Anais de Historia CPTL - 2006.pmd - Campus de Três Lagoas
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O próprio fim a que se visa este estudo não é a escrita <strong>de</strong> uma<br />
história em fatos sucessivos. No entanto, mesmo se fosse assim, <strong>de</strong><br />
acordo com Fefvre, seria uma “coleção <strong>de</strong> factos”, e ainda sim “factos<br />
humanos”, mas com o propósito <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r encontrar os homens que<br />
viveram estes fatos e <strong>de</strong>les os que mais tar<strong>de</strong> aí se instalaram com<br />
suas idéias, para os interpretar (1985, p. 24). Foi por aqui que comecei<br />
a me enveredar pelo viés da vida cotidiana, não exatamente por Fefvre,<br />
mas pelas suas orientações contra aquilo que chamava por “todo um<br />
saber positivo” ao referir-se à matéria-prima do historiador, os textos,<br />
os “documentos” em cujo favor se cria um privilégio – como a extração<br />
<strong>de</strong> um nome, uma data, um lugar; um lugar, uma data, um nome –<br />
tornando-os diferentes ao real; que também a literatura, uma foto, um<br />
monumento: documentos para nós, diz Fefvre, testemunhos <strong>de</strong> uma<br />
história viva e humana (1985, p. 24).<br />
Em Itapura, tem-se submerso pelas águas do rio Tietê uma<br />
máquina <strong>de</strong> navegação fluvial, o vapor Tamandatahy, <strong>de</strong> fabricação<br />
inglesa, importada pelo governo imperial utilizado até afundar-se <strong>de</strong><br />
tanto navegar pelas barrancas do rio Paraná e alguns dos seus afluentes,<br />
exatamente porque foi utilizada por 23 anos em expedições e<br />
navegações aci<strong>de</strong>ntadas. Assim como a persistência da pestilenta<br />
malária que se tornou um dos maiores obstáculos do “progresso” no<br />
vale do baixo Tietê. De um lado e <strong>de</strong> outro, portanto, o âmbito das<br />
<strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> gabinete e seus cumprimentos, a <strong>de</strong> vida e morte, a <strong>de</strong><br />
sobrevivência e luta pela terra, enfim, entre um extremo e outro, no<br />
mundo do vivido, das causas e dos fins, uma vida cotidiana (Veyne,<br />
1998, p. 53).<br />
Sobre o que me resta justificar, conforme Fernand Brau<strong>de</strong>l,<br />
nada mais, nada menos do que a introdução da vida cotidiana na<br />
história (1995, p. 15-18). Para este historiador, “a cotidianeida<strong>de</strong> (sic)<br />
são os fatos miúdos que quase não <strong>de</strong>ixam marca no tempo e no<br />
espaço”. E, completa ele, “bastam algumas anedotas para iluminar<br />
quem vê, para assinalar modos <strong>de</strong> vida”. O que ocorre é, observa<br />
Brau<strong>de</strong>l, quando restringimos o tempo observado a duas pequenas<br />
frações, temos o “acontecimento” ou a “ocorrência”; o acontecimento<br />
“quer-se, crê-se único”; a ocorrência, continua ele, “repete-se e, ao<br />
repetir-se, torna-se generalida<strong>de</strong>, ou melhor, estrutura” (1995, p.17).<br />
O resultado, completa o autor, será uma socieda<strong>de</strong> invadida em todos<br />
os seus níveis, caracterizada por “maneiras <strong>de</strong> ser e <strong>de</strong> agir <strong>de</strong>smedidamente<br />
perpetuadas”. Logo, observa, que não há necessariamente<br />
o fútil na “cotidianeida<strong>de</strong>” (sic). Para ele “é ao longo <strong>de</strong> pequenos<br />
inci<strong>de</strong>ntes, <strong>de</strong> relatos <strong>de</strong> viagem que uma socieda<strong>de</strong> se revela”. A<br />
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