capacitação para comitês de ética em pesquisa - BVS Ministério da ...
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CAPACITAÇÃO PARA COMITÊS DE ÉTICA EM PESQUISA<br />
novos procedimentos gerais (consentimento informado<br />
ou presumido <strong>para</strong> a recolha <strong>de</strong> órgãos); organização<br />
<strong>de</strong> campanhas públicas <strong>de</strong> informação e incentivo à<br />
mu<strong>da</strong>nça <strong>de</strong> comportamentos (droga, sexo seguro);<br />
a realização <strong>de</strong> consultas populares (referendos)<br />
<strong>para</strong> auscultação <strong>da</strong> sensibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> sobre<br />
questões controversas na prática biomédica (o aborto,<br />
a eutanásia); a organização <strong>de</strong> associações <strong>de</strong> doentes<br />
<strong>para</strong> <strong>de</strong>fesa dos seus interesses (diabetes, lúpus, Aids);<br />
a dinamização <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>para</strong> a participação <strong>em</strong><br />
processos <strong>de</strong>liberativos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> impacto, como são<br />
os que se refer<strong>em</strong> à reforma do sist<strong>em</strong>a nacional <strong>de</strong><br />
saú<strong>de</strong>, que a generali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos países t<strong>em</strong> <strong>em</strong> curso,<br />
praticamente nenhum dispensando a participação<br />
dos muitos setores <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> mais diretamente<br />
interessados e <strong>da</strong> população <strong>em</strong> geral sobre qu<strong>em</strong> reca<strong>em</strong><br />
os resultados. O probl<strong>em</strong>a <strong>da</strong> alocação dos recursos<br />
<strong>em</strong> saú<strong>de</strong> é, a esse título, certamente <strong>para</strong>digmático,<br />
não dispensando o contributo <strong>de</strong> ninguém no esforço<br />
coletivo <strong>de</strong> concretização <strong>da</strong> justiça social, sendo b<strong>em</strong><br />
ilustrado pela experiência do estado norte-americano<br />
<strong>de</strong> Oregon.<br />
E, não obstante, também a esse nível <strong>de</strong> participação<br />
<strong>de</strong>mocrática <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> nas gran<strong>de</strong>s opções que<br />
visam ao seu b<strong>em</strong>-estar, esboçam-se riscos que<br />
ameaçam <strong>de</strong>svalorizar o b<strong>em</strong> alcançado. Referimonos<br />
à organização <strong>de</strong> grupos <strong>de</strong> interesses ou lobbies<br />
que tanto po<strong>de</strong>m intervir no nível informativo como<br />
<strong>de</strong>liberativo e que, com sua ação faccionária, po<strong>de</strong>m<br />
<strong>de</strong>svirtuar o entendimento dos reais interesses<br />
<strong>da</strong> comuni<strong>da</strong><strong>de</strong>. Atribuir, então, uma pon<strong>de</strong>ração<br />
proporcional ao po<strong>de</strong>r reivindicativo <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> grupo,<br />
agravaria os <strong>de</strong>sequilíbrios existentes, criaria mais<br />
<strong>de</strong>sigual<strong>da</strong><strong>de</strong>s, sob a artificial aparência <strong>de</strong> satisfação<br />
<strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s e anseios gerais.<br />
Brev<strong>em</strong>ente, dir<strong>em</strong>os que a conscientização do<br />
valor <strong>da</strong> pessoa, quer na dimensão individual, quer<br />
na dimensão comunitária, não se po<strong>de</strong> exprimir<br />
exclusivamente numa terminologia reivindicativa, na<br />
reclamação <strong>da</strong> autonomia, <strong>em</strong> suma, numa linguag<strong>em</strong><br />
dos direitos que ten<strong>de</strong> a tornar-se egocêntrica, fechandose<br />
sobre si mesma, negando assim o sentido <strong>de</strong> plena<br />
abertura e <strong>de</strong> ampla participação que caracterizam<br />
essa conquista alcança<strong>da</strong>, e pervertendo a solicitu<strong>de</strong><br />
3<br />
radical <strong>da</strong> bio<strong>ética</strong>.<br />
Urge, pois, contrariar essa tendência e revitalizar<br />
a linguag<strong>em</strong> originária <strong>da</strong> bio<strong>ética</strong>, que não é<br />
predominant<strong>em</strong>ente a do direito, do que exijo dos<br />
outros, mas a do <strong>de</strong>ver, do que cumpro <strong>em</strong> relação<br />
aos outros: “que <strong>de</strong>vo fazer?” é a interrogação que<br />
inaugura a bio<strong>ética</strong> <strong>em</strong> face do “que posso fazer?” a<br />
que a tecnociência respon<strong>de</strong>.<br />
O futuro <strong>de</strong>ssa conquista <strong>da</strong> bio<strong>ética</strong> joga-se, pois,<br />
a nosso ver, na intensificação do sentido do <strong>de</strong>ver, do<br />
sentido <strong>da</strong> responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> como única via que po<strong>de</strong><br />
garantir a continui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> sua evolução na fi<strong>de</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
ao seu primordial <strong>de</strong>sígnio. Mas, então, avançaríamos<br />
<strong>para</strong> além <strong>da</strong> tradicional correlação entre direitos e<br />
<strong>de</strong>veres, liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s e responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s, que estabelece<br />
<strong>para</strong> um <strong>de</strong>terminado grau <strong>de</strong> direitos ou liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
um grau idêntico <strong>de</strong> <strong>de</strong>veres ou responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Na<br />
esteira <strong>da</strong>s mais recentes reflexões sobre o sentido <strong>da</strong><br />
responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> moral, protagoniza<strong>da</strong>s por Emmanuel<br />
Lévinas (1990) e Hans Jonas (1992), diríamos que a<br />
responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> não se reduz a uma conseqüência <strong>da</strong><br />
liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, tampouco o <strong>de</strong>ver é a outra face do direito:<br />
a responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> é constitutiva <strong>da</strong> humani<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />
hom<strong>em</strong> pelo que esta lhe é irrecusável (Lévinas) e o<br />
hom<strong>em</strong> será tanto mais reponsável quanto mais po<strong>de</strong>r<br />
<strong>de</strong>tiver e terá tantos mais direitos quanto mais frágil for<br />
(Jonas). A responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> assim entendi<strong>da</strong> consiste<br />
no <strong>de</strong>ver <strong>da</strong> humani<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>em</strong> relação a si própria –<br />
missão que a bio<strong>ética</strong> <strong>de</strong>verá continuar a cumprir.<br />
A conquista do governo<br />
Alcança<strong>da</strong> a comunicabili<strong>da</strong><strong>de</strong> entre os vários<br />
saberes no que <strong>de</strong>signamos por uma primeira<br />
conquista <strong>da</strong> bio<strong>ética</strong>, foi-se entretanto estabelecendo<br />
a comunicação, entre a ciência e a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> na<br />
segun<strong>da</strong> conquista <strong>de</strong>scrita, ao mesmo t<strong>em</strong>po que se<br />
ia abrindo uma terceira via <strong>de</strong> comunicação agora<br />
entre os bioeticistas e os governantes. Assiste-se, nas<br />
últimas déca<strong>da</strong>s, a um processo quase <strong>para</strong>lelo <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>mocratização <strong>da</strong> ciência e <strong>de</strong> “eticização” <strong>da</strong> política<br />
(perdoe-se o neologismo). É a participação crescente<br />
dos eticistas na esfera governamental que aqui<br />
evocamos como uma terceira conquista <strong>da</strong> bio<strong>ética</strong>:<br />
a conquista do governo, ou melhor, <strong>da</strong>s políticas <strong>de</strong>