Revista Universidade e Sociedade - Andes-SN
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direitos, deixando espaço, também, para que de<br />
forma privada, por meio da família ou da iniciativa<br />
privada, estes sejam assegurados. A abertura de<br />
tais espaços tem significado a transferência de<br />
políticas e, sobretudo do seu financiamento para<br />
a chamada sociedade civil. A responsabilização<br />
múltipla entre a família, a comunidade e o poder<br />
público dissipa a responsabilidade deste último nas<br />
relações cotidianas, em uma vertente claramente<br />
neoliberal, em que o Estado define o quadro jurídico<br />
das políticas e, no máximo, financia programas e<br />
projetos compensatórios, sem se responsabilizar pela<br />
execução e pelo cumprimento do estabelecido na lei.<br />
A abordagem microfísica das práticas em nome da<br />
garantia de direitos faz estremecer conceitos como<br />
os de proteção e negligência, mas também o de<br />
direito, apresentando as tensões próprias ao Estado<br />
de Direito.<br />
Com um leque amplo, o ECA define direitos para<br />
todos os âmbitos da vida: saúde, educação, cultura,<br />
família, trabalho, lazer, respeito..., subdividindo-os de<br />
forma a abranger as relações características da nossa<br />
época. Utilizando-se de conceitos como respeito à<br />
dignidade, por exemplo, indica que as pessoas de 0 a<br />
17 anos devem ser alvo de cuidados prioritários, em<br />
todos os campos considerados importantes para a vida<br />
dos jovens cidadãos. Para tanto, esta lei não só lança<br />
mão de equipamentos sociais e serviços instituídos<br />
para ser garantida, como propõe também o conselho<br />
tutelar e incita a ampliação de uma rede orientada ao<br />
atendimento dos que têm – ou são ameaçados de ter<br />
– seus direitos violados. Este deslocamento incentiva<br />
a invenção de espaços de acordo com a cultura e os<br />
recursos locais. Uma proposta própria ao momento<br />
político em que foi formulada: grandes mobilizações<br />
contra a ditadura militar, a crença na mobilização<br />
permanente da sociedade civil em torno de suas lutas<br />
e a afirmação do Estado de Direito.<br />
Ao mesmo tempo em que os direitos não são<br />
assegurados fertiliza-se o denuncismo e o clamor por<br />
maior punição e segurança, sem se investir na mesma<br />
proporção em ações que transformem as realidades<br />
responsáveis por sua violação. A perda de direitos<br />
fragiliza os laços sociais, precariza as relações de<br />
trabalho, forja mais tensões e violência, quadro que<br />
tem como resposta a ampliação do financiamento à<br />
chamada segurança que, além de ser uma solicitação<br />
individualista baseada na culpabilização dos pobres,<br />
tem derivado em propostas pautadas na lógica penal.<br />
A relação entre lei e cotidiano abre-se nas adjacências,<br />
nas lacunas, nas brechas em que as normas entram em<br />
composição com o Direito, ampliando, intensificando<br />
e conduzindo os efeitos da lei às esferas mais regulares<br />
da vida, em termos de uma lógica fina, mais ágil e<br />
contínua do que a dos tribunais do Poder Judiciário<br />
com seus mecanismos duros, lentos e burocráticos.<br />
Contudo, os procedimentos vão amalgamandose<br />
e vemos no conselho tutelar o deslizamento dos<br />
registros em prontuários para encaminhamentos<br />
mais próximos do Poder Judiciário, sob a forma de<br />
representação no Ministério Público ou de normas e<br />
castigos normalizadores, disciplinares.<br />
Pessoas denunciando ou participando de<br />
organizações e projetos compõem o cenário da<br />
chamada garantia de direitos, sempre atreladas e<br />
subordinadas aos financiamentos que pautam as<br />
linhas de trabalho, às diretrizes do Poder Judiciário,<br />
que também ameaçam os operadores do direito e<br />
aos movimentos políticos institucionais. As práticas<br />
de garantia de direitos estão circunscritas à lógica<br />
neoliberal e penal.<br />
A democracia participativa converteu-se<br />
em um rico instrumento de adesão ao sistema<br />
político vigente, pois que capturada em aparelhos<br />
e lógicas propostos pelos aparatos de um Estado<br />
Com um leque amplo, o ECA define direitos para todos<br />
os âmbitos da vida: saúde, educação, cultura, família,<br />
trabalho, lazer, respeito..., subdividindo-os de forma a<br />
abranger as relações características da nossa época.<br />
governamentalizado, que subordina as lutas a acordos<br />
em favor da coesão social, dirimindo subversões e<br />
resistências políticas. Participar não tem significado<br />
necessariamente a intervenção de movimentos sociais<br />
por meio de propostas construídas por coletivos e<br />
sim, em diversos casos, a convocação da população<br />
para campanhas e para o cumprimento de tarefas<br />
obedientes subordinadas a trâmites e rotinas definidas<br />
nos espaços institucionalizados como conselhos,<br />
fóruns, redes, associações, entre tantos outros, cada<br />
Os direitos da criança e do adolescente<br />
ANDES-<strong>SN</strong> n junho de 2012 77