Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN
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cenário, desconforme com a etapa anterior da luta de<br />
classes. Esse cenário às avessas requeria não apenas se<br />
referenciar no arsenal teórico existente e consagrado,<br />
mas renová-lo à luz dos novos fenômenos. Essa foi a<br />
atitude do principal inspirador da IV Internacional.<br />
Na introdução a esse trabalho fizemos três<br />
perguntas: o que teria Trotsky acrescentado ao<br />
repertório marxista em sua passagem pela América<br />
Latina? Quais as principais produções teóricas por<br />
ele desenvolvidas nesse intervalo de tempo? Haveria<br />
algum nexo entre as suas principais conclusões e o<br />
continente americano?<br />
Acreditamos ser possível respondê-las quase<br />
que sumariamente e, ao mesmo tempo, tecer as<br />
nossas considerações finais. Em terras americanas,<br />
o principal legado de Leon Trotsky ao marxismo<br />
foi provavelmente a elaboração do Programa de<br />
Transição – uma plataforma e um método para<br />
ação do proletariado em uma etapa divergente e<br />
impertinentemente contrarrevolucionária. A teoria<br />
e o programa, na ótica marxista, não constituem<br />
elementos que não conheçam modificações.<br />
A realidade é mais rica e sempre exige uma<br />
correspondente atualização. Mas há uma equivalência<br />
mútua entre preservar e renovar. Trotsky procede a<br />
essa renovação teórico-programática – Programa de<br />
Transição – preservando os princípios fundamentais<br />
da teoria-programa marxista, posicionamento<br />
também admitido e adotado na obra Em Defesa<br />
do Marxismo. Simultaneamente, esse exercício<br />
de modificação teórica sem se afastar da rota<br />
trilhada pelo marxismo clássico, encontra outro<br />
exemplo arquetípico no uso criativo do conceito<br />
de bonapartismo no estudo da concrescibilidade<br />
latino-americana.<br />
Esses exemplos que revelam o seu contributo ao<br />
marxismo são quase simétricos às suas principais<br />
produções teóricas: o Programa de Transição (cujo<br />
esboço Trotsky escreveu em abril de 1938) e Em<br />
Defesa do Marxismo (cujo texto-base “uma oposição<br />
pequeno-burguesa no SWP” foi redigido no fim de<br />
1939). Nesse ínterim, contudo, ele escreveu sobre<br />
diversos assuntos, entre os quais as relações entre<br />
Stálin-Hitler, burocracia soviética e situação mundial<br />
carregadamente belicista (O Kremlin e a Política<br />
Mundial, O Pacto Germano-Soviético etc.); os<br />
acontecimentos ligados à guerra civil espanhola (A<br />
Lição de Espanha e Classe, Partido, Direção – Por<br />
que Foi Derrotado o Proletariado Espanhol8 ); não<br />
se furtou também de redigir um artigo cujo centro<br />
era os 90 anos da publicação do Manifesto comunista<br />
(aqui, a dialética atualidade-atualização assume uma<br />
visibilidade palpável) e outro, em parceria com o<br />
surrealista André Breton, celebrando a liberdade<br />
artística como princípio indelével. O texto –<br />
intitulado Manifesto por uma Arte Revolucionária<br />
Independente – mantém, passados mais de 70 anos,<br />
uma surpreendente atualidade.<br />
Todos esses trabalhos, parodiando James Cannon,<br />
são peças extraordinárias da literatura bolchevique,<br />
e, episodicamente, tiveram os seus destinos cruzados<br />
com as Américas. Não se deve esquecer que, num<br />
primeiro momento, Trotsky solicitou exílio aos EUA,<br />
sendo negado o visto por Franklin Delano Roosevelt<br />
por duas vezes. O desterro no México, de fato, era o<br />
“plano b”. Neste sentido, nem os EUA nem o México<br />
e nem a América Latina de conjunto estiveram<br />
separados dos seus esforços de elaboração. A situação<br />
econômica dos EUA, o governo Roosevelt, as relações<br />
entre o programa revolucionário e a maior potência<br />
capitalista; as nacionalizações mexicanas, os seus<br />
significados e os seus limites; o movimento sindical<br />
No que tange aos novos desafios e dificuldades, Trotsky<br />
não optou pelo ceticismo epistemológico ou político, muito<br />
menos pelas variantes típicas do marxismo ocidental;<br />
ousou em tempos difíceis e nem o seu assassinato se<br />
mostrou capaz de apagar as suas contribuições teóricas,<br />
estribadas em Marx, Engels e Lênin, mas sem ignorar os<br />
embaraços de um novo cenário, desconforme com a etapa<br />
anterior da luta de classes.<br />
latino-americano no contexto do sindicalismo<br />
mundial (lembremos sempre do seu texto clássico: “Os<br />
sindicatos na era da decadência imperialista”, escrito<br />
em agosto de 1940, às vésperas do seu assassinato);<br />
os limites da democracia no continente e o futuro da<br />
América Latina; todos estes temas estão no âmago<br />
A última fronteira - o marxismo aporta na América Latina<br />
ANDES-<strong>SN</strong> n junho de 2012 29