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Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN

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e também aulas de reforço para as crianças. Segundo<br />

Joice, 24 anos, moradora e mãe de duas crianças, uma<br />

de 7 anos e outra de 3 meses:<br />

Tem crianças que vieram de fora, da<br />

região nordeste, e chegaram aqui sem saber<br />

ler... Não querendo menosprezar o trabalho<br />

das escolas, mas aqui ficou bem mais fácil,<br />

porque tinha aqui o reforço. Aqui funciona<br />

esse reforço. Estimula que estude, mas vê as<br />

dificuldades. Eles acompanham as crianças na<br />

sua necessidade individual. Porque cada um tem<br />

a sua necessidade, então, eles procuram estar<br />

ajudando.<br />

A percepção de Raquel, moradora de 28 anos, mãe<br />

de duas crianças, tem o mesmo sentido:<br />

Todas as crianças que fazem parte dessa<br />

comunidade descem pra escolinha. Minha<br />

filha estava com dificuldade, e agora ela já está<br />

lendo tudo que ela vê, em placa de ônibus e<br />

tal, ela sai: “Mãe, tá certo, é isso que tá escrito?<br />

É assim mesmo?”. Os meus filhos ainda são<br />

pequenininhos, mas têm crianças aqui, como<br />

no caso dos filhos da Neide, que já têm 13, 14<br />

anos... Muitos viviam na Central, trabalhando<br />

de alguma forma na rua, vendendo cerveja...<br />

Mas na rua, não era legal pra eles! Aqui,<br />

termina tendo facilidades de estar no meio de<br />

uma creche... e depois que eles vieram morar<br />

aqui, essa creche fez com que a cabeça deles<br />

melhorasse muito.<br />

Os responsáveis pelo Espaço parecem querer<br />

proporcionar às crianças uma educação menos<br />

punitiva, mais consciente e transformadora. A essas<br />

preocupações, somam-se outras, que dizem respeito<br />

a educar para a vida. Suzete diz:<br />

[...] as crianças chegavam aqui e pegavam<br />

as estantes de livros, e rasgavam tudo! Os pais<br />

olhavam assim e falavam: “meu Deus, que<br />

loucura!”. Hoje, você pode deixar, eles não<br />

rasgam. Tem uma estante deles, é pequenininha,<br />

lá na salinha... Tem poucos livros, mas eles têm<br />

acesso, eles podem pegar, e eles sabem que não<br />

podem rasgar. Quando a gente vê que rasga, sem<br />

aquela coisa de “por que você rasgou?” Falo:<br />

“gente, isso acontece...”, e aí vou explicando...<br />

Porque é uma coisa muito ruim tratar a criança<br />

como se fosse uma punição. Educação não é<br />

punitiva. Nós temos uma educação punitiva,<br />

por causa do regime militar, por causa desse<br />

colonialismo... [...] Eu trabalho muito a questão<br />

do conceito da comida, do comer, do comer de<br />

tudo, tento trabalhar a merenda escolar, não<br />

essa merenda do refrigerante, mas assim: vamos<br />

comer hoje tomate, a gente leva pra merenda<br />

cenoura, pepino... A criança não come essas<br />

coisas em casa. E as mães falam que eles não<br />

gostam. Mas quando chega à escola, corta o<br />

pepino em rodelinhas, pega a cenoura... Então,<br />

se você faz um suco de beterraba com laranja, a<br />

criança bebe, come, sabe... a gente contando as<br />

histórias, a gente vai tentando mudar um pouco<br />

essa pedagogia, essa educação deformada...<br />

Além das aulas de reforço e de uma educação<br />

menos punitiva, as crianças também são estimuladas<br />

no que tange ao acesso à cultura: “a gente pôs um<br />

trabalho muito forte na área de leitura, mas também<br />

de sair desse Espaço, de ir à praia, de ir à Quinta da<br />

Boa Vista, de ir a alguns cinemas, no museu, de estar<br />

reunido com elas.” Suzete explica ainda que isso é<br />

possível por conta da localização da ocupação, no<br />

Centro da cidade: “a gente vai, vai de graça. Porque é<br />

tudo aqui, na região [...] como essa região é uma área<br />

cultural, então dá pra criança sair, conhecer também<br />

o próprio espaço onde ela mora, onde ela vive. Isso<br />

pra gente é muito importante”.<br />

A partir das informações coletadas junto aos<br />

moradores, é possível avaliar que, se por um lado,<br />

há avanços muito visíveis no trabalho com as<br />

crianças da ocupação, por outro, as dificuldades para<br />

organizar os adolescentes em torno de seus interesses<br />

se revelam maiores. Conforme Lurdinha, uma das<br />

lideranças da ocupação, é difícil ter um jovem – com<br />

afinidade e com as aspirações deste grupo etário<br />

– ao mesmo tempo com formação e experiência<br />

políticas suficientes para dar conta das tarefas dessa<br />

articulação:<br />

O que eles mais reclamam é a falta de uma<br />

metodologia que articule a questão da luta<br />

com os interesses deles como juventude. Então,<br />

tem que ter gente muito trabalhada nisso...<br />

Um jovem como eles, pra trabalhar com eles<br />

a questão da organização da juventude, que<br />

deve ter um mínimo de formação política, de<br />

capacitação pra isso, e também poder ficar<br />

dedicado a isso. Não dá pra fazer um milhão de<br />

outras coisas, não só da militância, mas da vida<br />

pessoal... e, além disso tudo, se capacitar, ter<br />

formação política para organizar a juventude.<br />

Luta por moradia, educação e direitos humanos<br />

ANDES-<strong>SN</strong> n junho de 2012 63

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