cronistas leigos, cronistas religiosos ea antropafagia
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Numa de suas peregrinações pelo sertão adentrou em uma aldeia, onde os índios<br />
comiam carne dos contrários, no que começou a pregar contra esse ato odioso à doutrina<br />
cristã, o que surtiu efeito imediato, pois os índios pararam com a festa que estavam fazendo e<br />
pararam de comer a carne de seus contrários. Depois disso, Nóbrega continuou sua<br />
caminhada, e chegou à outra aldeia, “onde havia grande quantidade de vinho e carne dos<br />
contrários; onde pregando pelas casas, aquele dia não a comeram por nossa chegada; e a sua<br />
festa cessou de tal maneira que eles fizeram calar os seus que cantavam” 31 .<br />
Relata que um menino índio fugiu de sua mãe, quando os padres passavam por uma<br />
aldeia, e ficou com os padres na Casa dos meninos, sendo que este índio, depois de algum<br />
tempo, já instruído na doutrina cristã, voltou a sua aldeia pregar a palavra de Deus, porém<br />
encontrou sua mãe “com uma cabeça e pedaços de carne humana, dependurados junto ao<br />
fumo prontos para comer. Nisso ele teve coragem e repreendeu a própria mãe por causa dos<br />
maus costumes que ela praticava” 32 .<br />
Em carta dirigida ao rei de Portugal no dia primeiro de junho de 1560, Nóbrega relata<br />
que os colonos cristãos queriam que os índios guerr<strong>ea</strong>ssem e se comessem entre si, e até certo<br />
ponto eles incentivavam algumas tribos a fazer isso, pois dessa forma os índios dariam o<br />
pretexto aos colonos da guerra justa, e poderiam ser feitas incursões contra essas tribos para<br />
fazer desses índios escravos desses colonos. Também relata que esses colonos eram contra o<br />
ajuntamento (ald<strong>ea</strong>mento) dos índios para que os padres lhes ensinassem a doutrina cristã,<br />
porque isto atrapalharia os seus propósitos que eram os de utilizar a mão-de-obra indígena em<br />
proveito próprio.<br />
136<br />
“A contradição de todos os cristãos desta terra que era quererem que os Índios se comessem, porque<br />
nisso punham a segurança da terra e quererem que os Índios se furtassem uns aos outros para eles terem<br />
escravos e quererem tomas as terras aos Índios contra razão e justiça e tiranizarem-nos por todas as vias,<br />
e não querem que se ajuntem para serem doutrinados por os terem mais a seu propósito e de seus<br />
serviços, e outros inconvenientes desta maneira, os quais todos, ele [Governador Men de Sá] vence, a<br />
qual eu não tenho por menor vitória, que as outras que Nosso Senhor lhe deu; e defendendo a carne<br />
humana aos Índios tão longe quando seu poder se estendia, a qual antes se comia o redor da cidade e às<br />
vezes dentro nela, prendendo os culpados, e tendo-os presos até que eles bem conhecessem seus erro,<br />
sem nunca mais matar ninguém” 33 .<br />
31 Sem Autor. Carta dos Meninos do Colégio de Jesus da Baía ao P; Pedro Domenech. Da Baía, 5 de agosto de<br />
1552. In: LEITE, Serafim. Novas Cartas Jesuíticas… Op. cit., p. 145-146. Sobre esta carta, Serafim Leite diz<br />
que “umas vezes fala por palavras dos meninos na 1ª. Pessoa do plural, outras fala deles na 3ª. Pessoa, e outras<br />
ainda na 1ª. Pessoa do singular, de alguém que redigisse pessoalmente a carta, talvez o próprio Nóbrega, que<br />
estava então na Bahia à frente de tudo (…). Entre Nóbrega e Francisco Pires (…) se terá que repartir a autoria ou<br />
inspiração desta carta. Novas Cartas Jesuíticas… Op. cit., p. 141-142.<br />
32 Ibid., p. 153.<br />
33 NÓBREGA, Pe. Manuel da. Ao Card<strong>ea</strong>l Infante D. Henrique de Portugal. São Vicente 1 de junho de 1560. In:<br />
NÓBREGA, Pe. Manuel da. Cartas do Brasil… Op. cit., p. 362-363.