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O Primo Basílio - Unama

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www.nead.unama.br<br />

— Que lhe pareceu, meu bom amigo? — perguntou baixo o Conselheiro a<br />

Julião, passando-lhe a mão sobre o ombro. — Mas uma opinião desafrontada, meu<br />

Zuzarte!<br />

— Sr. Conselheiro — disse Julião com uma voz profunda — tenho-lhe<br />

inveja! E as suas lunetas escuras fixavam-se com uma preocupação crescente num<br />

xale-manta pardo, que a um canto cobria cuidadosamente, a julgar pelas saliências,<br />

altas pilhas de livros. Que seria? — Tenho-lhe inveja! — repetiu. — E outra coisa,<br />

Conselheiro, não se me dava de lavar as mãos.<br />

Acácio levou-o logo ao seu quarto e retirou-se discretamente. Julião, sempre<br />

curioso, observou, surpreendido, duas grandes litografias aos lados da cama — um<br />

Ecce homo! e a Virgem das Sete Dores. O quarto era esteirado, o leito baixo e largo.<br />

Abriu então a gavetinha da mesa de cabeceira, e viu, espantado, uma touca e o<br />

volume brochado das poesias obscenas de Bocage! Entreabriu os cortinados<br />

fechados; e teve a consolação de verificar que havia sobre o travesseiro duas<br />

fronhazinhas chegadas de um modo conjugal e terno!<br />

Apenas ele saiu do quarto, limpando as unhas com o lenço, o Conselheiro<br />

conduziu-os à sala de jantar, dizendo jovialmente:<br />

— Não esperem o festim de Lúpulo: é apenas o modesto passadio de um<br />

humilde filósofo!<br />

Mas o Alves Coutinho extasiou-se sobre a abundância das travessas de<br />

doce; havia creme crestado a ferro de engomar, um prato de ovos queimados,<br />

aletria com as iniciais do Conselheiro desenhadas a canela.<br />

— É um grande dia para Sebastião! — disse Jorge.<br />

O Alves Coutinho voltou-se logo para Sebastião, esfregando as mãos, com<br />

um riso na face amarela:<br />

pelo!...<br />

— É cá dos meus, hein? Gosta do belo doce! Também me pelo, também me<br />

Houve então um silêncio. As colheres de prata, remexendo devagar a sopa<br />

muito quente, agitavam os longos canudos brancos e moles do macarrão.<br />

O Conselheiro disse:<br />

— Não sei se gostarão da sopa. Eu adoro o macarrão!<br />

— Gosta do macarrão? — acudiu o Alves.<br />

— Muito, meu Alves. Lembra-me a Itália! — E acrescentou: — País que<br />

sempre desejei ver. Dizem-me que as suas ruínas são de primeira ordem. Pode ir<br />

trazendo o cozido, Sra. Filomena... — Mas detendo-a, com um gesto grave: —<br />

Perdão, com franqueza, preferem o cozido ou o peixe? É um pargo.<br />

Houve uma hesitação, Jorge disse:<br />

— O cozido talvez.<br />

E o Conselheiro com afeto:<br />

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