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Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN

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Escritos Militantes<br />

ou melhor, republicano burguês que reinava no<br />

período: era necessário instituir uma educação<br />

pública, todavia não apartá-la do sentimento cristão,<br />

era necessário manter o controle dos trabalhadores e<br />

de suas consciências. Os trabalhadores, entendendo<br />

a importância da educação para a construção de<br />

ferramentas para que o conjunto da classe avançasse<br />

na consciência, defendiam o “puramente laico”, com<br />

o objetivo de pautar a história da filosofia do povo<br />

na contramão do livro sagrado. Trata-se aqui de uma<br />

ruptura com a concepção republicana hegemonizada<br />

pela classe dominante.<br />

A instituição da educação para as meninas foi<br />

outro ponto de ruptura. Só uma sociedade com vistas<br />

à emancipação poderia ter condições de destruir<br />

a divisão sexual do trabalho, de tirar a mulher<br />

exclusivamente da esfera do privado, de possibilitar<br />

que as meninas tivessem acesso à educação formal,<br />

uma vez tendo sido defendido o caráter unitário e<br />

integral da educação pública para meninos e meninas.<br />

Até o momento, nenhuma sociedade republicana<br />

havia inserido as meninas nos seus sistemas<br />

educacionais, inclusive a própria ideia de um sistema<br />

educacional ainda estava sendo gestada.<br />

A própria noção de público apresentou uma<br />

ruptura. Os museus foram abertos para o povo, assim<br />

como as bibliotecas. O público não se restringia aos<br />

que possuíam o direito a propriedade, como indicava<br />

a Carta Magna proclamada pela Revolução Francesa,<br />

onde os ideais de “liberdade, igualdade e fraternidade”<br />

pressupunham a propriedade privada (Marx, 2007).<br />

O público era pertencente a todos os “cidadãos”<br />

parisienses, a todos os trabalhadores e trabalhadoras.<br />

O público assumiu seu caráter popular, pertencente<br />

ao povo de Paris, sendo o mesmo responsável pela<br />

construção e consolidação deste projeto.<br />

Segundo Porsper-Olivier Lissagaray a Comuna<br />

“traçou a linha bem nítida entre eles e a classe<br />

devoradora, esclareceu as relações de classe com<br />

tal brilho, que a história da Revolução Francesa<br />

iluminou-se e deve ser retomada pela base”<br />

(2003, p. 97). Ou seja, a Comuna de Paris representou<br />

um ponto de inflexão na história da luta dos<br />

trabalhadores na França, pois foi capaz de esclarecer<br />

as relações sociais que estavam sendo gestadas e<br />

postas em movimento no fim do século XIX.<br />

94 UNIVERSIDADE E SOCIEDADE<br />

Neste sentido, apesar da breve experiência, a<br />

concepção de educação pública e popular, gratuita,<br />

laica, para meninos e meninas formulada e gestada<br />

pelos trabalhadores e trabalhadoras “em armas”,<br />

ao longo destes 72 dias, deixou um grande legado<br />

para as gerações futuras. Foi parte de um projeto<br />

revolucionário, só possível de ser pensando e<br />

construído, mesmo que inicialmente, devido à luta<br />

travada pelos trabalhadores contra a burguesia<br />

francesa. Os comunards, apesar da pressão concreta<br />

da contrarrevolução e dos limites internos, tinham<br />

consciência de que a “reforma da educação”,<br />

entendida por eles como uma transformação radical<br />

seria elemento central para a construção de uma<br />

nova sociedade. Não por acaso, a preocupação com<br />

a educação infantil, com as creches, entre outras.<br />

A Comuna de Paris nos indicou elementos para<br />

compreender que para construir uma nova sociedade<br />

é necessário garantir que estes novos sujeitos em<br />

construção possam compreendê-la na sua totalidade.<br />

A luta contra o misticismo religioso-burguês,<br />

não deixou ser uma luta pela universalização das<br />

ferramentas capazes de possibilitar a construção de<br />

sujeitos, autônomos, reflexivos e permanentemente<br />

inquietos, revolucionários.<br />

Contudo, pelas lentes da educação, foi possível<br />

identificar elementos de ruptura com o projeto<br />

republicano burguês, originado em 1789. A classe<br />

dominante ao longo do século XIX, sobretudo na<br />

segunda metade, evidenciou seu caráter conservador,<br />

ao tentar, a todo custo, depois de uma conquista que<br />

ampliava a participação popular, a tarefa passava<br />

a ser a de reprimir o conjunto dos trabalhadores<br />

mais organizados. Foi capaz de aceitar o Golpe de<br />

Bonaparte, para não perder o poder. Isso reforça a tese<br />

de que somente com os ideais republicanos, não seria<br />

possível construir a ruptura como o sistema capitalista.<br />

Como bem aponta Trotsky (2002), a despeito desta<br />

experiência restrita e da falta de preparação dos seus<br />

militantes, da ausência de um programa e de unidade<br />

entre os dirigentes, o que podemos entender como a<br />

ausência de um partido maduro capaz de aglutinar e<br />

compor uma unidade da classe, a Comuna teria sido a<br />

“aurora ainda que bem pálida, da Primeira República<br />

Proletária” (2002, p. 151).

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