Representações do sujeito feminino em O Despertar e Riacho Doce ...
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<strong>Representações</strong> <strong>do</strong> <strong>sujeito</strong> <strong>f<strong>em</strong>inino</strong> <strong>em</strong> O <strong>Despertar</strong> e <strong>Riacho</strong> <strong>Doce</strong>: um estu<strong>do</strong> comparativo<br />
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amiga roubada de si faz com que Edna/Eduarda, já <strong>em</strong> casa, ponha para fora toda a sua<br />
<strong>do</strong>r <strong>em</strong> forma de um choro alto, de um “pranto impetuoso” (REGO, 2003, p. 78).<br />
Na volta para o burgo, ainda no tr<strong>em</strong>, Ester fala com Edna/Eduarda sobre<br />
Roberto. Ao ouvir sobre o amigo da professora, o narra<strong>do</strong>r comenta que “[c]ada palavra<br />
de Ester se enterrava <strong>em</strong> Edna como cravo furan<strong>do</strong> a sua carne” (REGO, 2003, p. 79),<br />
crian<strong>do</strong> uma imag<strong>em</strong> de sofrimento que se ass<strong>em</strong>elha com a de Cristo crucifica<strong>do</strong>, dan<strong>do</strong><br />
a <strong>do</strong>r que Edna/Eduarda sente uma simbologia de grandiosidade. Diante da certeza de<br />
que a professora amava o amigo, Edna/Eduarda converte os momentos que teve ao la<strong>do</strong><br />
de Ester <strong>em</strong> d<strong>em</strong>onstrações de afeto da professora para o amigo ausente:<br />
Naquela noite <strong>em</strong> que a sós tocavam piano, o coração de Ester vibrava, se<br />
magoava por outra pessoa. E quan<strong>do</strong> ela recitava aqueles versos de poetas<br />
louvan<strong>do</strong> a amada, aquela voz <strong>do</strong>ce de Ester, aquele tom magoa<strong>do</strong>, aquela<br />
melancolia, tu<strong>do</strong> era para Roberto. Quan<strong>do</strong> passeavam, quan<strong>do</strong> percorriam a pé<br />
os arre<strong>do</strong>res da escola, colhen<strong>do</strong> flores, Ester paran<strong>do</strong> para ver melhor as<br />
coisas, de braços da<strong>do</strong>s as duas, tu<strong>do</strong> era feito com o pensamento <strong>em</strong> Roberto<br />
(REGO, 2003, p. 80).<br />
Esta viag<strong>em</strong> das duas até a capital ainda faz surgir entre os conheci<strong>do</strong>s de<br />
Edna/Eduarda uma suspeita sobre os vínculos de amizade que ligam as duas. Primeiro, o<br />
povo <strong>do</strong> burgo não vê com bons olhos a relação que se cria entre a professora e<br />
Edna/Eduarda. Elba, a avó da protagonista, é a pessoa <strong>do</strong> seu círculo familiar que<br />
questiona a ligação das duas. A mãe de Norma também d<strong>em</strong>onstra que não seria bom<br />
uma estranha ficar tão próxima de uma menina. Mas é o pastor Schmidt a figura que<br />
representa toda a antipatia <strong>do</strong>s concidadãos de Edna/Eduarda. É ele qu<strong>em</strong> fala<br />
diretamente com o pai da protagonista sobre a ligação dela com Ester. Ele, como<br />
representante religioso <strong>do</strong> lugar, fala <strong>em</strong> nome de um grupo que d<strong>em</strong>onstra to<strong>do</strong> um<br />
preconceito <strong>em</strong> relação ao possível relacionamento íntimo das duas: “Era o povo que<br />
reparava, que sentia a influência da professora sobre a menina” (REGO, 2003, p. 84).<br />
Assim, diante da pressão externa – conforme se observa na declaração <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r – “[o]<br />
povo de Edna não queria mais que a filha mantivesse relações tão estreitas com a<br />
professora. [...] Era o fim de tu<strong>do</strong>” (REGO, 2003, p. 84). A possibilidade de se afastar<br />
completamente de Ester provoca <strong>em</strong> Edna/Eduarda a sensação de que está condenada à<br />
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