Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN
Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN
Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Escritos Militantes<br />
Os próprios jovens sentem essa dificuldade.<br />
Wellington, de 18 anos, morador da ocupação desde<br />
2008, relata:<br />
64 UNIVERSIDADE E SOCIEDADE<br />
Cara, a juventude aqui é muito complicada.<br />
Porque jovem é complicado, a gente fica<br />
dividida... começa a fazer alguma coisa e aí<br />
vai parando... Aí acaba não conseguindo fazer<br />
muita coisa! [...] Já teve uma peça. Mesmo com<br />
a juventude sendo fraca, a gente conseguiu fazer<br />
uma peça que a gente apresentou no Canal do<br />
Anil e tudo.<br />
As iniciativas direcionadas especifica mente aos<br />
adolescentes têm uma dimensão muito mais cultural.<br />
As peças teatrais, as quadrilhas, o hip-hop, as rodas de<br />
funk, são tentativas de promover a integração deste<br />
grupo e estimular os jovens a participar dos processos<br />
de elaboração e decisão coletiva. Lurdinha alerta:<br />
São várias tentativas, e a gente não consegue<br />
centrar naquilo pra dar continuidade. O<br />
que a gente queria era, a partir do interesse<br />
da meninada aqui, trabalhar isso, a partir<br />
do interesse da juventude, e eles mesmos<br />
entenderem. Só que isso demanda tempo...<br />
Porque se você chamar pra fazer uma discussão,<br />
pelo menos uns cinco vêm. Mas eles tinham<br />
uma coisa aqui, equivocada, que era achar que<br />
pra reunião da juventude do MNLM tinham<br />
que vir todos os jovens e adolescentes, de<br />
todas as ocupações do MNLM, inclusive da<br />
Manoel Congo. Aí, agora eles já conseguiram<br />
compreender que não tem. Que tem aqueles que<br />
querem se organizar e, quando eles estiverem<br />
encaminhado, ou outros vão vir! Então, agora,<br />
estão entendendo isso. Agora começa a andar,<br />
começa a deslanchar. Hoje, por exemplo, tem<br />
quatro jovens no curso 28 . Se fosse em outros<br />
tempos, eles diriam: “não vai descer ninguém!”<br />
Mas você não tá descendo? Você não é jovem?<br />
Não tem que ser todo mundo pra se interessar...<br />
Percebe-se, por outro lado, que o local da ocupação<br />
facilita a integração cultural da juventude. Wellington<br />
afirma que isso foi uma importante mudança na sua<br />
vida: “Aqui tem mais acesso à cultura. A gente não sai<br />
muito à noite... Mas aqui tem a Caixa Cultural, aqui<br />
tem museu, tem tudo aqui no Centro [...].”<br />
O Centro do Rio concentra teatros, bibliotecas,<br />
museus, cinemas e centros culturais, enquanto os<br />
bairros periféricos são praticamente desprovidos<br />
de equipamentos culturais. (SANTOS, 1994 e<br />
2000) As aproximadamente 150 salas de cinema do<br />
município do Rio, por exemplo, concentram-se em<br />
um aglomerado de 20 bairros, e usualmente fazem<br />
parte de complexos cinematográficos localizados em<br />
shopping centers. (ANDRADE DE MELO e FARIA<br />
PERES, 2005)<br />
Espaço de moradia, mas também de geração de<br />
trabalho e renda e de educação. E de uma educação<br />
crítica, que também educa os pais. Não é preciso<br />
ir além do segundo andar deste prédio coberto de<br />
bandeiras no Centro do Rio, para perceber como<br />
essas 42 famílias, com todas as suas dificuldades,<br />
vêm conseguindo fazer desse sonho uma realidade.<br />
E, depois de um pouco de conversa, percebemos<br />
que essa nova realidade vem mudando também,<br />
profundamente, as experiências e sonhos destes<br />
lutadores.<br />
3. Da luta pela moradia<br />
aos direitos humanos<br />
A nossa vida é totalmente diferente aqui.<br />
Mudou muito, muito mesmo. E não mudou só<br />
porque eu consegui sair de lá, não, ou porque<br />
consegui sair do aluguel. Hoje, a minha forma<br />
de pensar é totalmente diferente. [...] Aqui, eu<br />
aprendi outros valores. Aprendi a me dar valor,<br />
a respeitar meu marido, aprendi a respeitar mais<br />
meus filhos, a correr atrás dos direitos deles,<br />
a garantir a escola, a conseguir levar eles pra<br />
escola todo santo dia. Eu levo meus filhos pra<br />
escola, e não fico preocupada se vai ter tiroteio<br />
ou não. Porque eu acredito que onde eles estão é<br />
um lugar seguro.<br />
Essas palavras, ditas com forte emoção, são de<br />
Raquel, mãe de Vivian, com 9 anos, e de Maxwell,<br />
com 5, moradora da Manoel Congo desde os<br />
primeiros dias da ocupação.<br />
Joice, de 24 anos, morava em São João de Meriti,<br />
na Baixada Fluminense, e é mãe de uma criança de 5<br />
anos quando, juntamente com sua mãe, se integrou<br />
à Manoel Congo. Na ocupação, conheceu seu<br />
companheiro, com quem se casou e tem um bebê,<br />
que estava com 3 meses à época da entrevista. Eles<br />
reivindicaram à coordenação e, atualmente, têm um<br />
espaço próprio na ocupação: