cronistas leigos, cronistas religiosos ea antropafagia
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os ditames de um esquema escravista. Tendo em vista esta recusa ao trabalho escravo, que<br />
fora vista como atitude preguiçosa dos índios, é que se preferiu mais tarde o uso da mão-de-<br />
obra africana, teoricamente mais adaptável a novos esquemas. Segundo Laima Mesgravis:<br />
“(…) é interessante ressaltar que, apesar das descrições bastante depreciativas dos índios, nenhum dos<br />
<strong>cronistas</strong> dos séculos XVI e XVII consideram-nos indolentes e preguiçosos. Esta imagem mais tarde<br />
incorporada à historiografia foi elaborada no século XIX, quando se quis argumentar com os<br />
abolicionistas as razões da escolha do negro para o trabalho escravo 97 ”. Mas mesmo com a introdução<br />
dos africanos em grande escala nas lavouras, ainda se encontrava índios nos engenhos do Nordeste, em<br />
m<strong>ea</strong>dos do século XVII” 98 .<br />
Em m<strong>ea</strong>dos deste mesmo século, com a chegada do primeiro governador geral, Tomé<br />
de Souza (1549), chegando juntamente a primeira missão jesuítica, chefiada pelo padre<br />
Manuel da Nóbrega, a relação dos portugueses com os indígenas sofre profundas<br />
transformações, pois as atividades econômicas ao longo da costa se intensificam e o cativeiro<br />
dos índios, segundo John Monteiro, “visava solucionar, de uma só vez, dois imperativos da<br />
colonização: a questão militar e o suprimento de mão-de-obra para a incipiente indústria<br />
açucareira” 99 . Com o intuito de conseguir escravos, os portugueses se aproveitaram da própria<br />
divisão interna que existia entre os indígenas, incitando as tribos que eram suas aliadas a<br />
guerr<strong>ea</strong>rem com tribos inimigas, pois acreditavam que o aumento do número de prisioneiros<br />
de guerra, formaria um considerável mercado de escravos, uma vez que a legislação colonial<br />
sancionava esta forma de conseguir escravos (guerra justa), porém os cativos indígenas não<br />
viravam tão facilmente escravos dos portugueses, pois o sentido da guerra para os indígenas,<br />
era completamente diferente do europeu, pois os indígenas não queriam conquistar terras ou<br />
povos, mas vingar seus antepassados mortos por aquela tribo inimiga. Essa vingança era<br />
consumada com a morte ritual do prisioneiro, por isso, mesmo as grandes expedições<br />
indígenas resultavam na maioria das vezes na captura de um único prisioneiro 100 . Dessa<br />
forma, os europeus enfrentavam resistência à venda do cativo não apenas por parte de seus<br />
captores, mas pelo próprio cativo. Como exemplo desse fato, temos que o jesuíta Azpilcueta<br />
Navarro fez uma oferta para comprar um prisioneiro tupinambá na hora do sacrifício deste,<br />
contudo foi à própria vítima que impediu a transação: “ele disse que não o vendessem, porque<br />
lhe cumpria a sua honra passar por tal morte como valente capitão” 101 .<br />
97 MESGRAVIS, Laima. Op. cit., p. 34.<br />
98 SCHWARTZ, Stuart B. Op. cit., p. 40.<br />
99 MONTEIRO, John Manuel. O escravo Índio, esse desconhecido. In: GRUPIONI, Luis Donisete B. (Org.).<br />
Índios do Brasil. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto, 1994, p. 105-120, p. 105.<br />
100 KOK, Maria da Glória. Op. cit., p. 18.<br />
101 MONTEIRO, John Manuel. Negros da Terra… Op. cit., p. 33.<br />
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