cronistas leigos, cronistas religiosos ea antropafagia
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diversas outras coisas se passaram entre eles, que não cheguei a compreender, exceto que tudo o que<br />
viam lhes parecia maravilhoso” 70 .<br />
Pode-se perceber que por maior que fosse a diferença, em todos os aspectos entre os<br />
europeus e os indígenas, os europeus (viajantes) acreditavam que compreendiam os sinais e as<br />
representações que os nativos lhes dirigiam. O próprio Colombo – no trecho em destaque<br />
acima – diz que não compreendia o que os índios falavam entre si, mas mesmo assim,<br />
concluindo por conta própria, disse que os sinais que os índios lhe fizeram, indicavam que<br />
eles estavam colocando toda a ilha a sua disposição. A par disso, Las Casas, adverte que:<br />
“Narrativas onde índios e espanhóis aparecem travando sofisticados diálogos não passam quase sempre,<br />
(…) de falsificações intencionais destinadas a fazer com que as ações violentas e arbitrárias dos<br />
conquistadores pareçam mais justas do que de fato o foram” 71 .<br />
Em seu diário, Colombo, admite que não consegue, a não ser por conjecturas (que se<br />
constitui num método pouco seguro), se comunicar com os nativos através da fala (língua):<br />
“Não conheço a língua das gentes daqui, eles não me compreendem e nem eu nem nenhum de<br />
meus homens os entendemos” 72 . Ao mesmo tempo, e no mesmo diário, o almirante,<br />
reconhece a diversidade das línguas indígenas e coloca isso como um obstáculo a ser vencido,<br />
para se conseguir as riquezas da terra: “numa ilha chamam o ouro tuob, de caona em outra, de<br />
nocay numa terceira” 73 . Ou seja, Colombo aponta que o aprendizado da língua nativa<br />
facilitaria, em todos os sentidos (aspectos), a tarefa dos europeus nessas terras, porém nenhum<br />
conquistador, a não ser os que, por algum acaso do destino, passaram algum tempo<br />
convivendo entre os indígenas, aprenderam suas línguas. Está tarefa recaía geralmente sobre<br />
os desterrados, dos quais Caminha, especifica três funções:<br />
“A primeira, o aprendizado dos usos e dos costumes dos tupiniquins, reforça a segunda, a obtenção de<br />
informação sobre as riquezas das terras. Ambos os aspectos conduzem o conhecimento da América em<br />
direção a Europa, privilegiando por um lado à decifração do sujeito, e, por outro, a revelação do objeto.<br />
A pouco de curiosidade intelectual nestes encargos, e muito de domínio e de poder. Conhecer o ignoto,<br />
desmistificá-lo, torná-lo familiar, humanizá-lo. Os expedicionários pretendem ordenar o descoberto,<br />
planificar os contatos ulteriores com terras e seres desprovidos de seu mistério, eliminar os obstáculos<br />
do imprevisível: no intuito de simplificar o expansionismo futuro. Enquanto as duas primeiras funções<br />
conduzem a informação da colônia à metrópole (por intermédio das cartas ou na pessoa do viajante), a<br />
terceira inverte o percurso. Também chega o conhecimento da Europa para a América, porém elevado<br />
sob a forma da palavra da Santa Fé, que não aspira instruir e sim converter. Ironicamente, corresponde a<br />
escoria da sociedade lusitana a preparação do terreno religioso para a vinda dos clérigos. Disseminar a<br />
70 Christopher, Columbus. The “Diário” of Christopher Columbus’s First Voyage to America, 1492-1943.<br />
Transcrito e traduzido para o inglês por Oliver e Dunn e James E. Kelley, Jr. Normam. Oklahoma: University of<br />
Oklahoma Press, 1989, p. 243-245 Apud GREENBLATT, Stephen. Op. cit., p. 30. Grifos e destaque do autor.<br />
71 LAS CASA, Bartolomé de. History of the Indies. trad. E ed. Ingl. Andrée Collard. Nova York: Harper & Row,<br />
1971, p. 50-52 Apud GREENBLATT, Stephen. Op. cit., p. 135.<br />
72 TODOROV, Tzvetan. Op. cit., p. 31.<br />
73 COLOMBO, Cristóvão. Diário de a bordo. Madrid: Ed. L. Arranz, 1985, p. ? (13.01.1493) Apud GIUCCI,<br />
Guillermo. Op. cit., 116.<br />
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