Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN
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Escritos Militantes<br />
do tema educacional, a Comuna teve um papel fulcral<br />
na construção de uma nova concepção de educação,<br />
sendo esta determinante para a transformação<br />
radical da sociedade.<br />
Para tanto este artigo, a fim de comprovar esta<br />
afirmação, fará num primeiro momento uma breve<br />
análise da conjuntura educacional do período<br />
em questão, século XIX, mas especificamente o<br />
período pré-Comuna de Paris, tendo as lentes do<br />
debate educacional como prisma de leitura para a<br />
luta de classe. Num segundo momento, trataremos<br />
de uma discussão mais especifica: a experiência<br />
da educação na Comuna em relação aos projetos e<br />
propostas educacionais presentes no seu interior.<br />
Por fim, objetivamos concluir evidenciando os<br />
elementos de ruptura, a partir do debate educacional,<br />
com as propostas anteriores e o caráter inovador e<br />
revolucionário da experiência da Educação na<br />
Comuna de Paris.<br />
A educação e os<br />
antecedentes à Comuna<br />
Hobsbawn, no seu livro A Era do Capital (2011),<br />
chama atenção para a problemática da educação e o<br />
crescente papel da mesma num contexto histórico de<br />
desenvolvimento das forças produtivas, sobretudo na<br />
segunda metade do século XIX. Construir um sistema<br />
educacional era o que separava um país promissor de<br />
um país atrasado no século XIX. A necessidade da<br />
formação de mão de obra, qualificada às necessidades<br />
do capital e as demandas técnicas e tecnológicas<br />
impostas pelo desenvolvimento industrial, estavam<br />
postas. A formação destes trabalhadores passou a ser<br />
uma responsabilidade do conjunto da sociedade.<br />
84 UNIVERSIDADE E SOCIEDADE<br />
Uma consequência significativa dessa<br />
penetração da indústria pela ciência era<br />
que, dali em diante, o sistema educacional<br />
tornara-se crucial para o desenvolvimento da<br />
indústria [...]. Daquele momento em diante,<br />
era quase impossível que um país, onde faltasse<br />
educação de massa e instituições adequadas<br />
para educação avançada, viesse a se tornar uma<br />
economia ‘moderna’ e vice-versa, países pobres<br />
e retrógrados que contavam com um bom<br />
sistema educacional, como a Suécia, encontram<br />
facilidade para o desenvolvimento (Hobsbawn,<br />
2011, p. 79)<br />
Hobsbawn faz uma comparação entre o sistema<br />
educacional francês e o norte-americano, no fim do<br />
século XIX. O primeiro privilegiou apenas a “haute<br />
ecole”, enquanto os EUA, de maneira mais pragmática<br />
e funcional, apostaram nas formações técnicas e<br />
tecnológicas, com as escolas secundárias. Esta seria<br />
uma das explicações para o maior desenvolvimento<br />
da economia capitalista norte-americana no<br />
século XX. Para o autor, um dos elementos que<br />
contribuíram para a derrota dos franceses, na<br />
ocasião da guerra franco-prussiana, em 1870-1871,<br />
fora o fato dos soldados franceses, em sua maioria,<br />
ser analfabetos. Ou seja, não era possível ignorar as<br />
demandas por uma educação pública para as massas.<br />
Esta negligência poderia diferenciar e determinar o<br />
ritmo e a qualidade do desenvolvimento do sistema<br />
capitalista nestes países.<br />
O maior avanço mesmo ocorreu nas escolas<br />
primárias, onde o objetivo era transmitir<br />
conhecimentos rudimentares da língua e da<br />
aritmética e impor os valores morais da nova<br />
sociedade, no caso da França, era a “escola para o<br />
povo”. O crescimento das escolas primárias estava<br />
relacionado ao crescimento dos movimentos<br />
organizados e das pressões das massas. Na Inglaterra,<br />
a primeira educação primaria estatal surgiu depois<br />
da Reform Act, em 1867 e na França, depois de<br />
Terceira República (1870-1940). O progresso, em<br />
relação à construção do ensino primário, era muito<br />
significativo entre 1840 e 1880: “a população da<br />
Europa cresceu 33%, mas o número de filhos nas<br />
escolas cresceu 145%. Mesmo na Prússia, com<br />
numerosas escolas, o número de escolas primárias<br />
cresceu mais de 50%, entre 1843 e 1871.” Na Itália,<br />
depois da unificação, este número cresceu 460%<br />
(HOBSBAWN, 2011, p. 157).<br />
Este movimento de construção dos sistemas<br />
educacionais, sobretudo o de nível primário, é<br />
um termômetro importante para a compreensão<br />
e leitura da real capacidade de pressão que a classe<br />
trabalhadora possuía naquele momento contra<br />
as outras classes. Ao mesmo tempo em que o<br />
Capital necessitava de trabalhadores alfabetizados<br />
e especialistas, os trabalhadores clamavam contra<br />
a ignorância como forma também de ter acesso<br />
e controle das questões que lhes eram caras. A