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cronistas leigos, cronistas religiosos ea antropafagia

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visão mais r<strong>ea</strong>lista, que se configurava na visão de um continente hostil habitado por<br />

guerreiros selvagens e canibais, embrenhados na selva tropical, a espreita dos soldados e<br />

missionários para se deliciarem com suas carnes, principalmente por parte dos portugueses,<br />

pois, embora também participassem dessa sedução universal, os motivos para tal fim não se<br />

repetiram com a mesma intensidade do que em outros ambientes, principalmente o espanhol,<br />

ou seja, os portugueses não tiveram os mesmos motivos que os espanhóis para verem<br />

eldorados, amazonas e o próprio paraíso em várias partes, pois já se encontravam desiludidos<br />

com a experiência que acumularam na África e no Oriente (r<strong>ea</strong>lismo pedestre), ou seja, para<br />

os portugueses esses mitos edênicos tiveram uma “atuação plausível” ou em outros termos<br />

eles se enquadraram nas dimensões do verossímil 10 .<br />

Outro motivo da perca desta visão idílica do Novo Mundo foi o choque cultural<br />

provocado pela presença de povos até então desconhecidos pelos europeus. Então temos que<br />

no início do século XVI, os índios da América estão ali, bem presentes, mas deles nada se<br />

sabe, ainda que, como é de se esperar, sejam projetadas sobre os seres recentemente<br />

descobertos imagens e idéias relacionadas a outras populações distantes, ou seja, as visões que<br />

os europeus tiveram dos indígenas, oscilou entre o inferno bestial e o paraíso terrestre, sendo<br />

sua imagem representada ao sabor dos interesses e das fantasias que presidiram o período da<br />

descoberta, da conquista e o período inicial da colonização do Novo Mundo 11 .<br />

“A primeira r<strong>ea</strong>ção espontân<strong>ea</strong>, em relação ao estrangeiro é imaginá-lo inferior, porque diferente de nós:<br />

não chega nem a ser homem, e, se for homem, é um bárbaro inferior; se não fala nossa língua, é porque<br />

não fala língua nenhuma, não sabe falar” 12 .<br />

Este fato, a descoberta de uma parcela da humanidade até então ignorada, provocou<br />

nos europeus, da época dos descobrimentos, uma questão de ordem intelectual e prática que<br />

diz respeito ao problema até hoje controverso da origem do homem americano – foram<br />

formuladas às mais desencontradas e extravagantes hipóteses para se explicar a origem do<br />

homem americano. Essa questão era de ordem intelectual porque a existência desses povos –<br />

erron<strong>ea</strong>mente designados de indígenas – desafiava os europeus a encontrar para eles um lugar<br />

em seu sistema tradicional de explicação do mundo, e de ordem prática porque, caso se<br />

mostrasse que esses povos tivessem uma origem independente de qualquer contato com o<br />

Velho Mundo, equivaleria a defini-los como não-homens, por não serem descendentes de<br />

10 HOLANDA, Sérgio Buarque de. Visão do Paraíso: Os motivos edênicos no descobrimento e colonização do<br />

Brasil. 2ª. ed. São Paulo: Cia. Editora Nacional: Edusp, 1969, p. 238.<br />

11 GRUPIONI, Luis Donisete B. Alteridade: Figurações do Outro. In: GRUPIONI, Luis Donisete B. (Org.).<br />

Índios do Brasil. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto, 1994, p. 233.<br />

12 TODOROV, Tzvetan. A conquista da América: A questão do outro. 3ª. edição brasileira. Tradução: B<strong>ea</strong>triz<br />

Perrone Moisés. São Paulo: Martins Fontes, 1991, p. 73.<br />

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