You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
termos que ouvir mais esses gritos.<br />
E, apesar <strong>de</strong> tudo, nem homens são, apenas cavalos. Do grupo escuro,<br />
<strong>de</strong>stacam-se as padiolas. Alguns tiros crepitam. As gran<strong>de</strong>s massas estremecem e<br />
tornam-se me<strong>no</strong>res. Até que enfim! Mas ainda não acabou. Os homens não<br />
conseguem aproximar-se dos animais feridos, que, <strong>no</strong> seu medo, fogem, levando<br />
toda a dor nas bocas escancaradas.<br />
Uma das silhuetas fica <strong>de</strong> joelhos; um tiro... um cavalo cai... e <strong>de</strong>pois outro.<br />
O último apóia-se nas patas dianteiras e gira como um carrossel; sentado,<br />
continua a rodar nas pernas dianteiras apoiadas; provavelmente, a espinha está<br />
quebrada. O soldado aproxima-se correndo e o abate. Lentamente, com<br />
humilda<strong>de</strong>, a massa <strong>de</strong>sliza para o chão.<br />
Tiramos as mãos dos ouvidos. Os gritos silenciaram. Apenas num suspiro<br />
prolongado, que vai se extinguindo, ainda paira <strong>no</strong> ar. Agora só os foguetes, o<br />
assobio das granadas e as estrelas <strong>no</strong>vamente... e isto é quase estranho.<br />
Detering anda <strong>de</strong> um lado para outro, praguejando:<br />
― Gostaria <strong>de</strong> saber que culpa têm estes pobres animais!<br />
Em seguida, volta ao mesmo assunto; sua voz está agitada, seu tom é quase<br />
solene, quando diz:<br />
― É o que digo a vocês, usar animais na guerra é a maior infâmia do<br />
mundo!<br />
Voltamos para a retaguarda. Está na hora <strong>de</strong> chegarem <strong>no</strong>ssos caminhões.<br />
O céu ficou um pouco mais claro. São três horas da madrugada. O vento está<br />
limpo e fresco, a hora pálida torna <strong>no</strong>ssos rostos cinzentos.<br />
Tateando, avançamos uns atrás dos outros, através das trincheiras e dos<br />
buracos <strong>de</strong> granadas, e chegamos <strong>no</strong>vamente na zona da neblina. Katczinsky está<br />
inquieto; é um mau sinal.<br />
― Que tem você, Kat? ― pergunta Kropp.<br />
― Queria que já estivéssemos em casa.<br />
“Em casa”... ele quer dizer nas barracas do acampamento.<br />
― Não vai <strong>de</strong>morar muito mais, Kat.<br />
Ele está nervoso.<br />
― Não sei, não sei.<br />
Chegamos às trincheiras, e <strong>de</strong>pois aos prados. Aparece o peque<strong>no</strong> bosque;<br />
aqui, conhecemos cada palmo <strong>de</strong> terre<strong>no</strong>. Lá adiante, fica o cemitério dos<br />
caçadores, com os montículos e as cruzes negras.<br />
Neste instante, atrás <strong>de</strong> nós um silvo agudo, que aumenta e se transforma<br />
num po<strong>de</strong>roso trovejar. Abaixamo-<strong>no</strong>s... cem metros à <strong>no</strong>ssa frente, sobe uma<br />
nuvem <strong>de</strong> fogo; sob o impacto <strong>de</strong> uma segunda explosão, uma parte do bosque<br />
sobe lentamente <strong>no</strong> ar, arrancando três ou quatro árvores que <strong>de</strong>pois caem em<br />
pedaços. As granadas que se seguem assobiam como válvulas <strong>de</strong> cal<strong>de</strong>iras ― o<br />
fogo é pesado.<br />
― Abriguem-se! ― berra alguém. ― Abriguem-se!