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O Primo Basílio - Unama

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— O quê? Outra paixão? — fez Luísa rindo.<br />

www.nead.unama.br<br />

A face de Leopoldina tornou-se grave.<br />

Não era para rir. Estava de todo! Era por isso até que tinha vindo. Sentira-se<br />

tão só em casa, tão nervosa! — Vou até Luísa, vou palrar um bocado!<br />

E com a Voz mais baixa, quase solene:<br />

— Desta vez é sério, Luísa! — Deu os detalhes. Era um rapaz alto, louro,<br />

lindo! E que talento! E poeta! — Dizia a palavra com devoção, prolongando o som<br />

das sílabas. — E poeta!<br />

Desapertou devagar dois botões do corpete, tirou do seio um papel dobrado.<br />

Eram versos.<br />

E muito chegada para Luísa, com as narinas dilatadas pela delícia da<br />

sensação, leu baixo, com orgulho, com pompa:<br />

— "A ti Farol da Guia, 5 de junho Quando cismo à hora do poente. Sobre os<br />

rochedos onde brame o mar..."<br />

Era uma elegia. O rapaz contava, em quadras, as longas contemplações em<br />

que a via a ela, Leopoldina, "visão radiosa que deslizas leve", nas águas dormentes,<br />

nas vermelhidões do ocaso, na brancura das espumas. Era uma composição<br />

delambida, de um sentimentalismo reles, com um ar tísico, muito lisboeta, cheia de<br />

versos errados. E, terminando, dizia-lhe que não era "nos esplendores das salas" ou<br />

nos "bailes febricitantes" que gostava de a ver; era ali, naqueles rochedos,<br />

Onde todos os dias ao sol posto<br />

Eu vejo adormecer o mar gigante.<br />

— Que bonito, heim!<br />

Ficaram caladas, com uma comoçãozinha.<br />

Leopoldina, com os olhos perturbados, repetia a data, amorosamente:<br />

— Farol da Guia, 5 de junho!<br />

Mas o relógio do quarto deu quatro horas. Leopoldina ergueu-se logo,<br />

atarantada, meteu o poema no seio.<br />

Tinha de se ir já! Fazia-se tarde, senão o outro, punha-se a mesa. Tinha um<br />

ruivo assado para o jantar. E peixe frio era a coisa mais estúpida!<br />

Adeus. Até breve, não? — E agora que Jorge ia para fora, havia de vir<br />

muito.— Adeus. Então a francesa, Rua do Ouro, por cima do estanque?<br />

Luísa foi com ela até ao patamar. Leopoldina já no fundo da escada ainda<br />

parou gritou:<br />

— Sempre te parece que guarneça o vestido de azul, heim?<br />

Luísa debruçou-se sobre o corrimão:<br />

— Eu assim fiz, é o melhor...<br />

— Adeus! Rua do Ouro, por cima do estanque?<br />

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