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O Primo Basílio - Unama

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www.nead.unama.br<br />

Luísa desceu o véu branco, calçou devagar as luvas de peau de suède<br />

claras, deu duas pancadinhas fofas ao espelho na gravata de renda, e abriu a porta<br />

da sala. Mas quase recuou; fez "ah!" toda escarlate. Tinha-o reconhecido logo. Era o<br />

primo <strong>Basílio</strong>.<br />

Houve um shake-hands demorado, um pouco trêmulo. Estavam ambos<br />

calados: — ela com todo o sangue no rosto, um sorriso vago; ele fitando-a muito,<br />

com um olhar admirado. Mas as palavras, as perguntas vieram logo, muito<br />

precipitadamente: — Quando tinha ele chegado? Se sabia que ele estava em<br />

Lisboa? Como soubera a morada dela?<br />

Chegara na véspera no paquete de Bordéus. Perguntara no ministério;<br />

disseram 4h e que Jorge estava no Alentejo, deram-lhe a adresse...<br />

— Como tu estás mudada, Santo Deus!<br />

— Velha.<br />

— Bonita!<br />

— Ora!<br />

E ele, que tinha feito? Demorava-se?<br />

Foi abrir uma janela, dar uma luz larga, mais clara. Sentaram-se. Ele no sofá<br />

muito languidamente; ela ao pé, pousada de leve à beira de uma poltrona, toda<br />

nervosa.<br />

Tinha deixado o "degredo" — disse ele. — Viera respirar um pouco à velha<br />

Europa. Estivera em Constantinopla, na Terra Santa, em Roma. O último ano em<br />

Paris! — Vinha de lá, daquela aldeola de Paris! — Falava devagar, recostado, com<br />

um ar íntimo, estendendo sobre o tapete, comodamente, os seus sapatos de verniz.<br />

Luísa olhava-o. Achava-o mais varonil, mais trigueiro. No cabelo preto<br />

anelado havia agora alguns fios brancos; mas o bigode pequeno tinha o antigo ar<br />

moço, orgulhoso e intrépido; os olhos quando ria, a mesma doçura amolecida,<br />

banhada num fluido. Reparou na ferradura de pérola da sua gravata de cetim preto,<br />

nas pequeninas estrelas brancas bordadas nas suas meias de seda. A Bahia não o<br />

vulgarizara. Voltava mais interessante!<br />

— Mas tu, conta-me de ti! — dizia ele com um sorriso, inclinado para ela. —<br />

És feliz, tens um pequerrucho...<br />

— Não — exclamou Luísa rindo. — Não tenho! Quem te disse?<br />

— Tinham-me dito. E teu marido demora-se?<br />

— Três, quatro semanas, creio.<br />

Quatro semanas! Era uma viuvez! Ofereceu-se logo para a vir ver mais<br />

vezes, palrar um momento, pela manhã...<br />

— Pudera não! És o único parente que tenho agora...<br />

Era verdade!... E a conversação tomou uma intimidade melancólica; falaram<br />

da mãe de Luísa, a "tia Jojó", como lhe chamava <strong>Basílio</strong>. Luísa contou a sua morte<br />

muito doce, na poltrona, sem um ai...<br />

Onde está sepultada? — perguntou <strong>Basílio</strong> com uma voz grave; e<br />

acrescentou puxando o punho da camisa de chita: — Está no nosso jazigo?<br />

— Está.<br />

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