16.04.2013 Views

O Primo Basílio - Unama

O Primo Basílio - Unama

O Primo Basílio - Unama

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

www.nead.unama.br<br />

— Os senhores que ali moram, estão para fora?<br />

— Já não moram — disse o Paula soturnamente, passando a mão sobre o<br />

bigode.<br />

<strong>Basílio</strong> fixou-o, surpreendido daquela entonação fúnebre.<br />

— Onde vivem agora então?<br />

O Paula escarrou, e cravou em <strong>Basílio</strong> um olhar desolado:<br />

— Vossa Senhoria é o parente?<br />

<strong>Basílio</strong> disse sorrindo.<br />

— Sou o parente, sou.<br />

— Então não sabe?<br />

— O quê, homem de Deus?<br />

O Paula esfregou o queixo, e bamboleando a cabeça:<br />

— Pois sinto dizer-lho. A senhora morreu.<br />

— Que senhora? — perguntou <strong>Basílio</strong>. E fez-se muito branco.<br />

— A senhora! A senhora D. Luísa, a mulher do Sr. Carvalho, o Engenheiro...<br />

E o Sr. Jorge está em casa do Sr. Sebastião. Ali ao fim da rua. Se Vossa Senhoria lá<br />

quer ir...<br />

— Não! — fez <strong>Basílio</strong> com um gesto rápido da mão. Os beiços tremiam-lhe<br />

um pouco. — Mas que foi?<br />

— Uma febre! Rapou-a em dois dias!<br />

<strong>Basílio</strong> dirigiu-se ao cupê devagar, com a cabeça baixa. Olhou mais uma vez<br />

para a casa; fechou com força a portinhola. O Pintéus bateu para a Baixa.<br />

O Paula então aproximou-se do estanque:<br />

alma...<br />

— Não lhe fez muita mossa! Fidalgos! Canalha! — murmurou.<br />

A estanqueira disse lamentosamente:<br />

— Pois eu não sou parenta, e todas as noites lhe rezo dois padre-nossos por<br />

— E eu! — suspirou a carvoeira.<br />

— Há de lhe isso servir de muito! — rosnou o Paula, afastando-se.<br />

Estava ultimamente mais amargo. Vendia pouco. Aquelas mortes na rua<br />

traziam-no desconfiado da vida. Cada dia detestava mais os padres! E todas as noites<br />

lia a Nação que lhe emprestava o Azevedo, repostando-se com rancor de artigos<br />

devotos que o exasperavam, o impeliam para o ateísmo; e o descontentamento das<br />

coisas públicas inclinava-o para a comuna. Como ele dizia, achava tudo uma porcaria.<br />

Foi decerto sob este sentimento que, voltando-se à porta do estanque, disse<br />

às vizinhas com um ar lúgubre:<br />

298

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!