o economista
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conversar, encostados ao balcão, e num papel de embrulho<br />
o branco escreveu: TUDO. Zito leu, e compreendeu TUDO…<br />
Como ajudante de quimbandeiro, não havia pormenor<br />
algum que não aproveitasse, detalhe algum que não<br />
apreendesse. Os gestos de Kaxika, a linguagem, a<br />
eloquência e tudo mais, Zito arquivava muito bem na sua<br />
cachimónia.<br />
De quando em quando, ele e o velho, viajavam às<br />
igrejas da Muxima, Santa Ana, e também à todas quanto<br />
havia em Luanda. Nelas depositavam moedas e bugigangas e<br />
bruxedos, e de lá traziam água e azeite bentos,<br />
imprescindíveis ao seu trabalho.<br />
Certa vez, noite no auge, foram ambos desenterrar<br />
ossos atrás do cemitério do 14. Na ida o velho informara<br />
a Zito que se tratava de um tipo de pedras, necessárias à<br />
alguns tratamentos que iria fazer, e que era norma ali<br />
aparecerem.<br />
Estavam mesmo próximos do muro que limitava o<br />
cemitério, banhado de uma ponta a outra, com lavras de<br />
mandioqueiras, que em número, levavam vantagem ao dos<br />
mortos que já haviam dado entrada no cemitério. Aqui,<br />
fantasmas de corpos que haviam sido mundanos, exercitavam<br />
marchas em ordem unida. Os túmulos vibravam, e desabavam<br />
os dos que em vida haviam sido pobres.<br />
Ali, havia não só túmulos de pobres, como também de<br />
ricos. Túmulos mil vezes melhor que muita casa de gente<br />
viva, gente do Rangel, gente do Sambizanga, gente do<br />
Catambor, gente da Lixeira. Na marcha, os seus fantasmas<br />
iam no pelotão dianteiro e tinham patentes altas.<br />
Enquanto os fantasmas marchavam, muitos corpos eram<br />
despejados dos seus túmulos, por seus familiares não<br />
terem pago por eles, a renda única de lá perpetuamente<br />
habitarem. Alguns coveiros aproveitavam os ossos, boas<br />
lenhas para aquecer um café, um feijão, um funje, no<br />
intervalo entre dois enterros, isto quando não fosse dia<br />
de dikomba, de que tanto adoravam, para não terem tempo<br />
algum de tomar sequer um café, comer um feijão, um funje,<br />
dada a grande probabilidade de gorjetas a chover.<br />
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