Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN
Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN
Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
da especulação imobiliária, a venda desses terrenos<br />
e prédios, como no caso da zona portuária carioca.<br />
É neste contexto que os movimentos sociais<br />
que lutam por moradia e as pessoas que buscam<br />
alternativas de habitação, entre outras estratégias,<br />
se mobilizam para ocupar. Diante da ociosidade de<br />
milhares de imóveis públicos e privados, em áreas<br />
com infraestrutura urbana e próximas aos pos tos<br />
de trabalho, encontram nas ocupações de prédios<br />
abandonados, particularmente nas áreas centrais13 ,<br />
uma forma de acesso à moradia e, como veremos, de<br />
muitos outros sonhos14 .<br />
2. Pais, filhos e educação na<br />
ocupação Manoel Congo<br />
A ocupação Manoel Congo15 foi iniciada em 2007,<br />
quando cerca de 70 famílias ocuparam o prédio<br />
privado que outrora fora um cinema no Centro do<br />
Rio – o Cine Vitória, fechado havia mais de dez anos.<br />
A iniciativa, liderada pelo Movimento Nacional de<br />
Luta por Moradia – MNLM-RJ16 e efetivada após um<br />
longo processo de reuniões, debates e articulações,<br />
marcava o dia 1º de outubro, comemorado como Dia<br />
Internacional do Habitat17 .<br />
As famílias ali permaneceram por uma semana,<br />
e, após promover algumas ações culturais no local,<br />
foram despejadas no dia 8 de outubro. Rumaram,<br />
então, a um prédio público abandonado, que<br />
abrigara a Secretaria Estadual da Fazenda. Com a<br />
pressão do governo do Estado e a polícia a postos,<br />
sofreram novo despejo. Após mais alguns dias de<br />
intensas manifestações e contando com o apoio e<br />
solidariedade de diversos movimentos sociais18 ,<br />
as famílias dirigiram-se a outro prédio no Centro,<br />
pertencente ao Instituto Nacional de Seguridade<br />
Social – INSS, que se encontrava vazio e sem cumprir<br />
qualquer finalidade social há muitos anos.<br />
Apesar do avanço das negociações com diferentes<br />
esferas do governo e da promessa de recursos<br />
financeiros para a compra do prédio e sua destinação<br />
à habitação das famílias, as pressões pelo despejo<br />
foram intensas, pelo menos até o fim de 200819 .<br />
Porém, o movimento foi vitorioso e as famílias<br />
permanecem no local até hoje20 .<br />
Neste momento, a posse do prédio está em<br />
vias de concretização. Depois de muita pressão, o<br />
MNLM conseguiu a liberação de recursos federais<br />
para a compra do prédio do INSS. Com a transação<br />
finalizada, as famílias passarão a ter a concessão de<br />
uso e serão liberados recursos também para parte<br />
das obras de reforma no prédio. Adicionalmente,<br />
a ocupação conseguiu aprovar, junto à Petrobras,<br />
um projeto de geração de trabalho e renda para os<br />
moradores, que direcionará recursos financeiros para<br />
formação, capacitação profissional e obras, visando<br />
implementar uma Casa de Samba e Cultura21 e um<br />
restaurante no andar térreo do prédio.<br />
A necessidade de implementar políticas de<br />
trabalho e renda parece estar intimamente ligada à<br />
questão da moradia no Rio de Janeiro. A maioria dos<br />
moradores da Manoel Congo tem empregos de baixa<br />
remuneração, é trabalhador precário, do comércio<br />
informal (ambulante) ou está desempregado. Tanto<br />
esta constatação, como as experiências prévias<br />
de outras ocupações (do MNLM ou dos demais<br />
movimentos de luta por moradia), ajudam a explicar<br />
por que nesta ocupação, como em outras, se expressa<br />
uma clara prioridade à efetivação de uma política<br />
de geração de trabalho e renda, e também muita<br />
solidariedade em relação às lutas pelos direitos dos<br />
ambulantes e contra a política governamental de<br />
“choque de ordem” 22 .<br />
A ocupação dos espaços do prédio que abriga<br />
a Manoel Congo é objeto de ampla reflexão e<br />
discussão entre os moradores, submetida a decisões<br />
em assembleias, e deve estar enquadrada na Carta<br />
de Princípios23 da comunidade. Nos andares mais<br />
baixos do prédio (que possui dez andares e não<br />
tem elevador em funcionamento), os apartamentos<br />
são ocupados, prioritariamente, por famílias com<br />
crianças pequenas, idosos ou pessoas doentes. Além<br />
dos espaços reservados para geração de trabalho<br />
e renda, há locais destinados ao lazer, à cultura, e<br />
um salão comumente utilizado para assembleias,<br />
cursos de formação, reuniões do MNLM e de outros<br />
movimentos24 .<br />
Atualmente, há 42 famílias (120 pessoas),<br />
morando na ocupação Manoel Congo. Metade<br />
dos moradores tem menos de 30 anos, e mais de<br />
um quarto encontra-se na faixa etária entre 0 e 18<br />
Luta por moradia, educação e direitos humanos<br />
ANDES-<strong>SN</strong> n junho de 2012 61