Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN
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Escritos Militantes<br />
conquista da moradia e a sua localização. Por outro<br />
lado, a percepção dos moradores quanto à dimensão<br />
da mudança relativa a cada um desses direitos não<br />
é uniforme, variando conforme a condição anterior<br />
de moradia de cada uma das famílias. Destaca-se<br />
que, também a respeito desses temas, as falas dos<br />
moradores apontam a organização da ocupação<br />
como fundamental para as mudanças positivas<br />
relativas à segurança e educação.<br />
Se a visão de cada um dos moradores quanto ao<br />
acesso a uma série de direitos varia, por outro lado,<br />
é uma constante nas falas a afirmação da mudança<br />
de si mesmo, de sua visão do mundo e de suas<br />
condições gerais de vida. Em nossa análise, isso não<br />
pode ser explicado tão somente pela conquista da<br />
moradia e sua localização. Nossa pesquisa sugere<br />
que a explicação para a mudança na visão que as<br />
pessoas têm de si mesmas e do mundo reside muito<br />
mais na participação – delas e de suas famílias – nas<br />
lutas sociais, em um movimento social organizado, e<br />
como fruto da experiência de morar em um espaço<br />
onde se vive e se tomam decisões coletivamente.<br />
Sugere que, para além do direito à moradia, o direito<br />
de lutar também é fundamental.<br />
Por fim, algumas falas dos moradores evidenciam<br />
a percepção de si mesmos como sujeitos históricos,<br />
capazes de entender e transformar o mundo.<br />
E nós consideramos este, também, um direito<br />
humano essencial.<br />
68 UNIVERSIDADE E SOCIEDADE<br />
notas<br />
1. Uma primeira e reduzida versão desse artigo<br />
foi apresentada ao III Seminário Internacional de<br />
Direitos Humanos, Violência e Pobreza: a situação<br />
de crianças e adolescentes na América Latina hoje.<br />
Universidad de La República de Uruguay, Montevideo<br />
(24 a 26 de novembro de 2010).<br />
2. Acompanhamos a história da Manoel Congo<br />
desde antes de realizada a ocupação, como parte de<br />
um trabalho militante e de pesquisa participante. Para<br />
este artigo, além do acúmulo da pesquisa de campo,<br />
realizamos uma série de entrevistas com moradores<br />
da ocupação: coordenadores do MNLM, jovens e<br />
pais com filhos pequenos. Utilizamos ainda uma<br />
formidável entrevista, que acompanhamos, realizada<br />
pelo professor Razack Karriem, da Cornell University<br />
(Department of City and Regional Planning, Ithaca,<br />
New York, Cornell, EUA), que gentilmente nos cedeu<br />
o material gravado, pelo qual somos muito gratos.<br />
3. Segundo levantamento realizado pela<br />
Prefeitura do Rio existem, atualmente, cerca de 1.000<br />
favelas no Rio de Janeiro.<br />
4. As políticas de remoções dos mais pobres<br />
para longe das áreas mais valorizadas ou em vias de<br />
valorização da cidade se sucederam como ondas,<br />
expulsando os pobres do Centro, no início do século<br />
XX, depois da Zona Sul, nos anos 1950, 1960 e 1970.<br />
Os conflitos e revoltas resultantes foram sempre<br />
duramente reprimidos. A partir dos anos 1980,<br />
depois de muita pressão social, as remoções foram<br />
substituídas por políticas de urbanização de favelas<br />
que, porém, não atacaram os graves problemas de<br />
infraestrutura urbana, configurando-se em pouco<br />
mais do que obras de “maquiagens”. Nos últimos anos,<br />
intensa campanha em favor das remoções vem sendo<br />
realizada pela mídia e por setores governamentais.<br />
As atuais administrações estadual e municipal, com<br />
apoio federal, projetam a remoção de cerca de 130<br />
favelas através do Programa Morar Carioca. Além das<br />
áreas centrais, hoje, a região da Barra da Tijuca, de<br />
Jacarepaguá e seus entornos são os principais alvos<br />
da especulação imobiliária e, por consequência, das<br />
políticas de remoções.