Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN
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em 31% nos preços dos aluguéis na cidade. Em<br />
2010, um levantamento do Sindicato do Mercado<br />
Imobiliário de São Paulo (Secovi-SP) apontou que a<br />
cidade tinha o segundo metro quadrado mais caro<br />
do interior do Estado, atrás apenas de Campinas.<br />
Dentro deste panorama, essa expansão é ainda mais<br />
intensa nas regiões leste e sul do município, onde<br />
fica o Pinheirinho. Segundo dados da Secretaria de<br />
Planejamento Urbano de São José, em 2009, 53,7%<br />
dos alvarás de construção concedidos pela prefeitura<br />
foram para a região sul, já entre as autorizações para<br />
moradia em novos imóveis, quase metade foi para a<br />
mesma área.<br />
Renato Simões considera que a questão econômica<br />
ainda teria se cruzado com outros dois aspectos. O<br />
primeiro seria o interesse político da prefeitura em um<br />
ano eleitoral. Pesquisas prévias ao despejo mostravam<br />
apoio da população à operação. Simões considera,<br />
entretanto, que o desgaste teria sido maior do que o<br />
esperado. O segundo fator seria o recrudescimento<br />
da violência policial no governo Alckmin. Como<br />
exemplo desse panorama, ele cita a perseguição aos<br />
usuários de drogas na cracolândia, o autoritarismo na<br />
<strong>Universidade</strong> de São Paulo e o aumento da repressão<br />
às manifestações de rua. Para ele, as consequências<br />
– inclusive legais – do caso Pinheirinho podem ser<br />
importantes para barrar tal escalada repressiva.<br />
Dentro desse cenário de recrudescimento, a<br />
reintegração de posse ganha um significado especial.<br />
Na avaliação de Ivan Valente prevaleceu “a lógica de<br />
que se você consegue uma vitória numa ocupação<br />
como a do Pinheirinho, você abre uma avenida para<br />
novas ocupações. O caso passou a ser uma discussão<br />
política de exemplo”. Para as arquitetas Carolina<br />
Carmona e Isadora Guerreiro, do Coletivo Usina,<br />
“o Pinheirinho era um exemplo para outras lutas<br />
urbanas e, por isso, foi também exemplarmente<br />
exterminado, em uma desocupação que poderíamos<br />
chamar de espetacular”.<br />
Quem responde pela barbárie?<br />
Há uma série de esforços para levantar e<br />
registrar as ilegalidades e abusos ocorridos durante<br />
todo o episódio do Pinheirinho e, posteriormente,<br />
responsabilizar judicialmente os agentes. De maneira<br />
articulada ou não, organizações de direitos humanos,<br />
movimentos sociais, advogados e entidades da área<br />
de Direito estão agindo e produzindo subsídios para<br />
levar adiante denúncias dentro e fora do Brasil.<br />
Nas mãos da Defensoria Pública de São José<br />
estão 516 ações judiciais individuais relacionadas ao<br />
Pinheirinho. De acordo com Jairo Salvador, as ações<br />
se referem à violência policial, morte de animais<br />
e destruição e sumiço de móveis. Salvador afirma<br />
que “além dessas ações individuais – que buscam<br />
reparação de cada morador que se sentiu ofendido<br />
na sua integridade física, psíquica ou patrimonial –,<br />
nós vamos entrar com uma ação contra o Estado em<br />
relação ao conjunto da obra”.<br />
O papel do Estado no episódio também será alvo<br />
de responsabilização no relatório do Condepe. O<br />
relator do documento, Renato Simões, afirma que<br />
os três níveis do Poder Executivo serão de alguma<br />
forma responsabilizados. Apesar das investigações<br />
ainda estarem em curso, Simões já sinaliza alguns<br />
encaminhamentos. Em relação à parte social, a prefei<br />
tura teria maiores respon sa bilidades. Entre os<br />
problemas, ele aponta que a Guarda Civil Municipal<br />
estava “totalmente despreparada, usando armas de<br />
fogo, sem nenhum tipo de controle” e os assistentes<br />
sociais teriam sido “utilizados contra todos os<br />
códigos de ética da profissão”. Como grandes<br />
responsá veis pela ação de reintegração de posse, o<br />
relatório deve apontar o governo e o Poder Judiciário<br />
estadual. Simões pondera que “a ação policial só foi<br />
possível por uma determinação política do Tribunal<br />
de Justiça de fazer as coisas daquela forma”.<br />
A assistente social e docente da <strong>Universidade</strong><br />
Federal Fluminense (UFF), Tatiana Dahmer,<br />
considera que a reintegração desrespeitou os<br />
“parâmetros mínimos do que se pode reconhecer<br />
por Estado de Direito” com a realização do despejo<br />
“de madrugada, quase amanhecendo, arremessando<br />
para cada casa uma bomba de gás, arrancando as<br />
pessoas sem que pudessem ao menos retirar seus<br />
bens, documentos, suas coisas mais pessoais, suas<br />
recordações – que foram soterrados na derrubada<br />
das casas”.<br />
Analisando a atuação do Judiciário no caso,<br />
Renato Simões enxerga “absurdos” no processo. Para<br />
ele, houve a sobreposição “do direito de propriedade<br />
Pinheirinho, o Estado como agente da barbárie<br />
ANDES-<strong>SN</strong> n junho de 2012 181