o economista

——É verdade. Eu que estou aqui —— prosseguia ele
—— fui também comando das tropas especiais. Se pudesse
vos contar tudo o que nós vimos e fizemos, vocês não
iriam acreditar. Nem tudo o que nós fizemos, fizemos
conscientes do que estávamos fazendo. Na guerra comete-se
barbaridades, chacinas, faz-se coisas que nem mesmo Diabo
tem coragem de fazer. No dia seguinte, quando estiveres
já mais sóbrio e voltares para visitar o local onde
andaste a fazer das tuas, até pensas que foram os outros
que cometeram tudo aquilo, e culpas os outros. Cego de
tanta raiva, ainda vais ao ataque dos outros, querendo
que eles paguem pelos erros que você mesmo cometeu.
Nesse ponto o Estudioso pôs-se a imaginar o quão
admirável é o modo como os actos que praticamos se
repercutem, tarde ou cedo em nós mesmos. Pensou nas
relações de causa e efeito, nos seus livros de filosofia
ioga, com suas teorias sobre o dharma e o karma, pensou
ainda nos muitos livros de Terça-Feira Lobsang Rampa, e
na vasta biblioteca de livros que possuía, com uma boa
parte deles furtados das livrarias e tabacarias da cidade
de Luanda, e que por necessidade da vida, tivera de
vendê-los quase todos ao João Alfarrabista, ali na Terra
Nova.
Sentado num bloco de cimento e a beber kimbombo, o
Estudioso perguntava-se sobre a utilidade de lhe terem
nascido, dado educação, e nessa altura encontrar-se no
estado e nas condições em que se encontrava. Os muitos
anos de formação em Cuba, custeados pelo Estado, de nada
valiam...
Por volta das dezasseis horas, o bidon de kimbombo
esticou as pernas, e cada um dos clientes foi igualmente
aos poucos retirando as suas em direcção a outros
destinos. A noite foi chegando de mansinho, trazendo as
duas kimbetas de Das Fitas de volta à casa.
Depois do jantar, o Conselho Consultivo da Família
reuniu em sessão ordinária, e tendo concluído que nesse
dia houvera também dikomba, tanto na venda do kimbombo
quanto na de bombó frito, deliberou a partir daí iniciarse
com a montagem da indústria doméstica de kaporroto.
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