Da Vida de São Domingos – Fr. Luís de

104 LlVííO V DA IHSTOrilA DE S, DOMINGOS
ouro, e prata, e muita fazenda de raiz. E fez declaração, que dcspois
da Igreja acabada, a qual mandava que corresse pola traça começada, se
empregasse o remanecente em aperfeiçoar a capella mór de seu Coro, e
o Convento de imm claustro, e outras officinas taes, que ficasse capaz
de viverem, e servirem nelle a Deos muitos Religiosos. Ei'a sua molher
dona Caterina, pessoa tão perfeita em todas as partes de liuma honrada
matrona, que confiadamente lhe encomendou Martini Annes todo o cui-
dado, e despesa, da obra. E ella mostrou bem quem era na facihdade
com que se desapegou doesta administração, e do gosto de manejar fa-
zenda. Porque poucos dias despois que perdeo o marido, estimando tu-
do menos que a elle, chamou o Prior do Convento, que era Frei João
Este vens, e renunciou nelle todo o direito que tinha no governo da fa-
zenda, e fabrica, entregando-lhe logo com effeito todo o dinheiro, prata,
e ouro que pêra ella deixara apphcado o defunto, e inetendo-o juritamente
em posse dos bens de raiz, com encargo que elle cumprisse o testamen-
to assi, e da maneira que nelle se declarava, e principalmente no que
tocava às obras apontadas. E porque desejava imitar a seu marido no
herdeiro que soube escolher, e de alguma maneira aveníajar-se (como
na verdade faz pouco quem dá fazenda, ainda que muita seja, pêra des-
pois da morte, quando já a não pode lograr) ajuntou sobre a renuncia-
ção, que tinha feita, Iiuma doação de tudo o mais que á sua parte lho
ficava, dizendo por huma escritura publica, que visto não ter herdeiro
por linha direita ascendente, nem descendente, por fazer serviço a Deos,
e bem á sua alma, e em remissão de seus peccados, dava, e doava des-
de logo ao Convento de S. Domingos todos os bens que possuia, e llie
pertencião na cidade de Évora, e seus termos: a saber, casas, vinhas,
herdades, adegas, louça, lagares, e toda a mais líizenda que por qual-
quer via lhe pertencesse : e até as casas em que vivia : e de tudo era
contente que logo tomassem posse os Religiosos real, e autuai, sem pêra
si reservar cousa alguma, porque as mesmas casas ella fazia conta que
as tinlja da mão d'elles: e esta doação fazia sem pòr mais encai'go, nem
obrigação ao Convento, que de huma Missa quotidiana polas almas de
seu marido, e sua. E as palavras formaes, com que conclue esta escri-
tura, são as seguintes.
Que lhe manlivessem hum Capellão pêra sempre^ que dissesse cada dia
3Iissa calada de Requiem, e d sesta feira de Saiito Ajidré por sua alma,
€ do dito Martim Anes: e que o Frade, que disser estas Missas, aja três