Representações do sujeito feminino em O Despertar e Riacho Doce ...
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<strong>Representações</strong> <strong>do</strong> <strong>sujeito</strong> <strong>f<strong>em</strong>inino</strong> <strong>em</strong> O <strong>Despertar</strong> e <strong>Riacho</strong> <strong>Doce</strong>: um estu<strong>do</strong> comparativo<br />
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fugir da conversa: “Reagin<strong>do</strong> com um mergulho na água a uma fofoca indesejável [...], ela<br />
novamente entrega-se a outra vasta solidão natural (o mar)” 212 (1988, p. 124). De forma<br />
s<strong>em</strong>elhante, no final da narrativa, Edna, sentin<strong>do</strong>-se rejeitada pelo ama<strong>do</strong>, lança-se ao<br />
mar. A afirmativa de que a protagonista entra no mar porque Robert a rejeitou se sustenta<br />
se levarmos <strong>em</strong> conta a repetição <strong>do</strong> nome de Robert, acrescida da voz <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r que<br />
afirma: “Não havia qualquer ser humano a qu<strong>em</strong> quisesse ter por perto, exceto Robert” 213<br />
(CHIPIN, 1994, p. 150). Ao buscar no mar o refúgio que a confortava, que a afastava <strong>do</strong><br />
que a tornava infeliz, a ação de Edna Pontellier não pode ser interpretada apenas com um<br />
senti<strong>do</strong> negativo. Há um senti<strong>do</strong> de afirmação da vida neste ato, pois, como ainda afirma<br />
Cristina Giorcelle, “nesta cena final, à ‘mercê’ <strong>do</strong> sol, se seu corpo morrerá, sua vida não<br />
perecerá” 214 (1988, p. 125).<br />
Pod<strong>em</strong>os, ainda, usar outro argumento para constatarmos que a entrega de Edna<br />
às águas não pode ser interpretada apenas levan<strong>do</strong> <strong>em</strong> conta o senti<strong>do</strong> de morte. O<br />
romance de Kate Chopin faz uso de uma referência mitológica que aproxima a<br />
protagonista de um mito <strong>f<strong>em</strong>inino</strong> grego que possui ligação tanto com a morte quanto<br />
com a vida. O mito a que nos referimos é Perséfone, a esposa de Hades. Com relação à<br />
utilização de referências míticas nos textos de Chopin, Sylvia Bailey Shurbutt afirma que<br />
os personagens da escritora “propositadamente colh<strong>em</strong> ‘da árvore’ [<strong>do</strong> conhecimento]<br />
para descobrir<strong>em</strong> seus próprios despertares; fazen<strong>do</strong> isso [Chopin] revê conheci<strong>do</strong>s mitos<br />
sobre deveres, casamentos e sexualidade, para atingir um entendimento mais realista da<br />
condição humana” 215 (SHURBUTT, 1993, p. 15).<br />
A identificação de Edna com a rainha <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> <strong>do</strong>s mortos é feita por Cristina<br />
Giorcelle, quan<strong>do</strong> esta analisa o capítulo XXX <strong>do</strong> romance de Kate Chopin. Segun<strong>do</strong><br />
Giorcelle, durante o jantar de despedida, “Edna encarna atributos de Perséfone,[...] a<br />
deusa que cruza continuamente o limite da morte e da vida” 216 (1988, p. 128). Giorcelle se<br />
vale <strong>do</strong> mo<strong>do</strong> como Edna é descrita no jantar de despedida e das referências ao esta<strong>do</strong> de<br />
212 “By reacting with a plunge in the water to an unpleasant piece of gossip [...], she again aban<strong>do</strong>ns herself to other<br />
vast natural solitude (the sea)”.<br />
213 “There was no human being whom she wanted near her except Robert” (CHOPIN, 2006, p. 896).<br />
214 “In this final scene, at the ‘mercy’ of the sun, if her body will die, her life will not perish”.<br />
215 “purposefully pluck ‘the tree’ [of knowledge] in order to discover their own awakenings; in so <strong>do</strong>ing she [Chopin]<br />
revises accepted myths about duty, marriage, and sexuality in order to achieve a more realistic understand of the<br />
human condition”.<br />
216 “Edna takes on attributes of Persephone, [...] the goddess who crosses continuously the threshold of life and<br />
death”.<br />
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