Hanseníase: políticas públicas e qualidade de vida de - Centro de ...
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7 CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />
A abordagem <strong>de</strong> doenças marcadas pelo estigma não é um tema ultrapassado. O exemplo<br />
mais recente disto foi o fato do presi<strong>de</strong>nte estaduni<strong>de</strong>nse recém-eleito, Barack Obama, ter sido<br />
o responsável por revogar, somente em 2009, uma lei vigente durante toda a sombria<br />
administração anterior, que proibía a entrada <strong>de</strong> pacientes infectados pelo vírus do HIV nos<br />
Estados Unidos, o que muito se assemelha às medidas tomadas no início do século passado<br />
com os então “leprosos”. Sendo assim, as <strong>políticas</strong> <strong>públicas</strong> ainda hoje utilizam o medo e a<br />
discriminação para pautar suas ações. Acerca do medo, ressaltam-se ainda as últimas medidas<br />
adotadas mundialmente para o combate à Influenza A H1N1.<br />
A cultura oci<strong>de</strong>ntal, fortemente influenciada pelos preceitos da religião cristã é apontada pela<br />
literatura histórica como a responsável pela associação da doença “lepra” aos conceitos <strong>de</strong><br />
punição, castigo, pecado e mesmo <strong>de</strong> contagiosida<strong>de</strong>. Nenhuma outra doença mereceu<br />
<strong>de</strong>staque tão gran<strong>de</strong> na Bíblia. A tradução do termo “tsaraath” – que se referia a várias<br />
<strong>de</strong>rmatopatias – para o único significado <strong>de</strong> “lepra”, trouxe consigo toda a carga <strong>de</strong><br />
significados que permearam a doença ao longo dos séculos. MACIEL (2007) relata que o<br />
peso da palavra ‘tsaraath’ é tão gran<strong>de</strong> e carrega tanto medo e repugnância, que em Israel, por<br />
exemplo, não se usa este termo ao se referir à lepra para não constranger o paciente.<br />
Ao longo dos séculos, Igreja e Estado abordaram a doença <strong>de</strong> maneiras diversas, mas sempre<br />
associando “culpa” ao doente, que era isolado, ou submetido a uma série <strong>de</strong> medidas<br />
profiláticas <strong>de</strong> exclusão e morte civil, religiosa ou física. O objetivo sempre foi retirar dos<br />
centros urbanos tudo “aquilo” que pu<strong>de</strong>sse incomodar a visão e o sentimento <strong>de</strong> limpeza e<br />
bem estar. Sendo assim, “leprosos”, mendigos, “loucos”, porcos e prostitutas foram expulsos<br />
e afastados do convívio social.<br />
A <strong>de</strong>scoberta do bacilo <strong>de</strong> Hansen no final do século XIX estabeleceu a legitimida<strong>de</strong><br />
científica necessária para manter os doentes em isolamento. Restava ao estado bloquear o<br />
reservatório único do bacilo (o doente) para proteger os sadios. Estas ações, pautadas por um<br />
discurso higienista, levaram a construção <strong>de</strong> Leprosários, Preventórios e Educandários para os<br />
quais os “leprosos” e seus <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes foram segregados no Brasil do século XX. Este<br />
chamado “tripé” do armamento antileprótico se consolidou no Governo Getúlio Vargas, tendo<br />
como exemplo o “mo<strong>de</strong>lo norueguês” proposto na Conferência <strong>de</strong> Berlim, e o “mo<strong>de</strong>lo<br />
paulista” que inflenciaria a maneira <strong>de</strong> lidar com a doença até a década <strong>de</strong> sessenta.<br />
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