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116 LIVRO V DA HISTOniA DE S. DOMINGOS<br />
confirmara em sua opinião. Porque da coluna em que estava encostado<br />
marcara a estreita por cima <strong>de</strong> hum acipreste alto que lhe ficava <strong>de</strong>fronte,<br />
c sendo a noite muito serena, e quieta, alcançara pola <strong>de</strong>marcação feita<br />
que a estrella ro<strong>de</strong>ara claramente seguindo o movimento ordinário do<br />
Ceo, que chamão rapto, que he <strong>de</strong> Oriente a Ponente. Pola qual razão<br />
movendo-se ella com o Ceo, e fazendo, como fazia circulo, nâo podia ser<br />
o Polo do mundo, porque este <strong>de</strong> força havia <strong>de</strong> ser ponto fixo, e ponto<br />
indivisível: e assi a verda<strong>de</strong> era que a estrella não era o Polo, mas es-<br />
tava perto d'elle: e se os marinheiros se governavão por ella, obrigava-<br />
os a rezão <strong>de</strong> não haver oulra estrella mais chegada ao ponto verda<strong>de</strong>ira-<br />
mente imperceptível. E proseguindo <strong>Fr</strong>ei Pedro a matéria, lhe fora len-<br />
do huma hção <strong>de</strong>Mathematica com tanta clarida<strong>de</strong>, distincção, e sutileza,<br />
que a não enten<strong>de</strong>ra muitos annos <strong>de</strong>spois dos mestres <strong>de</strong> Paris tão bem<br />
como <strong>de</strong> sua boca. E esta prova dá <strong>de</strong> seu bom entendimento este au-<br />
tor: mas logo diremos outra que mais o confirma.<br />
Foi eleito em Provincial o Mestre <strong>Fr</strong>ei Manoel Estaco, sete ou oito<br />
annos <strong>de</strong>spois <strong>de</strong> acabar o Priorado <strong>de</strong> Évora: e governando-se no cargo<br />
com algumas faltas, e <strong>de</strong>feitos notáveis, foi <strong>de</strong>posto, e penitenciado. Hum<br />
dia estando <strong>Fr</strong>ei Pedro entre as duas portarias, foi-se o Mestre a elle<br />
pêra se consolar, e <strong>de</strong>sabafar com homem que tinha por santo. E <strong>Fr</strong>ei<br />
Pedro <strong>de</strong>spois <strong>de</strong> algumas rezões lhe disse as segiiintes: Padre Mestre,<br />
S3 o que agora me ouvir lhe <strong>de</strong>r alguma pena, peço-lhe por santa charida<strong>de</strong><br />
me perdoe. Bem estará lembrado que por vezes o avisei com<br />
humilda<strong>de</strong>, e amor do muito <strong>de</strong>scuido com que governava a si, e a nós<br />
sendo Prelado <strong>de</strong> uma Religião tão honrada, e acreditada no mundo. E<br />
não faço caso <strong>de</strong> cousas em que muitos vos culparão: porque galgos,<br />
caçadas, banquetes, cosinha particular, isso só a vós fazia dano, e quando<br />
muito alargava hum pouco mais as <strong>de</strong>spezas da casa em que estáveis<br />
mas <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>ns no provimento dos cargos, não buscando o mais digno,<br />
senão o mais amigo: <strong>de</strong>sprezar, e ás vezes perseguir o que falava ver-<br />
da<strong>de</strong>, como a teimoso, porque a falava: honrar ou alevantar o adulador,<br />
e pouco verda<strong>de</strong>iro, porque vos não resistia; sofrer que o relaxado no<br />
ponto da perfeição religiosa, em lugar do ser castigado triunfasse: em<br />
que esperáveis que havia isto <strong>de</strong> parar? Muito <strong>de</strong>veis a Deos por vos<br />
dar esta quebra em vida: quebra leve, e castigo <strong>de</strong> pai he, com tempo<br />
<strong>de</strong> arrependimento, e penitencia dos erros que passarão em vosso tempo<br />
na Província em geral, c nas consciências <strong>de</strong> alguns em particular. Por-