o economista
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O funeral duma pessoa, era nesses dias uma boa<br />
passarela para muita gente aproveitar mostrar como e quão<br />
caros eram as suas vestes e os seus calçados. No enterro<br />
do primo-como-irmão do Interino, apareceu gente vestida<br />
dos mais diversos modos, modas e modelos; desde as mais<br />
velhas de panos e quimonos, às raparigas e até senhoras<br />
já de certa idade a mostrarem partes íntimas dos seus<br />
corpos, capazes de porem teso e de pé o sexo de um morto<br />
com um olho zongolador ainda semiaberto.<br />
Era tanta a pressa que muitas pessoas pareciam ter<br />
em se desembaraçarem do morto, que as músicas do óbito já<br />
não eram cantadas a viva voz, já não saiam da alma das<br />
pessoas, como antigamente, mas tocadas por um reprodutor<br />
de cassetes que punha no ar músicas em várias línguas de<br />
uma religião que lhes era desconhecida. Algumas mais<br />
velhas mandavam parar o reprodutor para puderem cantar,<br />
tocar e dançar as dolentes canções da sua terra, mas<br />
volta e meia os mais jovens punham outra vez a tocar as<br />
cassetes com canções de Mpeve Yá Nlongo, que muito poucos<br />
massongos sabiam cantar.<br />
A marcha fúnebre para o cemitério da Mulemba Waxa-Ngola,<br />
foi mais rápida que a primeira corrida de<br />
automóveis do mundo. Foi mesmo pena não puderem<br />
ultrapassar o carro em que ia a urna, porque senão<br />
chegaria muitos séculos depois de todos os outros carros<br />
que lhe seguiam, trazendo muitos jovens a fazerem<br />
acrobacias, a berrarem impropérios bonitos e piropos<br />
românticos, a pularem, a gritarem de tanta alegria, que<br />
muitos transeuntes e muitos acompanhantes talvez<br />
pensassem mesmo em hibernar os seus corpos ainda vivos,<br />
ou já mortos, para que fossem descongelados apenas numa<br />
sociedade em que a moral, a ética e o civismo fossem<br />
estritamente observados, pelo menos nesses momentos<br />
sobremaneira tristes para quem perde um ente querido.<br />
Na maior parte dos actos do óbito, o Interino era<br />
o que mais protagonismo tinha, só em muito raros casos<br />
delegando o seu poder, mas não teve capacidade nem<br />
autoridade suficientes para manter as pessoas todas junto<br />
à cova, até que a urna contendo o corpo do seu primocomo-irmão<br />
fosse totalmente coberto de terra.<br />
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