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O Dinossauro - Ordem Livre

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291trabalho da escolástica medieval. Em nosso caso, além disso, o intelectual desprovido deética utiliza sua inteligência para promover-se nos media como mero atleta, estrela decinema ou cantor de rádio. Reparai nas polêmicas de jornal e TV: o objetivo dosparticipantes não é, em geral, procurar alcançar esse ideal supremo de Verdade, por umembate franco de argumentos bem fundamentados e logicamente concatenados. Derrama-seuma quantidade extraordinária de citações para ostentar o próprio triunfo de erudição: "Querapaz inteligente! Arre, que é demais!" A polêmica é mesmo um embate (polemos) deinteligências. Eles se medem no empenho de demonstrar sua inteligência, qua inteligênciacomo numa competição esportista que visa a colher aplausos. Como pavões que queremimpressionar a fêmea. O verbalismo oco, o jargão inútil, a retórica sonora e fluente, opalavrório fácil, a improvisação de conceitos meramente especulativos, o trocadilhosarcástico que faz rir, o parnasianismo insopitável, a erudição francesa, inglesa, alemã,ostentosa e vaidosa — eis algumas das características que têm sido mais comumenteapontadas pelos observadores de nossa cultura e que revelam o tipo nitidamente femininodo pensamento nacional. De tudo não se pode extrair um grama sequer de vitaminacerebral. A polêmica não tarda a descambar para o insulto grosseiro, a distorção, a mentira,a calúnia, a ofensa pessoal. Os sofistas são incapazes de manter a discussão num plano altode confronto abstrato de ideias substanciais: é um embate concreto de vaidades. Nessapobreza agreste de conceitos elevados, penetram então os slogans da ideologia como ultimaratio, mas na verdade como uma infecção microbiana em corpo combalido: o lugar-comum,o chavão da moda. E a logorreia prossegue como uma inundação — semelhante a umachuvarada de verão carioca — no meio da qual não se descobre uma gota de fermentoverdadeiramente original e criador.Enfim, no Protágoras platônico temos um modelo educacional admirável para oesforço de superação desse tipo de contenda sofismática em cujo baixo nível aindapermanece a maior parte de nossos intelectuais. Se tão pobre ainda é a filosofia brasileira, ode que necessitamos antes de mais nada, no aprimoramento de nossa cultura, é de umapaideia da própria atividade mental. A eliminação da intelligentsia e sua substituição poruma intelectualidade inteligente...* * *Em livro que já data de 60 anos (La trahison des clercs, 1927), mas que nadaperdeu de sua vibrante atualidade, Julien Benda denunciou a "traição dos clérigos" sobre osquais deveria recair a responsabilidade pelos padrões morais e espirituais de nossa

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