03.04.2013 Views

capacitação para comitês de ética em pesquisa - BVS Ministério da ...

capacitação para comitês de ética em pesquisa - BVS Ministério da ...

capacitação para comitês de ética em pesquisa - BVS Ministério da ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

CAPACITAÇÃO PARA COMITÊS DE ÉTICA EM PESQUISA<br />

AS DENÚNCIAS DE BEECHER E PAPPWORTH<br />

SOBRE PESQUISAS ANTI-ÉTICAS NOS ESTADOS<br />

UNIDOS E NA INGLATERRA<br />

Duas figuras ficaram famosas na déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1960<br />

quando documentaram a prevalência <strong>de</strong> estudos antiéticos<br />

no mundo <strong>da</strong> biomedicina: Henry Knowles Beecher e<br />

Maurice Pappworth (Doyal, Tobias, 2001). Eles mostraram<br />

que, <strong>em</strong>bora as <strong>pesquisa</strong>s anti<strong>ética</strong>s <strong>em</strong> t<strong>em</strong>po <strong>de</strong> guerra<br />

talvez sejam as mais conheci<strong>da</strong>s, seria um erro imaginar<br />

que os al<strong>em</strong>ães e os japoneses eram os únicos a sacrificar<br />

seres humanos no altar do conhecimento científico.<br />

Pesquisadores nos Estados Unidos e na Inglaterra também<br />

mostravam pouca preocupação com as pessoas que<br />

usavam como sujeitos <strong>da</strong>s suas <strong>pesquisa</strong>s.<br />

Em 1966, Dr. Henry Beecher publicou um artigo no<br />

New England Journal of Medicine no qual ele aponta<br />

vinte e dois ex<strong>em</strong>plos <strong>de</strong> <strong>pesquisa</strong>s anti<strong>ética</strong>s (Beecher,<br />

1966) 1 . Basicamente, os dois el<strong>em</strong>entos que ele aponta<br />

são a ausência <strong>de</strong> consentimento por parte dos sujeitos <strong>da</strong><br />

<strong>pesquisa</strong> e os graves riscos a que alguns foram submetidos,<br />

às vezes s<strong>em</strong> benefício nenhum <strong>para</strong> a própria pessoa.<br />

Entre os ex<strong>em</strong>plos que ele apresenta são o uso <strong>de</strong> placebo,<br />

<strong>de</strong>ixando o paciente s<strong>em</strong> tratamento comprova<strong>da</strong>mente<br />

eficaz, resultando <strong>em</strong> seqüelas <strong>da</strong>nosas previsíveis;<br />

crianças portadoras <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiência mental foram infecta<strong>da</strong>s<br />

com hepatite <strong>para</strong> estu<strong>da</strong>r o processo <strong>de</strong> contágio; s<strong>em</strong> seu<br />

conhecimento, células cancerosas vivas foram injeta<strong>da</strong>s<br />

<strong>em</strong> vinte e duas pessoas <strong>para</strong> testar sua imuni<strong>da</strong><strong>de</strong> a câncer;<br />

uma mãe, cuja filha estava morrendo <strong>de</strong> melanoma,<br />

aceitou participar <strong>de</strong> uma <strong>pesquisa</strong> na qual recebeu um<br />

transplante <strong>de</strong> melanoma na esperança <strong>de</strong> que a produção<br />

<strong>de</strong> anticorpos aju<strong>da</strong>sse no tratamento <strong>de</strong> pacientes com<br />

câncer – a mulher morreu <strong>de</strong> melanoma um pouco mais<br />

<strong>de</strong> um ano mais tar<strong>de</strong>; e, o que o próprio Beecher chama<br />

<strong>de</strong> um “estudo bizarro”, um estudo <strong>de</strong> vinte seis recémnascidos<br />

(com menos <strong>de</strong> quarenta oito horas <strong>de</strong> i<strong>da</strong><strong>de</strong>),<br />

com a finali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> verificar a presença ou ausência <strong>de</strong><br />

refluxo ureteral, durante o qual foram expostos a raio-x<br />

enquanto enchiam e esvaziavam suas bexigas – nenhum<br />

refluxo foi <strong>de</strong>scoberto e os <strong>da</strong>nos provocados pelo raio-x<br />

são <strong>de</strong>sconhecidos.<br />

Enquanto Beecher publicava seu trabalho nos Estados<br />

Unidos, Maurice Pappworth estava “botando a boca no<br />

trombone” na Inglaterra. 2 Em 1963, ele <strong>de</strong>ixou claro nos<br />

132<br />

seus escritos que não estava contra as <strong>pesquisa</strong>s clínicas,<br />

mas que se precisava incorporar nas <strong>pesquisa</strong>s proteção<br />

<strong>para</strong> os sujeitos <strong>da</strong> <strong>pesquisa</strong>. Para ele, a maioria dos<br />

