Representações do sujeito feminino em O Despertar e Riacho Doce ...
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<strong>Representações</strong> <strong>do</strong> <strong>sujeito</strong> <strong>f<strong>em</strong>inino</strong> <strong>em</strong> O <strong>Despertar</strong> e <strong>Riacho</strong> <strong>Doce</strong>: um estu<strong>do</strong> comparativo<br />
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As narrativas épicas se caracterizam como materialização de um mun<strong>do</strong> <strong>do</strong>mina<strong>do</strong><br />
pelo hom<strong>em</strong>, cujas figuras de destaque são identificadas como símbolo de virilidade, força<br />
e corag<strong>em</strong>, características que, no cenário das letras da época, não são utilizadas para<br />
compor o <strong>f<strong>em</strong>inino</strong>. Dessa forma, a representação da mulher estava inevitavelmente<br />
relegada a um plano inferior, seja no la<strong>do</strong> descritivo, seja na sua participação nas ações <strong>do</strong><br />
enre<strong>do</strong>. Elas são s<strong>em</strong>pre coadjuvantes, seja para trazer o b<strong>em</strong> ou para causar o mal. Tal<br />
representação apenas reforça o papel social <strong>do</strong> <strong>f<strong>em</strong>inino</strong> no mun<strong>do</strong> grego, como<br />
expressam as palavras de Xenofonte, na sua obra Econômico, que mostra a mulher como<br />
“agente silencioso <strong>do</strong> oikos: que visse o mínimo, ouvisse o mínimo e falasse o mínimo”<br />
(XENOFONTE, 1999, VII, p. 34 – 35) (grifo <strong>do</strong> autor). Na caracterização da mulher nas<br />
narrativas épicas percebe-se um espelhamento de fatos históricos na matéria ficcional.<br />
Simone de Beauvoir, ao analisar o papel da mulher na história patriarcal afirma que:<br />
[...] a própria mulher reconhece que o universo <strong>em</strong> seu conjunto é masculino;<br />
os homens modelaram-no, dirigiram-no e ainda hoje o <strong>do</strong>minam; ela não se<br />
considera responsável; está entendi<strong>do</strong> que é inferior, dependente; não aprendeu<br />
as lições da violência, nunca <strong>em</strong>ergiu, como um <strong>sujeito</strong>, <strong>em</strong> face <strong>do</strong>s outros<br />
m<strong>em</strong>bros da coletividade, fechada <strong>em</strong> sua carne, <strong>em</strong> sua casa, aprende-se como<br />
passiva <strong>em</strong> face desses deuses de figura humana que defin<strong>em</strong> fins e valores<br />
(1980. p. 364).<br />
Como não há uma representação de herói épico para o <strong>f<strong>em</strong>inino</strong>, entende-se que o<br />
que Lukács aponta como representante <strong>do</strong> herói moderno no romance diz respeito à<br />
representação da figura masculina, primeiramente. Isso se confirma na escolha de<br />
modelos para representar, por ex<strong>em</strong>plo, a tipologia de heróis da forma romanesca criada<br />
pelo teórico húngaro: Dom Quixote, de Cervantes; Frederico Moreau, de Flaubert;<br />
Wilhelm Meister, de Goethe; e a galeria de homens que habitam as páginas <strong>do</strong>s romances<br />
de Léon Tolstói. Mas, como a forma romance usa tanto o masculino como o <strong>f<strong>em</strong>inino</strong><br />
para compor a figura <strong>do</strong> herói moderno (entenda-se moderno o gênero romanesco que se<br />
desenvolve ainda na Idade Média), as ideias desenvolvidas por Lukács para enfocar esse<br />
novo herói pod<strong>em</strong> ser usadas para ambos os gêneros – tanto para o masculino como para<br />
o <strong>f<strong>em</strong>inino</strong>.<br />
Esse não apontamento de heroínas como representantes de uma tipologia de<br />
protagonistas para o romance mostra certo descaso ou desatenção de Lukács quanto à<br />
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