Hanseníase: políticas públicas e qualidade de vida de - Centro de ...
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“Assim, este doente se vê 'morto' civilmente e seus bens materiais<br />
interditados, passando a ser controlados e gerenciados pela Igreja Católica<br />
ou pelo po<strong>de</strong>r real. Por volta <strong>de</strong> 1430, em regiões da França e Inglaterra,<br />
estas cerimônias eram acompanhadas por toda a população da vila que<br />
celebravam a separação do leproso com a comunida<strong>de</strong>: Esquematicamente<br />
ela consiste em levar o doente à igreja em procissão ao canto do Libera-me<br />
como para um morto, na celebração <strong>de</strong> uma missa que o infeliz escuta<br />
dissimulado sob um cadafalso, sendo <strong>de</strong>pois acompanhado à sua nova<br />
morada. (...) o padre <strong>de</strong>ve pegar Terra do cemitério e pô-la na Testa do<br />
leproso, dizendo o seguinte: ‘Meu amigo, é sinal <strong>de</strong> que estás morto para o<br />
mundo’ (...). a leitura das proibições (entrar nos moinhos, tocar nos<br />
alimentos, etc.) acompanha a entrega e benção das luvas, da matraca e da<br />
caixa <strong>de</strong> esmola. (...) A Reforma Católica e a <strong>de</strong>saparição da lepra, <strong>de</strong>pois<br />
<strong>de</strong> 1580, acabaram com esta liturgia" (MACIEL 2007, p. 30-1)<br />
A dimensão do “problema” perante a Igreja e o Estado é ilustrada por uma discussão <strong>de</strong><br />
séculos para <strong>de</strong>terminar se “leprosos” po<strong>de</strong>riam se casar ou não: em 757 d.C., o Concílio <strong>de</strong><br />
Compiégne sob o pontificado <strong>de</strong> Paulo I (757-767) <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> que “a lepra é motivo admissível<br />
para anulação do casamento” se apenas um dos cônjuges for portador da doença. Três décadas<br />
<strong>de</strong>pois, em 789, Carlos Magno <strong>de</strong>clara que a “lepra” justifica a anulação do casamento. Tais<br />
<strong>de</strong>terminações são discutidas nos séculos seguintes, até que em 1179, a Igreja, no III Concílio<br />
<strong>de</strong> Latrão, sob o papa Alexandre III, <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> pela permissão do casamento dos “leprosos”, mas<br />
apenas se ambos fossem portadores (CARVALHO 2006). A prática <strong>de</strong> coibir casamentos<br />
entre “sadios” e “doentes” durou até o século XX. DINIZ (1961), se referindo ao Leprosário<br />
<strong>de</strong> Betim há apenas 50 anos, relata:<br />
“as leis do país não proíbem o casamento entre hansenianos, contanto que não<br />
haja <strong>de</strong>sconhecimento da ocorrencia. Quando alguém usa <strong>de</strong> má fé,<br />
escon<strong>de</strong>ndo ser portador da enfermida<strong>de</strong>, cabe o recurso da nulida<strong>de</strong>”.<br />
Os “leprosos” não tinham também o direito à proprieda<strong>de</strong>, e seus bens eram confiscados pela<br />
Igreja. Em 940 d.C. o Papa Estevão VIII confirma a lei do País <strong>de</strong> Gales que proíbe aos filhos<br />
o acesso à herança após o confinamento do pai em Leprosário. Além disto, no país <strong>de</strong> Gales e<br />
na Escócia a mulher leprosa era impedida <strong>de</strong> engra<strong>vida</strong>r sob pena <strong>de</strong> ir para a fogueira com o<br />
filho nascido nos braços. Em 1145 uma Bula papal <strong>de</strong> Eugenio III permite que “leprososo”<br />
mortos sejam enterrados em cemitérios dos “sadios”. (CARVALHO, 2006; MARY CLAY,<br />
1909)<br />
As Cruzadas Católicas tiveram papel prepon<strong>de</strong>rante na disseminação da doença pela Europa.<br />
Historiadores discutem se as Cruzadas serviram para introduzir a doença <strong>de</strong> maneira<br />
endêmica na Europa cristã, ou tão somente ampliaram as dimensões <strong>de</strong> uma en<strong>de</strong>mia já<br />
existente. Atribui-se aos Cruzados a punição divina pelo pecado, e BROWNE (1985) lembra<br />
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