Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN
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Nesta mesma perspectiva, Antunes corrobora<br />
a defesa da centralidade do trabalho e o potencial<br />
transformador da “classe-que-vive-do-trabalho”:<br />
Constitui-se num grande equívoco imaginarse<br />
o fim do trabalho na sociedade produtora de<br />
mercadorias e, com isso, imaginar que estariam<br />
criadas as condições para o reino da liberdade,<br />
é, entretanto, imprescindível entender quais<br />
mutações e metamorfoses vêm ocorrendo no<br />
mundo contemporâneo, bem como quais são<br />
seus principais significados e suas importantes<br />
consequências (2000, p. 167).<br />
O autor chama a atenção para as transformações<br />
ocorridas no processo do trabalho: flexibilização,<br />
maquinaria, expulsão, precarização do trabalho<br />
e especulação, que, entre outros aspectos,<br />
correspondem às metamorfoses confundidas, de um<br />
lado, com o trabalho em seu sentido ontológico e, de<br />
outro, com o próprio movimento do trabalho, sob o<br />
capital em seu sentido histórico. Apesar de todas as<br />
transformações, na atualidade, ainda há, por meio<br />
do trabalho, a produção coletiva e a apropriação<br />
individual e de grupos da riqueza produzida<br />
socialmente. Em um estudo sobre as novas formas<br />
do trabalho na contemporaneidade, Antunes (2000,<br />
p. 16) revela que:<br />
Essa dualidade – em verdade, trata-se de uma<br />
contradição – presente no mundo do trabalho<br />
conforma uma tese que é essencial em nosso<br />
estudo: se o trabalho ainda é essencial para<br />
a criação do valor, por sua parte, o faz oscilar,<br />
ora reiterando seu sentido de perenidade, ora<br />
estampando sua enorme superfluidade, do qual<br />
são exemplos os precarizados, flexibilizados,<br />
temporários, além, naturalmente, do enorme<br />
exército de desempregados e desempregadas<br />
que se esparramam pelo mundo.<br />
Em nossa investigação foi possível compreender<br />
que, apesar do desemprego permanente, os sujeitos<br />
da pesquisa sabem da importância do emprego para<br />
‘melhorar de vida’. Na vida deles, a busca pelo emprego<br />
com carteira assinada é contínua e estafante. Eles<br />
sabem que o emprego significa salário e que quanto<br />
mais alto o salário, melhor se vive, pelo menos em<br />
termos da reprodução da vida material. O fato de<br />
não possuírem categorias analíticas explicativas da<br />
própria realidade e da realidade social - por que me<br />
encontro nessa situação? -, não permite dizer, pelos<br />
resultados da pesquisa, que não tenham a dimensão,<br />
sofrida ‘na pele’, todos os dias, da importância<br />
do trabalho/emprego para “a” e “na” vida. Falas<br />
que apontam “sem o trabalho a gente não é nada”<br />
(entrevista, 2011-2), desvelam que a importância<br />
do trabalho é mais do que apenas uma concepção,<br />
ou seja, não é uma abstração. É uma condição, é um<br />
sentido que se impõe física e psicologicamente na<br />
vida do desempregado: a expressão “sem trabalho<br />
a gente não é nada”, reafirma o trabalho como<br />
categoria essencial na constituição da vida do ser<br />
humano. Para Antunes (2000), na esteira de Marx<br />
e Engels, o trabalho como criador de valor de uso,<br />
como atividade vital permanece, se constitui como<br />
fonte originária e primária de realização do ser<br />
social. Pode-se dizer que somos um vir a ser e nos<br />
tornamos um ser de identidade e de humanidade a<br />
partir do trabalho.<br />
Deste modo, as teses da “finitude” do trabalho<br />
que emergem no fim do século XX, no bojo das<br />
reformas impostas pela sociedade do capital, não<br />
são confirmadas na percepção dos desempregados,<br />
que muito embora nem imaginem que elas possam<br />
existir, reafirmam a importância do trabalho, não<br />
apenas para a manutenção da vida, mas acima de tudo<br />
na construção e afirmação de sua humanidade. Para<br />
o desempregado, o trabalho “é tudo, o valor é tudo<br />
Na década de 1990, também aqui no Brasil, houve uma<br />
repercussão muito grande nas teses que defendem a<br />
perda, ou o fim, da análise sociológica que explica a<br />
estrutura e a dinâmica social a partir do trabalho.<br />
porque a gente precisa, né, sobreviver, então, é tudo”<br />
(entrevista, 2011-1). A percepção de que “o trabalho<br />
é tudo”, também corrobora na desmistificação<br />
do fim da centralidade do trabalho, a partir da<br />
vida mesma, em sua concretude, e reafirma sua<br />
importância. Assim,<br />
Contrariamente à unilateralização presente<br />
tanto nas teses que desconstroem o tra ba lho,<br />
quanto naquelas que fazem seu culto acrí tico,<br />
Desafios para o Movimento dos Trabalhadores Desempregados<br />
ANDES-<strong>SN</strong> n junho de 2012 51