<strong>pesquisa</strong>dores agia com integri<strong>da</strong><strong>de</strong>, mas, uma minoria<br />

crescente estava <strong>de</strong>srespeitando a <strong>ética</strong> e correndo o<br />

risco <strong>de</strong> provocar uma reação na opinião pública contra<br />

to<strong>da</strong> <strong>pesquisa</strong> clínica e não apenas a que não respeitava<br />

a <strong>ética</strong>.<br />

Sua campanha a favor <strong>de</strong> <strong>ética</strong> <strong>em</strong> <strong>pesquisa</strong> <strong>em</strong> seres<br />

humanos <strong>de</strong>s<strong>em</strong>bocou na publicação do seu livro, Human<br />

Guinea Pigs, publicado <strong>em</strong> 1967 (Pappworth, 2001). 3<br />

Este texto, também, inclui gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> ex<strong>em</strong>plos <strong>de</strong><br />

<strong>pesquisa</strong>s <strong>em</strong> pessoas saudáveis e vulneráveis submeti<strong>da</strong>s<br />

a riscos e <strong>da</strong>nos inaceitáveis: recém-nascidos e crianças,<br />

mulheres grávi<strong>da</strong>s, jovens infratores e <strong>de</strong>ficientes mentais,<br />

presos, idosos, e doentes terminais.<br />

Como resposta a este tipo <strong>de</strong> comportamento, Pappworth<br />

propõe que as revistas e periódicos médicos só <strong>de</strong>v<strong>em</strong><br />

aceitar <strong>para</strong> publicação resultados <strong>de</strong> <strong>pesquisa</strong>s<br />

conduzi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> uma forma <strong>ética</strong>.<br />

Beecher e Pappworth <strong>de</strong>monstraram claramente que a<br />

falta <strong>de</strong> <strong>ética</strong> <strong>em</strong> <strong>pesquisa</strong> <strong>em</strong> seres humanos era um grave<br />

probl<strong>em</strong>a <strong>em</strong> meados do século XX. Albert R. Jonsen<br />

(1998), no seu livro The Birth of Bioethics, mostra que<br />

continuou sendo um bom t<strong>em</strong>po <strong>de</strong>pois. Citamos apenas<br />

dois ex<strong>em</strong>plos.<br />

O primeiro aconteceu no Hospital Ju<strong>da</strong>ico <strong>para</strong><br />

Doenças Crônicas, Brooklyn, on<strong>de</strong>, <strong>em</strong> 1963, houve uma<br />

<strong>pesquisa</strong> sobre os efeitos imunológicos conseqüentes <strong>da</strong><br />

injeção subcutânea <strong>de</strong> células cancerosas <strong>em</strong> pacientes<br />

idosos e <strong>de</strong>bilitados, s<strong>em</strong> nenhuma tentativa <strong>de</strong> solicitar o<br />

consentimento <strong>da</strong>s pessoas envolvi<strong>da</strong>s. N<strong>em</strong> o b<strong>em</strong> <strong>de</strong>les,<br />

n<strong>em</strong> sua autonomia foram respeitados (Jonsen, 1998).<br />

O outro ex<strong>em</strong>plo, que gerou muito comentário, foi o<br />

caso <strong>de</strong> Tuskegee (Jonsen, 1998), Alabama, on<strong>de</strong>, durante<br />

quarenta anos (entre 1932 e 1972), o Serviço <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong><br />

Pública dos Estados Unidos conduziu um estudo sobre<br />

mais ou menos 600 afro-americanos, pobres, com sífilis,<br />

não tratados, mesmo após a <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong> antibióticos<br />

capazes <strong>de</strong> curá-los. Nas autópsias, procurava-se saber os<br />

estragos <strong>da</strong> doença no corpo humano. Aqui, também, se<br />

levantou questões graves <strong>de</strong> autonomia, consentimento,<br />

informação ina<strong>de</strong>qua<strong>da</strong>, <strong>de</strong> não-maleficência e <strong>de</strong> respeito<br />

por populações vulneráveis.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!