strong>de</strong>s fracas contra a tempesta<strong>de</strong> do <strong>de</strong>smoronamento e da<br />

insensatez em que vacilamos e, às vezes, quase <strong>no</strong>s extinguimos. Então, o rugido<br />

abafado da luta torna-se um anel que <strong>no</strong>s aperta; e<strong>no</strong>velamo-<strong>no</strong>s e penetramos a<br />

<strong>no</strong>ite com os olhos arregalados. Nosso único alento é ouvir a respiração tranqüila<br />

dos companheiros adormecidos; assim, esperamos o nascer do dia.<br />

Cada dia e cada hora, cada granada e cada morte corroem um pouco mais<br />

este frágil apoio, e os a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>sgastam<strong>no</strong> rapidamente. Observo como ele já<br />

começa a <strong>de</strong>smoronar a minha volta.<br />

É o caso <strong>de</strong> Detering.<br />

Era um dos que se fechavam muito <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> si. Sua <strong>de</strong>sgraça foi ter<br />

<strong>de</strong>scoberto uma cerejeira num jardim. Acabávamos <strong>de</strong> voltar da frente quando,<br />

numa curva do caminho, perto do <strong><strong>no</strong>vo</strong> alojamento, surgiu, maravilhosamente, na<br />

luz do amanhecer, uma cerejeira. Não tinha folhas, mas era uma única massa <strong>de</strong><br />

pétalas.<br />

À <strong>no</strong>ite, ninguém viu Detering. Por fim, apareceu com uns galhos <strong>de</strong><br />

cerejeira em flor. Zombamos <strong>de</strong>le, perguntando se ia a algum casamento. Não<br />

respon<strong>de</strong>u e <strong>de</strong>itou-se. À <strong>no</strong>ite, ouvi como se movimentava, parecia estar fazendo<br />

malas. Pressentindo algo <strong>de</strong> estranho, fui falar com ele. Procurava disfarçar, como<br />

se nada houvesse, e eu lhe disse:<br />

― Deixe <strong>de</strong> besteira, Detering.<br />

― Não é nada... é só que não consigo dormir.<br />

― Por que apanhou os ramos <strong>de</strong> cerejeira?<br />

― Mas será que é proibido apanhar ramos <strong>de</strong> cerejeira? ― indaga<br />

obstinadamente e, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> um intervalo... ― Lá em casa, tenho um gran<strong>de</strong><br />

pomar com cerejeiras. Quando florescem, vistas do palheiro, dão a impressão <strong>de</strong><br />

um gran<strong>de</strong> lençol todo branco. Agora é a época...

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!