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O Primo Basílio - Unama

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www.nead.unama.br<br />

durante todo o dia conservava0se no quarto com a porta fechada, lendo, costurando,<br />

pensando em Jorge — às vezes também em <strong>Basílio</strong> com ódio, desejando a volta de<br />

Sebastião, e preparando a sua história.<br />

Juliana, uma manhã, encontrou Luísa no corredor trazendo para o quarto o<br />

regador cheio de água.<br />

— Oh, minha senhora! Por que não chamou? — exclamou, quase<br />

escandalizada.<br />

— Não tem dúvida — disse Luísa.<br />

Mas Juliana seguiu-a ao quarto, e cerrando a porta:<br />

— Ó minha senhora! — disse muito ofendida. — Isto assim não pode<br />

continuar. A senhora parece que tem medo de me ver, credo! Eu voltei para fazer o<br />

meu serviço como dantes... Verdade, verdade, naturalmente, sempre espero que a<br />

senhora faça o que prometeu... E lá largar as cartas não largo, sem ter seguro o pão<br />

da velhice. Mas o que se passou foi um repente de gênio, e já pedi perdão à<br />

senhora. Quero fazer o meu serviço... Agora se a senhora não quer, então saio, e -,<br />

acrescentou com uma voz seca — talvez seja pior para todos!...<br />

Luísa, muito perturbada, balbuciou:<br />

— Mas...<br />

— Não, minha senhora — cortou Juliana severamente — aqui a criada sou eu.<br />

E saiu, empertigada.<br />

Tanta audácia aterrou Luísa. Aquela ladra era capaz de tudo!<br />

Então, para a não irritar começou, daí por diante, a chamá-la, a dizer: -"traga<br />

isto, traga aquilo" — sem a olhar.<br />

Mas Juliana fazia-se tão serviçal, era tão calada, que Luísa pouco a pouco,<br />

dia a dia, com o seu caráter móbil, inconsciente, cheio de deixar-se ir, principiou a<br />

perder o sentimento pungente daquela dificuldade. E no fim de três semanas as<br />

coisas tinham entrado nos seus eixos — dizia Juliana.<br />

Luísa já gritava por ela do quarto, já a mandava a recados fora; Juliana<br />

chegava a ter às vezes migalhas de conversação: — Está um calor de morrer... A<br />

lavadeira tarda... — Um dia arriscou esta frase mais intima: — Encontrei a criada da<br />

senhora D. Leopoldina.<br />

Luísa perguntou:<br />

— Ainda está para o Porto?<br />

— Ainda se demora um mês, minha senhora...<br />

De resto havia na casa um aspecto muito tranqüilo, e Luísa, depois de tantas<br />

agitações, abandonava-se com gozo à satisfação daquele descanso. Ia às vezes ver<br />

D. Felicidade à Encarnação, que já se levantava. E esperava sempre Sebastião,<br />

mas sem impaciência, quase contente por ver adiado o momento terrível de lhe<br />

dizer: "Escrevi a um homem, Sebastião!"<br />

Assim iam passando os dias; estava-se no fim de setembro.<br />

Uma tarde Luísa ficara mais tempo à janela da sala de jantar; deixara cair o<br />

livro no regaço, e olhava, sorrindo, um bando de pombas que de algum quintal<br />

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