cronistas leigos, cronistas religiosos ea antropafagia
cronistas leigos, cronistas religiosos ea antropafagia
cronistas leigos, cronistas religiosos ea antropafagia
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
chefiados por Jaguararupi, que após ser bem recebido, reuniu todos os índios e narrou-lhes<br />
“com que crueldade os portugueses lhes tratavam a nação, fazendo-os escravos marcando-os<br />
com ferros como a cães, açoutando-os e infligindo-lhes suplícios como se não fossem de<br />
carne e sangue” 22 e que por ter matado um português tinha decidido passar o resto de sua vida<br />
entre eles, conquanto eles “se prometessem defender a mim [Knivet] e a si mesmos contra os<br />
portugueses” 23 . Frente à afirmativa dos indígenas, Knivet passa nove meses entre eles, até<br />
que Martim Correia de Sá retorna a região em busca de mais escravos. Nessa nova passagem,<br />
os índios foram tratados com brandura e em troca de canivetes, machadinhas e contas, eles<br />
trocaram seus filhos e filhas para servirem de escravos aos portugueses, além disso,<br />
denunciaram que Knivet e Guaraciaba estavam na aldeia vizinha, e sem mais conversa, os<br />
índios “amarram-me as mãos e trouxeram-me de volta ao filho de meu amo” 24 . Desse modo,<br />
Knivet, certo de que ia ser morto pelos portugueses, aceitou ir a uma tribo de antropófagos<br />
(coloca ênfase nesse dado) – que eram tamoios e de onde voltou com noventa escravos:<br />
“Embora o perigo de ir a um país de gentio antropófago, onde eu nunca estivera, fosse nada menos que<br />
o preço da minha vida, e considerando ainda, comigo mesmo, que o meu crime seria punido com a pena<br />
de morte entre os portugueses, preferi, mais uma vez, ficar a mercê dos selvagens pagãos e carniceiros<br />
do que à mercê da crueldade sanguinária dos cristãos portugueses” 25 .<br />
Sobre a crueldade que os portugueses utilizavam, com relação aos escravos africanos<br />
adquiridos, pelos mesmos, em Angola, Knivet nos relata que:<br />
“Os portugueses os marcam como carneiros, com ferro em brasa, ao que os mouros chamam “crimbo”<br />
(certamente carimbo); os pobres escravos ficam todos em pé, numa fileira, lado a lado, e cantam (…). E<br />
assim os míseros são embaidos, pois os portugueses lhes fazem acreditar que quem não tem esta marca<br />
não é considerado homem de valor algum no Brasil ou em Portugal; desta sorte mantêm os infelizes<br />
negros na mais ínfima sujeição, sob a capa da amizade” 26 .<br />
Em termos gerais, nesta obra, Knivet narra:<br />
“(…) suas peripécias, cujo teor é semelhante aos relatos fantásticos da época dos descobrimentos,<br />
incluindo o contato direto com as amazonas e canibais, referência ao reino de Preste João, rios com<br />
pedras preciosas e todas as aventuras das viagens atlânticas, suas tempestades, salvamentos<br />
espetaculares, monstros marinhos, perda de dedos dos pés, além da informação de que se tornou<br />
‘escravo’ de Salvador Correia de Sá” 27 .<br />
Dentre as inúmeras peripécias que Knivet vivenciou, quer em Angola, quer no Brasil<br />
entre os portugueses ou entre os indígenas, além das que, se referem às expedições bélicas ou<br />
22 Ibid., p. 56-57.<br />
23 Ibid., p. 57.<br />
24 Ibidem.<br />
25 Ibid., p. 58-59.<br />
26 Ibid., p. 158.<br />
27 VAINFAS, Ronaldo. Op. cit., p. 42.<br />
67