cronistas leigos, cronistas religiosos ea antropafagia
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índios, como o hábito de comer carne humana, reforçando dessa forma, a natureza servil do<br />
índio (escravo natural), já os padres, mesmo se referindo aos índios como bárbaros, não o<br />
faziam para denegrir a imagem do índio, mas para ressaltar a importância do trabalho de<br />
conversão, ou seja, o conceito de bárbaro adaptou-se aos interesses dos padres para legitimar<br />
a catequese e dos colonos para legitimar a escravidão dos indígenas. Por isso, Montaigne<br />
afirma que: “cada qual considera bárbaro o que não se pratica em sua terra. E é natural,<br />
porque só podemos julgar da verdade e da razão de ser das coisas pelo exemplo e pela idéia<br />
dos usos e costumes do país em que vivemos” 88 .<br />
O controle sobre o trabalho indígena foi o pomo da discórdia entre os colonos e os<br />
padres jesuítas. A disputa entre os dois grupos (colonos X padres) centrava-se “tanto na<br />
legislação quanto nos postos-chaves cobiçados: a direção das aldeias e a autoridade para<br />
repartir os índios para o trabalho fora dos ald<strong>ea</strong>mentos” 89 . Este conflito com relação ao<br />
elemento indígena, ou melhor, sobre a força de trabalho indígena, vai se delin<strong>ea</strong>ndo<br />
juntamente com o processo de colonização do Brasil. Por isso, os colonizadores reforçavam a<br />
necessidade de “escravização dos índios, dizendo que eles eram seres bárbaros, incapazes de<br />
receber a conversão, enquanto os padres procuravam representar os índios como cristãos em<br />
potencial, pois, do contrário à catequese estaria am<strong>ea</strong>çada” 90 . “Os enfrentamentos entre<br />
jesuítas e colonos no Rio de Janeiro e a expulsão dos padres em São Paulo demonstram a<br />
inviabilidade da convivência harmônica entre projetos coloniais antagônicos” 91 .<br />
Passado o choque inicial da descoberta de um Novo Mundo e de novos homens,<br />
resolvido o problema acerca da humanidade dos indígenas – sim eles possuem alma –, os<br />
europeus, principalmente os ibéricos, procuram efetivar a conquista/posse das novas<br />
terras/possessões. Nos primórdios, a colonização da América tinha por característica “a pouca<br />
disponibilidade de capitais, abundância de terras, alta densidade demográfica indígena e<br />
população européia rarefeita” 92 . Desse modo, as populações indígenas, tanto na América<br />
hispânica quanto na portuguesa, se configuraram num elemento indispensável para a<br />
efetivação da colonização. Inicialmente porque os europeus tiveram uma grande dependência<br />
de algumas tribos indígenas, com as quais firmaram alianças, contudo essas alianças entre<br />
tribos indígenas e colonizadores europeus, embora freqüentes, não tinham caráter permanente,<br />
pois dependiam dos interesses que ambas as partes tinham no acordo. Como exemplo, temos<br />
88<br />
MONTAIGNE, Michel de. Op. cit., p. 195.<br />
89<br />
CUNHA, Manuela Carneiro da. Introdução a uma história indígena. In: Cunha, Manuela Carneiro da. (Org.).<br />
História dos Índios do Brasil. 2ª. edição. São Paulo: Cia. das letras, 1998, p. 9-24, p. 16.<br />
90<br />
RAMINELLI, Ronald. Op. cit., p. 16.<br />
91<br />
Ibid., p. 50.<br />
92<br />
ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Op. cit., p. 79.<br />
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